A propaganda e a guerra psicológica têm seu papel nos
conflitos, mas só podem ser declaradas decisivas quando um lado decide
capitular apesar de ainda ter recursos suficientes para virar o jogo. Outro
jeito de ganhar guerras é eliminar o inimigo. Outra maneira é o armistício sem
capitulação. A Alemanha perdeu a Primeira Guerra Mundial do primeiro jeito, e a
Segunda do segundo. A Guerra da Coreia terminou do terceiro jeito.
Ganhar ou perder depende também, e muito, do objetivo
político proposto. Se a meta é eliminar o inimigo mas ao final ele foi apenas
contido, fica aquele gostinho ruim. Tipo a Guerra do Golfo contra Saddam
Hussein. Também por isso, ninguém deveria começar uma guerra sem ter ideia de
como acabar a dita cuja. Às vezes dá zebra. Só olhar as invasões inglesa,
soviética e americana no Afeganistão. Errar a conta do custo de ganhar uma
guerra é sempre complicado.
A batalha das manchetes e #hashtags na disputa da LavaJato
contra a VazaJato é divertida de ver, pois diz algo sobre quem ganha e quem
perde cada batalha, mas diz quase nada sobre quem vai ganhar a guerra. O que é
preciso olhar? O objetivo de cada um, e que lado tem mais recursos, ou recursos
suficientes, para atingir o objetivo proposto. Na Segunda Guerra morreram na
Europa duas vezes mais militares soviéticos do que alemães. E todo mundo sabe
quem ganhou no fim. #FicaaDica.
A LavaJato vinha vencendo a guerra havia cinco anos,
principalmente por causa da vantagem esmagadora de recursos. Um essencial, como
a operação sempre fez questão de enfatizar, era a aliança com a imprensa. Com o
controle quase absoluto dos instrumentos policiais e judiciais, a LavaJato
vinha voando este tempo todo em céu de brigadeiro, navegando em mar de
almirante. Mas a realidade mudou.
A LavaJato foi arrastada agora a uma guerra de atrito
contra uma tropa irregular aliada a parte dos antigos aliados da LavaJato na
imprensa. O que a LavaJato precisa para declarar vitória? Interromper as
revelações da VazaJato e impedir eventuais efeitos judiciais. Esta segunda
coisa ainda está à mão. Já a primeira, não. E do que a VazaJato precisa? Apenas
sobreviver. Isso está totalmente ao alcance dela, também por a disputa envolver
a liberdade de imprensa.
A linha de “caça ao hacker” faz sentido para a construção
de uma narrativa, mas não mata a VazaJato. Até agora, ao contrário, apenas
reforçou a autenticidade das revelações. Mesmo que as autoridades consigam
levar os hackeadores a admitir algum ilícito em associação com Glenn Greenwald,
isso não implicará os demais jornalistas do TheInterceptBR ou o próprio
veículo, uma pessoa jurídica, em qualquer crime.
Mesmo que as autoridades conseguissem fechar o
TheIntercepBR, isso não impediria os demais veículos parceiros de continuar
publicando reportagens a partir do vasto material. E se a Justiça brasileira
decretasse, numa hipótese hoje alucinada, a censura, a coisa poderia continuar
a ser divulgada a partir do exterior. Aí a proibição teria de partir, por
exemplo, do governo ou da Justiça nos Estados Unidos. Mas ali a liberdade de
imprensa está ainda mais protegida que aqui.
Onde está a brecha das defesas até agora erguidas pela
LavaJato contra a VazaJato? Para matar a divulgação, a LavaJato precisa atacar
e derrotar seu principal aliado dos últimos cinco anos e meio: a imprensa. E se
é verdade que a imprensa gosta da LavaJato, é natural que goste ainda mais de
preservar seu próprio poder. Por isso a imprensa está dividida. E também por
isso o objetivo militar da LavaJato na guerra contra a VazaJato é tão difícil
de alcançar.
Claro que há sempre a hipótese de a LavaJato recooptar
toda a imprensa. Mas esse haraquiri do jornalismo ainda não está no
radar.
E um detalhe: se a VazaJato é uma ameaça para Sergio
Moro, Deltan Dallagnol e outros menos visíveis, não chega a ser um problema
relevante para Jair Bolsonaro ou Paulo Guedes. E à medida que os personagens
principais vão se enrolando, as instituições a que pertencem são estimuladas a
ir se distanciando, mesmo que esse distanciamento seja disfarçado por
grandiloquentes declarações de apoio e solidariedade.
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Alon Feuerwerker
alon.feuerwerker@fsb.com.br