Vale tudo: com Brasília em polvorosa, vem aí uma guerra
de acusações e versões
É uma grosseria ultrapassada tentar ainda hoje atingir o
Brasil com o carimbo de “Republiqueta de Bananas”, mas parece bem atual
considerar o País uma “República de Hackeados”. Nem o presidente da República
foi respeitado, imagine-se o resto. E, assim, Brasília está em verdadeira
polvorosa.
A referência mais direta a algo parecido foi quando se
descobriu que a NSA, uma agência norte-americana, tinha a audácia de grampear a
então presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e os telefones da principal empresa
nacional, a Petrobrás.
Naquela época, a motivação parecia econômica, comercial,
diplomática. Hoje, os “grampos” evoluíram para “hackeamentos” e a invasão de
celulares até do presidente Jair Bolsonaro tem um outro viés. A motivação pode
ser pura ganância, mas o uso não tem nada a ver com negócios. Logo, pode ter
sido político. Ou não.
É como a gente diz, a cada surpresa, a cada espanto: a
realidade supera a ficção. Estamos vivendo numa sessão ininterrupta de cinema,
intercalando filmes policiais, dramas e comédias pastelão, enquanto milhões de
desempregados estão na rua da amargura e há uma guerrinha ideológica insana,
quase infantil, entre uma esquerda acuada, deslocada da realidade, e uma
direita simplória, mas ousada, cheia de si.
Quando hackers têm a audácia de violar os celulares e as
conversas do presidente da República, dos presidentes da Câmara e do Senado, da
procuradora-geral da República, de ministros do Supremo e do STJ, dos ministros
da Justiça e da Fazenda, da líder do governo no Congresso... A gente começa a
pensar que tudo é possível. No início das investigações, a PF tinha certeza de
que o alvo era a força-tarefa da Lava Jato. Como se vê, vai muito além.
A biografia dos quatro criminosos presos não é animadora.
Não se trata de gênios da informática que atuam no ambiente internacional, nem
de uma quadrilha sofisticada a serviço de governos ou grandes corporações. Ao
contrário, os chefes de Poderes, as instituições, talvez as posições
estratégicas e até questões sigilosas de Estado, podem, em tese, ter ficado à
mercê de uma gangue cibernética de fundo de quintal. Vulnerabilidade
inadmissível.
Walter Delgatti, o “Vermelho”, que parece ser o chefe e
mentor das operações criminosas, é um bandidinho com ficha policial manjada:
roubo, estelionato, falsidade de documentos. Os demais movimentam volumes de
dinheiro incompatíveis com suas rendas oficiais. Todos são uns simplórios, mas
capazes de atacar o centro do poder federal e deixar muitas dúvidas.
Que uso Delgatti e seus comparsas poderiam fazer desse
material, que era colhido e em seguida publicado em parte? Nem econômico, nem
comercial, nem diplomático. O único objetivo, portanto, era vender o material
todo a quem interessar pudesse. Quem?
É exatamente nesse ponto que se misturam e se confundem
perigosamente as versões, inclusive tentando aproveitar a confusão e o medo
para adicionar o ingrediente político-partidário e jogar o PT no meio da
fogueira. Cuidado com isso! É cedo para conclusões.
É fato que os quatro presos são peixes muito miúdos para
serem os únicos ou mesmo os maiores responsáveis por um ataque com esse grau de
gravidade, atingindo os três Poderes. Mas, por enquanto, não dá para concluir
se agiram por conta própria para depois vender ou repassar para interessados,
ou se, muito diferentemente, receberam uma encomenda de grupos dispostos a
botar fogo no circo, implodir as instituições, gerar uma crise.
Meus caros e caras, Brasília está de pernas para o ar e,
até a conclusão das investigações, preparem-se para um festival de versões e
acusações mútuas. Estamos em plena República dos hackeados. Vale tudo.