No “Brasil Bagunça”, o presidencialismo que queria ser parlamentarismo produziu uma Constituição torta, em que o presidente manda menos do que imagina e o Congresso, que deveria ser o fiscalizador dos demais poderes, está recheado de gente com o rabo preso. Temos um Senado que lembra aquele aluno desleixado, com tema de casa por fazer, mas que empurra o caderno e a lição com a barriga – salvo honrosas exceções, mas que não têm força para mudar o quadro. O que explica termos ainda uma figura como Gilmar Mendes na corte? O simples fato de não se declarar impedido de julgar um empresário do qual foi padrinho de casamento da filha já seria motivo suficiente para mandá-lo para a aposentadoria. Ele pode escolher ser juiz do processo ou ser padrinho de casório. As duas coisas, não dá. Mas o Senado levou o caso adiante? Não.
O que vimos nesta quarta-feira no inquérito das fake news é grave. E é importante frisar: não nutro nenhuma simpatia pelo senhor Allan dos Santos, menos ainda pelo seu trabalho. Sobre Roberto Jefferson, a história se encarrega de nos mostrar de quem se trata. Luciano Hang encarna, em parte, algo que sempre cobrei de parte do empresariado nacional: uma liderança que dá a cara a tapa, que externa posicionamento, que vai para a linha de frente. Não é perfeito e comete seus erros (vender arroz e feijão nas lojas para driblar restrições impostas pelos decretos em meio à pandemia é apenas um exemplo). Mas mesmo que, em tese, todos eles tenham culpa no cartório, tenham ultrapassado limites legais e sejam merecedores de uma punição, o que vimos nesta quarta-feira não representa, sob hipótese alguma, o caminho da segurança jurídica. Pelo menos não de países sérios.
O Supremo, que instituiu uma espécie de autossuficiência neste episódio das fake news, transformou em peça decorativa o Ministério Público e a Polícia Federal em mero garoto de recado. Investigadores e delegados não apuram e simplesmente são levados a reboque por aquilo que um dos togados determina. O MP assiste a tudo e se pergunta: onde eu entro nesta história? Resposta: não entra. Não foi a primeira vez. Em abril do ano passado o general da reserva Paulo Chagas teve o computador apreendido dentro do mesmo processo.
Aos fanáticos da esquerda, que estão comemorando, lembro que o ativismo de rede, que originou o inquérito no STF, não é obra exclusiva dos atuais investigados. Vou recordar a expressão MAV: militância em ambientes virtuais, gente treinada para fazer das redes sociais um território de combate permanente, espalhando mentiras e arrebentando com a reputação alheia. É um problema que começou quando tínhamos o PT no poder.
O inquérito das fake news é um bom exemplo da bagunça em que se transformou o país. Quando o STF se diz vítima e assume o protagonismo de todas as etapas de um processo legal – ele mesmo investiga, ele mesmo apura, ele mesmo julga –, ele (ou já deveríamos escrever “Ele”, usando letra maiúscula?) acaba enfraquecendo as demais instituições. Em uma análise extrema, alguns podem entender um recado equivocado: faça justiça com as próprias mãos.