Discurso de Claudio Lamachia

Winston Churchill dizia que a democracia é o pior dos regimes, excetuados todos os outros.

Reconhecia, assim, sua imperfeição, embora paradoxalmente opção única dada à civilização para seguir em frente, aperfeiçoando-se e corrigindo-se.

E o meio pelo qual se exerce essa permanente correção é pelo voto - secreto, soberano e periódico do povo. É um regime em que o erro jamais é definitivo. Pode ser corrigido e mudar os rumos do país.

Essa simples possibilidade, que não é utópica – é real, concreta – precisa ser exercida. O fato de não o ser indica carência de educação política do eleitor, falta de consciência do poder que tem – e que confere substância ao inciso 1º, do artigo 1º da Constituição, segundo o qual “todo o poder emana do povo”.

Se tem o poder e não o exerce, torna-o inócuo. Pior que isso: transfere-o a pessoas desqualificadas e delas se torna refém. Daí o dito que sustentamos – e não nos cansamos de repetir: voto não tem preço; tem consequências. E elas estão aí, à nossa vista. A consequência de escolhas mal feitas resultou nessa crise ética e moral sem precedentes.

Temos testemunhado, nos últimos anos, o desencanto da sociedade brasileira com seus representantes. A reação às denúncias de corrupção é cada vez mais intensa, mais dramática. Mas a responsabilidade pela degradação da política não pode ser atribuída apenas aos eleitos (embora lhes caiba responsabilidade diferenciada), mas também a quem os elegeu. Governaram com os votos da maioria. Não chegaram lá do nada. Receberam mandato do povo.

Estão hoje na cadeia alguns políticos graduados.

Estão condenados e os crimes que cometeram são repugnantes.

Mas, é preciso insistir, os cargos de que se valeram para fazer o que fizeram lhes foram dados por milhares, quando não milhões, de eleitores. Eleitos e reeleitos. Foram postos ali pelo eleitor, em votação secreta, por livre e espontânea vontade.

É possível que a atual crise venha a estabelecer uma mudança de paradigma no voto, um reconhecimento de seu valor. As crises costumam ter natureza purificadora.

E esta Corte, que tem compromisso de zelar pelo rito máximo da democracia, que são as eleições, exerce também papel de esclarecer, conscientizar a população do sentido quase sagrado do voto.

Sabemos que grande parte do eleitorado foca seu interesse nas eleições majoritárias, de presidente e de governador, desdenhando da importância dos candidatos ao Legislativo. Alguns chegam a pedir, na fila de votação, dicas para o nome do deputado em que votarão. O resultado é o que temos visto. Mas é preciso que se diga que também obtivemos avanços. Um deles, que reputo o mais expressivo, é, sem dúvida, a Lei da Ficha Limpa, que permite uma triagem prévia ao eleitor, evitando que condenados em segunda instância possam se candidatar.

Outra que destacaria é a proibição de financiamentos empresariais para partidos e candidatos.

As eleições deste ano, em face da magnitude da presente crise, será uma das mais importantes de toda a história.

No eleitorado, percebem-se duas atitudes antagônicas: de um lado, os que, descrentes, estão determinados a abster-se; de outro, os que, inversamente, estão determinados a agir, a influir na mudança de rumos do país. A maioria, felizmente, é proativa, mas não podemos descuidar do desencanto da minoria.

Precisamos incentivá-la a crer na eficácia corretiva da democracia, que, como nos advertiu Churchill, é o que temos para um dia torná-la o que dela disse Aristóteles: “A mais nobre das atividades humanas”. Que assim seja.

Estamos certos de que a Justiça Eleitoral, conduzida neste triênio pelo ministro Gilmar Mendes, continuará em boas mãos com o ministro que o sucede, Luiz Fux, e da sua vice, Ministra Rosa Weber. Por meio de ambos, cumprimento os demais integrantes desta Corte – os que se despedem e os que chegam, desejando a ambos muito sucesso

A missão que os aguarda é, sem dúvida, de imensa responsabilidade. E desde já os olhos e as expectativas da sociedade estão postos aqui, nesta Corte que é a guardiã da democracia brasileira. Que Deus os ilumine.


Nenhum comentário:

Postar um comentário