No início de 2020, o novo coronavírus mostrou sua ira, provocando o que talvez
seja a maior catástrofe sanitária global da história. Não havia vacinas disponíveis, sequer
medicamentos específicos para enfrentá-lo, como solução para o caos e a morte,
superdimensionados por grande parcela da mídia, que levou o medo e o terror às
pessoas. Todos sonhavam com a chegada de um tratamento e com a cura e,
consequentemente, com a volta à normalidade. Naquela época, escrevi o artigo “O
amanhã, como será?”. Uma primeira tentativa de entender o que estava acontecendo e
de projetar o que poderia vir a ser o “novo normal”.
É verdade que a chegada da pandemia da Covid-19 “contaminou” todos os países
de forma inédita e forçou as pessoas a se isolarem em suas casas e a encararem novos
hábitos e formas de convivência social e profissional. Milhares de empresas, lojas e
restaurantes fecharam as portas e milhões de trabalhadores sofreram com o
desemprego e a fome. No Brasil, a grande mídia elevou a doença a um apocalipse,
transformando seus noticiários em informes funerários, indigestos de assistir.
Infelizmente, em nosso país, a doença foi politizada. No Senado, uma CPI foi criada e
questionada pelas atitudes de seus integrantes. Paralelamente, alguns governadores e
prefeitos passaram a ser investigados por desvios e fraudes cometidas com os recursos
federais, liberados para salvar vidas e impedir a falência de empresas e a fome das
famílias.
O momento atual é tenso. Mas, como será o amanhã? O que será de nós após a
pandemia? O que será da economia? Será que as pessoas vão se lançar às ruas como
faziam antes do surgimento do novo coronavírus?
A resposta para esta última pergunta é sim, as pessoas já estão de volta às ruas.
Em muitos estados e no Distrito Federal, por exemplo, o uso de máscaras já não é mais
obrigatório em lugares públicos abertos. Com o avanço da imunização completa dos
brasileiros, só vai usar máscara quem quiser, mesmo em lugares fechados. Mas, para
muitas pessoas, o acessório será indispensável, a exemplo do que vemos, há décadas,
nos países asiáticos.
E a economia?
Muitas empresas e órgãos públicos perceberam que o home office é um fator de
considerável economia, principalmente na hora do pagamento do aluguel e das contas
de água, luz e internet. Para o patrão, é muito melhor manter seus funcionários em
casa e suas contas no azul, alugando um espaço menor, reduzindo custos. Essa nova
tendência, inclusive, deve gerar um problema no mercado imobiliário e grandes espaços
tendem a ficar fechados se os valores da locação não forem revistos e reduzidos
consideravelmente.
O e-commerce chegou para ficar. Deixou, definitivamente, de ser uma mera
alternativa de compras. Muitas lojas físicas estão modernizando suas atividades e
passando a conciliar suas vendas físicas com as online. É possível que shopping centers,
por exemplo, comecem a registrar debandada de lojistas, com o encolhimento do
comércio tradicional. Muitas empresas e lojas vão precisar de um bom trabalho de
comunicação e de marketing, principalmente nas redes sociais, para sobreviver.
Restaurantes, lanchonetes e cafeterias são uma boa surpresa. No artigo que
escrevi em janeiro de 2020, eu acreditava na redução radical do público nessas casas.
Acreditava no fim dos restaurantes self-services e que os clientes passariam a fazer o
consumo em casa, com o fortalecimento do delivery. Eu estava enganado, em parte. O
delivery ganhou força, inegavelmente, mas os self-services continuam funcionando. A
diferença é que, em alguns casos, a área das comidas fica isolada por vidro ou acrílico
e o cliente veste luva de plástico descartável para se servir, sempre com o uso de
máscara obrigatório.
Um dos segmentos que mais cresceram com a pandemia foi o da educação à
distância ou online. Eu mesmo aproveitei o período de confinamento forçado para
aperfeiçoar meus conhecimentos. A Escola Virtual de Governo, da Escola Nacional de
Administração Pública (Enap), por exemplo, informou que, desde 1º de março de 2020
até 1º de julho de 2021, foram registradas 2,3 milhões de inscrições em cursos online.
O levantamento mostrou que quase 1,5 milhão de novos usuários entraram na
plataforma desde o início da pandemia.
O setor de turismo é outro que está retomando suas atividades. As companhias
aéreas já registram 70% do movimento que apresentavam antes da pandemia, apesar
que muitos eventos institucionais estão acontecendo de forma virtual ou híbrida. Falase muito em “passaporte vacinal” ou a apresentação de comprovante de vacina para
obter acesso a determinados eventos. Acredito que, em breve, esse tipo de exigência
não será mais necessário.
E quem não se lembra do caso do navio Diamond Princess, onde mais de 500
pessoas ficaram sob quarentena, no início da pandemia, em Yokohama, no Japão?! O
setor de cruzeiros marítimos foi um dos primeiros a sofrer o baque da pandemia. Hoje,
algumas companhias estão incorporando novos hábitos e rotinas e inserindo novas
tecnologias a seus navios, como a instalação de filtros de ar capazes de remover quase
100% dos patógenos aéreos. Outras estão adotando elevadores com comando de voz
ou movimento, para que não seja necessário tocar nos botões. Também já existem
aplicativos e dispositivos que permitem que os passageiros abram portas remotamente,
inclusive da cabine, e até paguem pelo consumo a bordo, sem que o tripulante precise
tocar o seu cartão individual.
As empresas de bicicletas e patinetes compartilhadas, apesar das sombrias
previsões iniciais, estão voltando e fazendo sucesso entre seus usuários, inclusive aqui,
em Brasília, onde resido. Casas noturnas, bares, cinemas e teatros, além de estádios
esportivos, registram gradativa volta do público, apesar do alerta de alguns
infectologistas que ainda insistem na possibilidade de uma terceira onda da doença. No
caso das academias de ginástica, por exemplo, a entrada de alunos por biometria está
sendo substituída pela tecnologia do reconhecimento facial e recipientes com líquido
sanitizante são disponibilizados em cada aparelho.
Já falei aqui sobre videoconferências, mas tem um aspecto que preciso ressaltar.
No mundo profissional, principalmente, essas reuniões virtuais vão se tornar rotina.
Lembro, no começo da pandemia, quando as pessoas tiveram que ficar em casa e
conversar ou se reunir virtualmente. Aconteceram muitos casos engraçados, grotescos
e bizarros, com pessoas flagradas despidas, soltando flatulências e até transando. Hoje,
as plataformas estão mais preparadas para este tipo de situação e já disponibilizam
fundos personalizados ou desfocados.
O importante, é que o “novo normal” não vai ser muito diferente do que já
conhecíamos antes da pandemia. Com certeza, a história será dividida em "Antes da
Covid-19” e “Depois da Covid-19", mas nossa adaptação a esses novos tempos não será
tão sacrificante.
Fábio Paiva é jornalista