O texto a seguir foi escrito por Leo Iolovicht em1991 e foi publicado no livro "O sapato do Pirada, 1995. Nele o escritor gaúcho previa: "Por tudo isso, talvez se apele ao Oscar Niemeyer (é
claro que seria ele, sempre ele) para fazer um "Memorial ao
Comunismo".O ideal seria construir ali na av. João Pessoa, ao lado do
templo Positivista, para se cultuar a memória do Comunismo.Um enorme casarão
vermelho seria ótimo". 26 depois, Iolovitch acertou a previsão. Errou apenas o local, porque o
memorial vai ser inaugurado junto ao Parque da Harmonia.
Abaixo o texto, que é da época da queda do regime da
URSS.
O FIM DO COMUNISMO
Os recentes acontecimentos na União Soviética
determinaram o fim do comunismo.
Quase todos concordam com esta conclusão. O que parece
difícil é entender ou tentar explicar este fenômeno.
Afinal, o Comunismo era algo importantíssimo no Mundo.
Milhões de pessoas viviam sob o regime Comunista. Este quadro tinha uma
aparente durabilidade, parecia algo sólido, estável e que permaneceria durante
séculos. Os comunistas eram ardorosos defensores de suas idéias, todos nós
conhecemos diversos de seus seguidores, entre os quais se incluiam algumas
pessoas bastante respeitáveis. A pretensão dos comunistas era expandir o regime
e, para eles, o Mundo só seria bom, quando todos os países fossem comunistas.
Aí, de repente, ploft. Acabou !
Desmoronou igual a um castelo de areia.
A revolta das populações,que viviam sob o regime, contra
o sistema, foi de tal ordem, que não deixou dúvidas, quanto ao repúdio a este
tipo de governo.
E agora ? Algo tão importante e tão presente em nosso
cotidiano deixa de existir. Como poderemos explicar aos nossos filhos, daqui a
cinco ou dez anos, o que era o Comunismo? Nós quando jovens nos inspirávamos na
bonita e romântica figura do "Che" Guevara. Será que surgirão
sucedâneos para as novas gerações ? Com certeza não serão os " band
leaders" de grupos de rock. Pois o romantismo irracional do
"Che", morrendo esfaimado, lutando numa guerrilha impopular, num país
estranho, em nome de uma idéia e da igualdade, tinha um apelo fantástico. Sua
frase que prega a dureza, sem perder a ternura, era um hino para nossa
juventude sonhadora.
Porém, se ele estivesse vivo, veria a revolução cubana
transformada numa das últimas ditaduras da Terra. Os tempos modernos não deixam
mais espaço para heróis como antigamente...
E aqueles senhores bonachões?
Alguns tão bem formados intelectualmente. Tão seguros em
suas convicções. Reagiam com desprezo, quando se criticavam as ditaduras dos
países comunistas, dizendo que era coisa da propaganda imperialista.
Onde estarão eles ?
A revista Seleções era considerada o porta voz
reacionário do capitalismo internacional, porque costumava denunciar os
horrores das ditaduras comunistas. Hoje, tudo leva a crer que ela tinha razão.
E lá se foi o Comunismo.
Com ele vai também um pouco de nós, que vivemos este
período. Fica uma estranha sensação de envelhecer mais rapidamente.
Por isso, quando alguém mais jovem nos perguntar, no
futuro, pelo Comunismo, a explicação deverá ser algo semelhante, ao que
acontecia quando perguntávamos aos nossos pais sobre o Positivismo...
Augusto Comte, Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros,
"Ordem e Progresso", aquele estranho templo ali na av. João Pessoa,
tudo são evocações do Positivismo. Uma corrente do pensamento que dominou o
nosso Estado no início do século. Que foi importantíssima naquela época, hoje
não passa de um amontoado de lembranças esparsas e bizarras. Quem diria?
Com o Comunismo será a mesma coisa ?
Livros da Editorial Vitória, obras completas de Marx
& Engels, bandeiras vermelhas, visitas ao túmulo de Marx em Londres, o
Materialismo Histórico, o Realismo Socialista,
discos com a Internacional, fotos de churrascos em
homenagem ao Jorge Amado e ao Prestes, souvenirs dos Congressos Internacionais
da Paz, posters de Rosa de Luxemburgo , tudo é passado.
Mas não jogue fora. Nem precisa esconder. Felizmente o
DOPS e outras criações monstruosas do regime autoritário também não existem
mais. Não há mais condições para ditaduras, sejam de que tipo for.
Mas qual será a utilidade futura deste espólio,
supostamente ideológico?
Poderão vir a ser solicitadas em gincanas, como
raridades, ou no Brique pode ser criado um mercado de trocas; algo assim como:
"Troco uma coleção encadernada da Seleções pelas
obras completas de Stalin. Ou uma camiseta do Partidão por um par, mesmo usado,
de tênis Nike. Ou, ainda, um LP do Taiguara por qualquer coisa ou coisa
nenhuma."
Por tudo isso, talvez se apele ao Oscar Niemeyer (é claro
que seria ele, sempre ele) para fazer um "Memorial ao Comunismo".O
ideal seria construir ali na av. João Pessoa, ao lado do templo Positivista,
para se cultuar a memória do Comunismo.Um enorme casarão vermelho seria ótimo.
Encerrando esta Sessão Nostalgia sobre o finado Comunismo fica a derradeira constatação
:
Lá na Disneyworld. No World Showcase,o espaço das nações
do Epcot Center, será construída uma bela e grandiosa reprodução da Praça
Vermelha, do Kremlin e todo seu interessante conjunto arquitetônico. E o que é
mais extraordinário, face à manifesta rejeição dos moscovitas, os restos
mortais de Lênin seriam retirados da capital russa . A solução seria
transferi-los para a Flórida.
O Mausoléu de Lênin na Disneyworld, com visitação paga e
direito a um passeio na "Montanha Russa" seria a suprema derrota do
Comunismo. Mas na velocidade em que os fatos estão acontecendo não seria de
duvidar.
Mesmo belas idéias, quando se valem da força, terminam
assim...
Afinal, a história e a vida costumam ser implacáveis com
a mentira e a opressão.
Com todos os seus defeitos não existe regime melhor que a
democracia.
O patético fim do Comunismo pode surpreender alguns. Mas
não seria de estranhar que viesse a ocorrer. Não poderia dar certo um
movimento, sedizente popular, cuja palavra de ordem era: "Uni-vos!"
Desculpe-nos Karl.
A teoria na prática não deu certo.
Velho de barba branca agora só: Papai Noel.
PS.
Esta crônica foi escrita em agosto de 1991, quando o
regime comunista na antiga União Soviética estava quase terminando.
Os fatos vieram a confirmar as previsões. Cabendo
destacar um aspecto curioso. Em julho de 1992, visitando o Hard Rock Café, em
Orlando na Flórida, encontrei ao lado dos painéis dedicadas a imagens e objetos
de Elvis Presley, John Lennon, James Dean e outros ídolos da juventude
americana, uma parede inteira com fotos e posters de Lênin...
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