Os setenta mil homicídios, a corrupção desenfreada, a
violência endêmica, a falta de oportunidades para quem quer trabalhar e a
ausência de perspectivas para quem quer investir são alguns dos fatores que
estão fazendo muita gente pegar coragem e ir embora do Brasil. Não é fácil
aguentar viver num país que é violentado e abusado todos os dias. Aqui não tem
guerra, mas têm batalhas sangrentas. Não há muitos desastres naturais. Nossos
desastres são, em sua maioria, artificiais mesmo. Este é um estado que deveria
ser o terceiro ou quarto do planeta, por suas riquezas naturais e potenciais
dos mais variados. Não é mais, entretanto, uma nação, para alguns. Para outros,
não passa de um território imenso cheio de malandros e ladrões. Para mim, é
tudo isso.
Dentre todas as mazelas que nos cercam, talvez,
paradoxalmente, o povo brasileiro seja o menor problema. A ignorância popular
vota nos Collors, Lulas e Dilmas, como faz, de forma idêntica, a elite de
banqueiros, empreiteiros, artistas, jornalistas e os tais “formadores de
opinião”. Os votos nos petistas foram incentivados pelos Odebrechts, que
inundaram suas campanhas de dinheiro. Culpa do povo brasileiro? A qualidade dos
candidatos a cargos eletivos tem sido a mais baixa possível. Vota-se no menos
pior, no menos ladrão, no menos mentiroso...culpa do povo brasileiro? Vale
repensar.
É de se imaginar a dor e o desencanto daqueles que
tomaram a dificílima decisão de abandonar o barco. Vender suas coisas, aceitar
viver debaixo de outra bandeira. Ter de se afastar de pessoas queridas,
familiares, de sua rua, seu bairro e seu trabalho é algo que deve ser doloroso
e muito sofrido. São corajosos – sim – os que deixam de viver em sua terra para
ser inquilino em outras distantes. A vida é longa demais para a gente ter de
vive-la sem um hino para cantar, com lágrimas nos olhos de saudade das aves que
gorjeiam como lá.
São bravos os que ficam e os que vão. Ficar é um ato de
coragem quase insano, daqueles que se vê em filmes. Entende-se sair de nossa
terra por causa de guerras, perseguições políticas ou raciais, doideiras
religiosas e outros horrores. Sair da terra por causa de conflitos transmite a
ideia de que, tão logo as coisas se acalmem, é possível voltar. Quem está
saindo do Brasil não fala em voltar. Não estão dizendo “até logo”. Estão
dizendo adeus. Os que ficam, ricos ou pobres, sentem-se sós, em desamparo
aumentado a cada vez que a voz do aeroporto diz “Senhores passageiros do voo
123 para Lisboa...”. Lá se vão mais compatriotas que vão fazer falta.
Ficar é a minha decisão. Poderia ter tomado a decisão de
ir. Preferi ficar, sem julgar ninguém. Chego até a ficar com pena de quem vai,
mas respeito e apoio a dura decisão. Ufanismos à parte, ficar ou sair é ato
semelhante. A diferença é o risco que se assume. No risco de ficar, jazem as
estatísticas horrendas de violência social que, de tão presentes, questionam
até o próprio termo “estatística”. No risco de ir, a insegurança de ter de
recomeçar, de dar errado, de ter de...voltar.