O eventual presidente Michel Temer recorreu às ruas para
contornar a voracidade do Congresso por cargos, que parecia condenar seu
provável governo a "fazer mais do mesmo" na composição da equipe
ministerial. Em decisão tomada no domingo à noite, Temer decidiu cortar dez dos
32 atuais ministérios. O futuro presidente do Banco Central perderá o status de
ministro, conferido ao posto em 2004, quando era comandado por Henrique
Meirelles, futuro ministro da Fazenda de Michel Temer, assim que a presidente
Dilma for afastada.
Meirelles participou da decisão tomada no domingo à
noite, no Palácio do Jaburu, em reunião da qual participaram os nomes que vão
integrar o núcleo decisório do futuro governo: Eliseu Padilha (Casa Civil),
Romero Jucá (Planejamento), Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e o
ex-governador do Rio Moreira Franco, a quem foi entregue a tarefa de deslanchar
as privatizações numa pasta extraordinária. Não foi a primeira reunião do
grupo, mas foi a primeira na qual se bateu o martelo sobre decisões de governo.
O presidente do BC ganhou status de ministro em julho de
2004, mas a discussão era mais antiga e ganhou força após os vazamentos de
informações sigilosas, fiscais e bancárias, envolvendo o nome do então
presidente do BC, Henrique Meirelles. Desde os anos 1990 os presidentes do BC
eram alvos de processos - em todos os cantos do país - decorrentes de medidas
que tiveram que assinar por responsabilidade da função. Com o status de
ministério, essas ações passaram a ser tratadas no Supremo Tribunal Federal,
por causa do foro privilegiado.
A justificativa da MP baixada para dar o status a
Meirelles dizia que a relevância das matérias que integram a pauta de decisões
do presidente do BC, "cujas atribuições compreendem, dentre outras medidas
de notória complexidade, a formulação da política monetária do país e a
intervenção no sistema financeiro nacional [...], sugere a necessidade de
conferir-lhe a condição de Ministros de Estado".
Meirelles concordou com a decisão de Temer. A cúpula do
provável governo avaliou que isso não será problema para a composição da nova
equipe econômica. Mais adiante, Temer promete analisar uma maneira de tornar o
presidente do BC menos vulnerável a ações ajuizadas em todo o país. Os nomes
mais citados para a presidência do Banco Central no círculo mais próximo do
presidente são os dos economistas Mario Mesquita e Ilan Goldfajn. Mas o futuro
ministro da Fazenda somente pretende anunciar o nome escolhido para o BC depois
que Temer estiver sentado na cadeira de presidente, depois que o Senado aceitar
processar a atual presidente e afastá-la do cargo, o que deve ocorrer até o fim
de semana.
O corte dos dez ministérios foi a resposta de Temer à
pressão dos partidos da base aliada do governo. A planilha aprovada domingo à
noite está preenchida com a extinção de seis ministérios e a decretação da
perda de status de quatro: presidente do Banco Central, ministro-chefe da
Advocacia Geral da União (AGU), do ministro chefe-de-gabinete da presidente,
cargo inventado para Jaques Wagner a fim de dar a Casa Civil para o
ex-presidente Lula da Silva, e o do secretário de Imprensa.
As secretarias de Aviação Civil e a de Portos deixarão de
ser um ministério independente e serão incorporadas pelo Ministério dos
Transportes, cuja titularidade está prevista para ser dada ao PR. O Ministério
da Cultura, que Temer prometera ao deputado Roberto Freire (PPS), voltará à
órbita do Ministério da Educação, prometido ao deputado Mendonça Filho
(DEM-PE).
Temer resolveu acabar com dois ministérios "sagrados"
da era Lula: o da Igualdade Racial, Direitos Humanos e Mulher, que será
incorporado ao da Justiça, e o de Desenvolvimento Agrário, que passará para o
Desenvolvimento Social (MDS), responsável por programas como o do Bolsa
Família. O virtual presidente espera reação dos grupos organizados, mas a
avaliação é que os movimentos sociais ligados ao PT vão combater o governo
Temer independentemente da manutenção dessas pastas.
Os ministérios das Comunicações, reservado ao PSD, e o de
Ciência e Tecnologia, prometido para um deputado do PRB, partido ligado à
Igreja Universal, constituirão uma única pasta.
O enxugamento não para aí. Temer incumbiu seus futuros
ministros de fazer um disgnóstico interno de cada pasta com vistas à redução de
cargos. Temer quer começar cortando no próprio governo, antes de pedir algum
sacrifício à sociedade. Por enquanto, ele tem afastado a ideia de criação de
novos impostos, inclusive a reedição da CPMF.
Temer decidiu voltar à ideia inicial de reduzir o número
de ministérios depois da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de afastar o
presidente da Câmara, Eduardo Cunha. De acordo com o Palácio do Jaburu, a
"agenda das ruas" saiu fortalecida com a decisão. Para o novo
governo, manter 33 ministérios não seria bem digerido pela população, ainda
mais negociados no toma lá da cá do Congresso. Temer agora terá 23 ministérios
para compor com uma base aliada que tem 21 dos 25 partidos com representação na
Câmara.
O novo governo, evidentemente, ainda espera encontrar
dificuldade na negociação com os partidos, mas quer aproveitar o momento da
mudança para impor o novo padrão. Tarefa que provavelmente foi facilitada com a
decisão de anular a votação do impeachment na Câmara, uma chicana patrocinada
pelo presidente em exercício da Câmara, deputado Valdir Maranhão (PP-MA), e
pelos trapalhões do Palácio da Alvorada, tendo o advogado da União, José
Eduardo Cardozo, à frente das tramoias.
Temer resolveu pagar para ver na questão de ministros
investigados pela Lava-Jato, outra "agenda das ruas", caso do senador
Romero Jucá, considerado indispensável no novo gabinete. O futuro ministro do
Planejamento garantiu que se livrará de todas as suspeitas e será inocentado.
Jurista, o princípio adotado por Temer é o da presunção da inocência. Jucá
fica.