O título original do artigo é "O homem da
cadeira de rodas"
O
homem da cadeira de rodas fez o Brasil caminhar para frente em momentos
delicados da história recente. Soube enfrentar várias crises, sempre preocupado
com o destino do país, enquanto bem maior a ser preservado. Nos últimos anos, o
General Villas Boas foi acometido de uma doença degenerativa, que o destinou a
uma cadeira de rodas, sem que, por isso, tenha perdido sua mente de
estrategista, nem sua dignidade moral.
Já o
vi, em uma ocasião, falando em sua casa com o ex-presidente da República acerca
da sucessão no Ministério da Defesa, defendendo com fidalguia a posição do
Exército e das Forças Armadas em geral, com toda a sua dificuldade de
locomoção. Nada disto afetava sua capacidade analítica. A janta transcorria
normalmente, com sua mulher, Cida, dando-lhe de comer na boca. Fui tomado por
um sentimento intenso de beleza moral, se posso utilizar tal expressão. A
doença desaparecia pelo ato de amor dela e de sua filha. A conversa transcorria normalmente, como isto
fosse – como foi – um mero acidente.
Trago
aqui o testemunho da amizade para melhor expressar a minha indignação com os
ataques dos quais foi objeto por parte do ideólogo do presidente e de sua
família. Recorrer à sua condição física como meio de insulto é algo abjeto. Que
o digam também outros deficientes físicos do país. E isto por que ousou se
posicionar contra ataques que as Forças Armadas e o Exército em particular têm
sofrido.
A situação é
propriamente surrealista: um ideólogo que mora por decisão sua nos Estados
Unidos tutela o grupo ideológico presidencial, criando conflitos intermináveis,
enquanto o governo não consegue enfrentar os problemas mais básicos do país
como crescimento econômico, desemprego, investimentos e distribuição de renda.
O Brasil tornou-se refém de posicionamentos ideológicos que nos impedem de
andar para frente. Sentado, em sua cadeira de rodas, o General caminha melhor
do que aqueles que o atacam.
Nada disto é
aleatório. Os militares vieram a participar do atual governo por iniciativa
individual, pois acreditaram ter uma missão a cumprir. Apesar das aparências,
não agem como um grupo. Não se encontram, nem se reúnem regularmente. Muitas
vezes nem se falam. Os seus opositores, porém, têm estrutura ao constituírem um
grupo organizado, com coordenação, ideologia, operadores digitais e uma
estratégia de considerar todos aqueles que com eles não se identificam como
inimigos.
E os inimigos
escolhidos por este grupo foram atualmente os militares. Curiosamente, a
narrativa política deslocou-se do PT para estes indivíduos fardados como se
esses os ameaçassem verdadeiramente. O Vice-presidente Mourão foi alvo dos
maiores impropérios que nem merecem ser reproduzidos, de tão baixos que são.
Atentam à sua honra pessoal e à farda que sempre vestiu. Sempre teve uma
conduta exemplar no Exército, sendo um homem de convicções. O Secretário de
Governo, general Santos Cruz, tornou-se recentemente objeto de ataques do mesmo
tipo, sendo um exemplo para os seus companheiros de farda, com carreira ímpar
de combatente, pessoa também da mais alta retidão moral. Não se pode senão
qualificar de torpeza ética o que está acontecendo com eles.
Talvez o
presidente da República não tenha atentado convenientemente para o fato de ser
constitucionalmente Comandante-em-Chefe das Forças Armadas. Ele não é mais
deputado e, tampouco, capitão. Ele se situa acima dos generais e, enquanto tal,
deve defender a instituição militar enquanto tal e os membros que a compõem.
Não poderia, como fez, afagar e acariciar o detrator mor das Forças Armadas,
inclusive com a medalha da Ordem do Rio Branco, quando mais não seja pelo fato
de ser tal gesto contraditório com a função que exerce. Ou seja, o próprio
presidente é atacado quando a instituição militar é desta forma denegrida.
Para melhor compreendermos
o que está ocorrendo em termos de composição política e de ideias, não basta
caracterizarmos o atual governo como sendo formado por conservadores e
liberais, pois algo falta aqui. O grupo dito de conservadores é constituído por
um conservadorismo de tipo ideológico, alicerçado na concepção do político
enquanto distinção amigo/inimigo; por um conservadorismo digamos institucional,
composto por militares e uma ala evangélica que os apoia, e pelos liberais.
Os primeiros
procuram criar uma situação de instabilidade permanente, sempre atacando e
procurando um inimigo, com tal que haja um, por mais imaginário que
eventualmente seja. Nada têm a propor além destes ataques sistemáticos, como se
estivessem à frente de uma revolução, constituindo a sua vanguarda. Quando não
consideram o outro como espelho de si mesmos, o tomam por alguém perigoso. A
insegurança deles se traduz pela instabilidade de sua ação política.
Os segundos
têm como objetivo assegurar a prosperidade do país via a conservação de suas
instituições e dos seus valores. Caracterizam-se pela preservação da ordem
democrática, atentos a desvios que possam afetar o seu curso. O seu
conservadorismo, neste sentido, poderia ser qualificado como essencialmente
institucional, posicionando-se como liberais do ponto de vista da economia. A
pergunta que deveria ser colocada é a seguinte: o que procuram os que os
atacam? Qual seria o seu objetivo?
Os liberais
estão sobretudo voltados para as necessárias reformas econômicas, não tendo
entrado na refrega política. Sabem que tal grau de confronto só prejudica o
projeto reformista, sem o qual o país rumará para um futuro sombrio, com risco,
inclusive, institucional. Estão dando como pressuposto o liberalismo político
que caracteriza as instituições democráticas brasileiras, embora se possa
perguntar pela sua capacidade de resiliência se a reforma da Previdência não
for aprovada ou se o seu desfecho for pífio.
Que o Brasil
tenha mais pessoas com a visão do general Villas Boas!