Aquelas pessoas que eu admirava...
Durante toda a minha vida, ouvi o mesmo discurso de
amigos e conhecidos. A mesma queixa, feita num tom entre o amargo e o irônico,
entre o resignado e o enojado: o problema do Brasil era a impunidade, os
poderosos jamais pagariam por seus crimes e tudo ficaria para sempre como
sempre foi. O Brasil não tinha jeito.
Esses meus amigos, muitos deles intelectuais,
jornalistas, advogados, políticos, quase todos “de esquerda”, esses meus amigos
suspiravam pelos países mais desenvolvidos, onde não havia tolerância com quem
descumprisse a lei. Pois bem. Houve uma mudança no Brasil. Poderosos que
descumprem a lei estão sendo investigados, processados e punidos. E aqueles
meus amigos agora vão a público para reclamar... da punição.
O juiz Sergio Moro é o grande alvo desses intelectuais.
Tenho lido e ouvido todo gênero de invectivas contra Moro, egressas inclusive
de pessoas que eu admirava intelectualmente (sim, está no passado: admirava).
A má intenção das análises é compreensível: é fruto do
dogma partido, das ilusões perdidas, das convicções abaladas.
Já a desinformação é imperdoável, sobretudo quando
propagada por profissionais da informação. Moro é tratado por esses
intelectuais como justiceiro. Bem. Mesmo que ele quisesse ser um justiceiro,
não conseguiria. Moro é juiz de primeira instância, não tem poder suficiente
para fazer o que seus críticos acham que faz.
Ontem, conversava sobre isso com o desembargador Eduardo
Delgado, meu amigo, também ele perplexo com as reflexões absolutamente
equivocadas cometidas por alguns de meus colegas. Eduardo lembrou que as
decisões de Moro são revistas por no mínimo outros SEIS juízes, três
desembargadores do TRF de Porto Alegre e três ministros do STJ. Isso se o caso
não for parar no STF. Quer dizer: são TRÊS INSTÂNCIAS depois de Moro. Três
instâncias que podem mudar tudo o que ele determinar. Moro não manda nada.
No famoso caso do Banestado, muitas das decisões de Moro
foram revisadas pela mesma segunda instância que as apura hoje, o Tribunal
Regional Federal, sediado em Porto Alegre. Moro condenou muita gente, naquele
episódio, e a maioria de suas sentenças foi reformada. É provável que ele tenha
aprendido com a experiência, porque, hoje, o índice de aprovação das suas
decisões é de 96,4%. Considere que os advogados de defesa são alguns dos
melhores do Brasil, e não há como não chegar à conclusão de que, pelo menos
tecnicamente, esse é um juiz corretíssimo. Mas é erro grave acreditar que Moro
é o único neste processo de transformação do Brasil.
Há outros juízes, promotores, policiais e funcionários
públicos envolvidos, todas “pessoas comuns”, nenhum deles poderia ser definido
como um dos "poderosos" dos quais reclamavam meus amigos antigamente.
São homens como eu e você, profissionais que estão fazendo apenas o que todos
tentamos fazer: eles estão fazendo o seu trabalho. Estão fazendo a coisa certa.
Mesmo assim, são criticados por esses intelectuais. E é isso que mais
entristece, na situação do Brasil de hoje.
É descobrir que os que criticavam a impunidade dos
poderosos não combatiam a impunidade: combatiam "aqueles" poderosos.
Porque hoje, quando os poderosos são amigos deles, ou
estão no mesmo lado, eles anseiam pela impunidade, eles criticam a punição.
Lembro desses meus amigos, colegas e conhecidos, tempos atrás. Como poetou
Belchior e cantou Elis, na parede da memória, essa lembrança é o quadro que dói
mais. Minha dor é perceber que, apesar de termos feito tudo o que fizemos,
ainda somos os mesmos. E vivemos como nossos pais.
Nota DEZ pro Coimbra e mais DEZ pro Polibio que publicou e pude ler.
ResponderExcluirEstes realmente são os famosos ESQUERDA CAVIAR. Realmente uma pena. São os únicos justos.