Astor Wartchow - Biopolítica e a nova guerra fria

Advogado

Com o advento da pandemia, mas principalmente  em decorrência do conjunto de providências impositivas e restritivas adotadas pelas nações - isolamento e distanciamento social, fechamento de atividades sociais e comerciais, etc..., vem a debate a expressão biopolítica.

Termo e significação não são novidades no meio acadêmico, nem tampouco a respectiva e expressiva produção literária. Entre os autores mais conhecidos destaca-se originariamente o  filósofo frances Michel Foucault (1926-1984).

Foucault discorreu sobre as variações históricas nas práticas de poder, quase sempre assentadas sobre repressão, ameaça e mortes,  destinadas aos indivíduos. 

No início do século XX, contrariamente, dizia que na biopolítica, ou nos biopoderes locais,  a população (como um todo) pode ser instrumento e objeto nas relações de poder. 

Este poder concentrado (do Estado) seria uma derivação dos inúmeros avanços sociais relacionadas à saúde individual e coletiva, a exemplo de alimentação, higiene, natalidade, sexualidade, enfim, resumidos como gestão de saúde pública. 

Mas, uma vez politizada e ideologizada, a gestão de saúde não deixava de ser uma forma de controle estatal. Não como punição, mas como preservação da vida. Ou seja, a vida passa a fazer parte do campo e exercício de/do poder. 

Seria a biopolítica, os biopoderes. Base da governamentalidade. Ao analisar a obra de Foucault, em 2019, o sociólogo alemão Thomas Lemke (Universidade Goethe-Frankfurt) perguntava:

"Seria possível negar que vivemos hoje em uma sociedade de controle, tendo em vista as orwellianas medidas de controle surgidas após o 11 de Setembro? 

A governamentalidade esclarece e analisa as relações  entre disciplina, segurança, controle estatal e liberdade dos cidadãos nas sociedades ditas democráticas".

Feita esta introdução, e retomando o título, observemos o seguinte: neste momento, há quase duzentas vacinas em desenvolvimento. Dentre estas há seis muito adiantadas. Em ambiente de competição e tensão, China, Estados Unidos e Rússia monopolizam a corrida. 

Como narrativa histórica, os russos asseguram haver obtido sucesso e, provocando os Estados Unidos, batizam sua vacina de Sputnik 5, uma menção ao primeiro satélite artificial, na inauguração da corrida espacial, em 1957. 

Enquanto isto, de olho nas próximas eleições presidenciais, ao antecipar movimentos e deliberações acerca da utilização das futuras  vacinas, João Dória e Bolsonaro travam a sua guerra fria.  

É biopolítica, são os biopoderes!