Em um país com 13 milhões de desempregados e brutal
concentração de renda, o auxílio-moradia é um tabefe na cara dos brasileiros.
Para quem não sabe, trata-se daquela (baita) ajuda de R$ 4.377 mensais que
garante casa para quem... já tem onde morar. A bofetada dói mais ainda quando
percebemos que os beneficiários desse mimo são os mesmos que cobram moralidade
dos demais cidadãos.
O que justifica o pagamento de auxílio-moradia para quem
já tem casa?
Como tudo que
envolve remuneração de servidores públicos, os números são grandiosos.
Levantamento da Consultoria Legislativa do Senado aponta que a União gasta R$
1,6 bilhão por ano com o benefício somente para atender Judiciário, Ministério
Público e tribunais de contas dos estados e do DF. Legislativo e Executivo
estão fora deste cálculo.
De acordo com a
ONG Contas Abertas, de setembro de 2014 (quando Luiz Fux, do STF, permitiu o
pagamento provisório do auxílio) até dezembro de 2017, foram destinados R$ 5
bilhões ao auxílio-moradia para juízes e procuradores. E o rombo pode ficar
ainda maior, pois a Marinha e o Exército já reivindicaram o benefício, abrindo
caminho para que outros busquem o mesmo.
Há dois pontos
relevantes envolvendo o tema. O primeiro é o constitucional: frequentemente o
valor ultrapassa o teto dos vencimentos dos servidores, de R$ 33,7 mil. Sem
contar que o penduricalho é isento de imposto. Contudo, mais grave é o aspecto
moral: o que justifica o pagamento de auxílio-moradia para quem já tem casa?
Ora, se alguém o merece são os servidores com baixa remuneração e obrigados a
viver longe de suas residências. Não é o caso dos juízes, que recebem em média
R$ 47,7 mil por mês, segundo o CNJ. E o valor, que o presidente do Tribunal de
Justiça de SP definiu ironicamente como sendo "muito pouco", é maior
que a renda de 90% dos brasileiros.
Tudo isso se
desenvolve num cenário de gravíssima crise fiscal, com União, Estados e
municípios tendo cada vez menos recursos para bancar suas funções essenciais. O
Brasil começa este ano devendo R$ 159 bilhões – valor do déficit orçamentário.
Em março, depois de três anos de procrastinação, o STF deve realizar o
julgamento sobre a constitucionalidade. Portanto, é hora de a sociedade
pressionar os onze juízes da Suprema Corte para que acabem com esse privilégio.
E, assim, nos concedam um auxílio-moralidade.