Como Israel deu um golpe letal no ‘Eixo da Resistência’ criado pelo Irã

O Irã uniu milícias para enfrentar Israel, mas, enquanto os israelenses atacam uma delas, o Hezbollah, o restante até agora falhou em ajudar o grupo

Por Ben Hubbard (The New York Times) e Alissa Rubin (The New York Times)

A ideia era simples: quando estourasse uma grande guerra com Israel, todos os membros da rede de milícias apoiada pelo Irã no Oriente Médio, conhecida como “eixo da resistência”, se juntariam à luta em um esforço coordenado rumo ao seu objetivo compartilhado de destruir o estado judeu.

O Irã criou essa estratégia e investiu recursos tremendos para desenvolver as habilidades de combate de cada grupo e conectá-los uns aos outros.

Mas a resposta desse eixo enquanto Israel massacrava o Hezbollah no Líbano nas semanas mais recentes — matando muitos de seus comandantes e assassinando seu líder — tem sido fraca até agora, sugerindo que o eixo é mais tênue e mais fragmentado do que muitos na região esperavam, e que o Irã temia que a ampliação da guerra pudesse fazer com que Israel voltasse seu poder de fogo contra Teerã.

“Desde o início, o chamado eixo da resistência foi mais ou menos uma ficção de propaganda criada para aumentar o prestígio da República Islâmica”, disse Ali Alfoneh, um membro sênior do Arab Gulf States Institute em Washington.

Nos últimos anos, disse Alfoneh, os membros da rede registraram algumas pequenas vitórias militares, “mas, em se tratando de adversários mais sérios, ou um ator estatal como Israel, o jogo é diferente”.

Batalhas locais

O Irã montou o eixo a partir de grupos armados que compartilhavam antipatia por Israel e os Estados Unidos, mas até então vinham travando batalhas mais locais. Os Estados Unidos classificam a maioria deles como organizações terroristas.

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O Hamas, cujos membros são predominantemente refugiados palestinos ou seus descendentes, vinha lutando contra Israel diretamente por décadas, mais recentemente em Gaza.

Na Síria — o único estado membro do eixo além do Irã — o governo do presidente Bashar Assad manteve um estado oficial de guerra com Israel, mas manteve a calma na sua fronteira disputada.

O Irã também apoiou milícias anti-Israel na Síria e no Iraque, onde os iranianos equiparam alguns dos grupos que lutaram contra os EUA após sua invasão em 2003 e depois lutaram contra o Estado Islâmico. Quando esses grupos ganharam poder político, eles deram ao Irã uma participação na política interna do Iraque.

Mas é o Hezbollah, formado no Líbano com orientação iraniana direta no início dos anos 1980, que é há muito tempo o membro sênior do eixo, e seu líder recentemente assassinado, Hassan Nasrallah, foi o fio que ajudou a manter tudo junto. Por causa de sua longa história e conexões íntimas com o Irã, onde muitos de seus comandantes receberam treinamento, o Hezbollah tem melhores habilidades táticas de batalha e armamento superior, como mísseis guiados.

E, ao contrário dos iranianos, os combatentes libaneses falam árabe, permitindo que o Hezbollah envie seus especialistas para compartilhar habilidades com os outros grupos, aumentando a capacidade do Hamas de construir túneis, por exemplo, e as capacidades de mísseis e drones dos iraquianos e houthis. Nasrallah também forjou laços pessoais com os líderes dos outros grupos, servindo como conselheiro e modelo de comportamento.

É por isso que a rápida série de ataques de Israel ao Hezbollah nas duas semanas mais recentes — detonando milhares de seus pagers e walkie-talkies, matando muitos de seus principais comandantes e assassinando Nasrallah com enormes bombas ao sul de Beirute — abalaram tanto os outros membros do eixo. Eles pareciam não estar preparados para a possibilidade de o Hezbollah sofrer perdas tão devastadoras.

Confusão

Ainda não está claro por que eles não correram em auxílio do Hezbollah nas semanas em que Israel estava intensificando seu ataque ou nos dias desde que Nasrallah foi morto, mas parece que havia uma crença profundamente arraigada entre eles de que o Hezbollah poderia se defender contra Israel. E a reticência do Irã em direcionar uma resposta imediata — pelo menos até agora — os deixou confusos quanto aos próximos passos militares.

Assad, na Síria, esperou dois dias após a morte de Nasrallah para emitir uma declaração de luto por ele, embora o Hezbollah tenha enviado milhares de combatentes para repelir os rebeldes que ameaçavam seu governo há apenas alguns anos.

O Hamas está degradado demais após quase um ano de guerra com Israel em Gaza para fazer muita coisa.

Os Houthis no Iêmen e as milícias na Síria e no Iraque lançaram ataques contra Israel ou bases militares americanas no Oriente Médio, mas eles foram amplamente repelidos.

Nem mesmo o próprio Irã, o fundador do eixo, tomou alguma ação clara para salvar o Hezbollah ou se juntar à luta. O novo presidente do país, Masoud Pezeshkian, disse aos líderes mundiais na Assembleia Geral das Nações Unidas na semana passada que seu governo queria acalmar as tensões e se entender com o Ocidente. O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, sugeriu que o Hezbollah tinha que traçar seu próprio caminho.

“Todas as forças da resistência apoiam o Hezbollah”, disse Khamenei. “Será o Hezbollah, no comando das forças de resistência, que determinará o destino da região.”

Teerã parece estar dividida entre o desejo de retaliar contra Israel e o medo de que isso possa levar Israel a atacar o Irã diretamente.

“Eles estão em um impasse estratégico, porque, se não fizerem nada, isso os enfraquecerá ainda mais, erodindo sua credibilidade e sua capacidade de dissuasão”, disse Kawa Hassan, um membro não residente do Programa Oriente Médio e Norte da África do Stimson Center. Mas, se os iranianos responderem, disse ele, isso arriscaria provocar Israel em um momento em que o país parece “realmente pronto para ir atrás deles”.

Especialistas ofereceram várias explicações para a resposta fraca — pelo menos até agora — dos aliados regionais do Hezbollah.

A aliança sempre foi frouxa, com o Irã deixando os membros do eixo livres para tomar suas próprias decisões, mesmo quando isso significava começar batalhas que davam dores de cabeça ao Irã. Os Houthis contrariaram os conselhos do Irã e tentaram assumir todo o Iêmen, e o Hamas não coordenou seus esforços com o Irã antes de lançar o ataque de 7 de outubro a Israel que deu início à guerra de Gaza.

Desde a morte de Nasrallah, na sexta feira, os comandantes de dois grupos armados no Iraque disseram ao New York Times que não receberam instruções do Irã a respeito de como responder. Falando sob condição de anonimato para não irritar seu patrono, um deles disse que todos ainda estavam em choque com a morte de Nasrallah.

Thomas Juneau, que ensina relações públicas e internacionais na Universidade de Ottawa, disse que, enquanto a violência entre Israel e seus inimigos fosse baixa, o Irã poderia manter a “percepção de que o eixo da resistência estava, se não vencendo, pelo menos marcando pontos importantes”.

Mas, uma vez que Israel fez valer todo o peso de sua superioridade militar e tecnológica, o Hezbollah foi subjugado. “Estamos em uma guerra convencional, e a dominação significativa e clara de Israel agora é evidente”, disse Juneau.

Atores regionais

Especialistas alertaram, no entanto, que os membros da rede continuam sendo importantes atores regionais. Mesmo que seus membros tenham lutado nos meses mais recentes para infligir danos graves a Israel, o patrocínio iraniano aumentou significativamente seu conhecimento militar, aumentando sua capacidade de exercer poder na vizinhança de Israel.

O exemplo mais dramático são os Houthis, que se transformaram de uma milícia desorganizada em uma força capaz de interromper o tráfego marítimo no Mar Vermelho e que aterrorizou a Arábia Saudita por anos com seus mísseis, embora o reino tenha gasto bilhões de dólares em armamento americano.

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Além disso, embora Israel tenha desferido golpes profundos contra o Hezbollah, a história da região está repleta de exemplos de tais grupos revidando de forma feroz, como fez o Hezbollah após sua última guerra com Israel, em 2006, e como fez o Hamas quando surpreendeu Israel com seu ataque de 7 de outubro.

E as operações militares de Israel em Gaza, na Cisjordânia e agora no Líbano provavelmente só alimentarão a raiva que leva as pessoas a se juntarem a esses grupos, disse Dalia Dassa Kaye, pesquisadora sênior do Burkle Center for International Relations da Universidade da Califórnia em Los Angeles.

“Não faltarão pretextos o para atrair apoio contínuo e recrutas para a resistência”, disse ela. 

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