Análise - Incerteza global afeta economia brasileira


Análise - Incerteza global afeta economia brasileira

Este trabalho é da equipe de economistas do Bradesco. Foi enviado há pouco ao editor, que repassa tudo para conhecimento dos leitores. Leia:

O balanço de riscos para o cenário doméstico ficou mais simétrico no último mês devido ao aumento das incertezas no ambiente global. A depreciação cambial ocorrida no mês passado e a elevação dos preços do petróleo são um contraponto ao quadro observado nos últimos meses, em que a direção do cenário era de inequívoca desaceleração da inflação e queda dos juros. Ainda que haja fundamentos para uma apreciação do câmbio ao longo do ano, o aumento da volatilidade na moeda produz sinais ambíguos para esse quadro.
- Os principais indicadores de atividade têm indicado que o ritmo de recuperação tem sido gradual, como apontamos na revisão de cenário feita no mês passado. Adicionalmente, as surpresas baixistas com a inflação corrente continuaram ocorrendo nas últimas divulgações, o que, em conjunto com essa temperatura mais amena da atividade, segue indicando um cenário benigno para a inflação. Diante da ociosidade ainda existente na economia, é muito provável que a depreciação cambial e o eventual repasse da alta dos preços do petróleo não se transmitam de forma importante para a inflação. Mas é muito provável que o Banco Central pause o corte de juros após a próxima reunião para observar os efeitos. Sem o aumento da volatilidade da moeda, os sinais de inflação e atividade apontariam para a continuidade do corte de juros para além de 6,25%.
- Diante desses novos eventos, calibramos nossa expectativa para a taxa de câmbio para R$/US$ 3,35 no final deste ano, mas seguimos projetando uma alta do IPCA de 3,5% e Selic chegando a 6,25% em 2018.
Desafios do cenário global têm crescido, diante da escalada dos preços do petróleo e de sinais de desaceleração marginal da atividade econômica
- Apesar de os riscos advindos do posicionamento mais protecionista dos EUA e das ameaças de aumento de regulação e da tributação sobre o setor de tecnologia não terem tido novas escaladas ao longo de abril, as incertezas quanto aos impactos dessas medidas para a economia global permanecem. Adicionalmente, a recente alta dos preços do petróleo, refletindo o aumento da tensão geopolítica no Oriente Médio e a maior restrição potencial de oferta da commodity, pode se traduzir em aceleração adicional da inflação e consequente redução do consumo privado em alguns países desenvolvidos. Essa é uma preocupação particularmente importante em países mais avançados no ciclo econômico, especialmente nos EUA e, em menor intensidade, na Europa. Esse conjunto de fatores torna o cenário global mais desafiador, conforme temos alertado desde março. Com a intensificação dessas questões de meados de abril em diante, colocamos um viés de baixa para nossa estimativa de crescimento de 3,8% da economia mundial para 2018.
- Acreditamos que o posicionamento mais protecionista dos EUA, um possível aumento de regulação no setor de tecnologia e a recente escalada dos preços do petróleo resultarão em um cenário mais desafiador para a economia global. Cenário esse caracterizado por uma combinação de aumento na volatilidade e aversão ao risco dos mercados, com inflação mais alta acompanhada de uma possível redução no crescimento econômico. Diante disso, as taxas de juros dos títulos do governo dos EUA devem continuar pressionadas, o que tende a dificultar a atratividade dos fluxos para as economias emergentes, colocando novos desafios para essas economias nesse ambiente em transformação.
Tendo em vista o aumento das incertezas do cenário global, calibramos nossa expectativa para a taxa de câmbio
O balanço de riscos para o cenário doméstico ficou mais simétrico no último mês devido ao aumento das incertezas no ambiente global. A depreciação cambial ocorrida no mês passado e a elevação dos preços do petróleo são um contraponto ao quadro observado nos últimos meses em que a direção do cenário era de inequívoca desaceleração da inflação e queda dos juros. Ainda que haja fundamentos para uma apreciação do câmbio ao longo do ano, o aumento da volatilidade na moeda produz sinais ambíguos para esse quadro. Os principais indicadores de atividade têm indicado que o ritmo de recuperação tem sido gradual, como apontamos na revisão de cenário feita no mês passado. Adicionalmente, as surpresas baixistas com a inflação corrente continuaram ocorrendo nas últimas divulgações, o que, em conjunto com essa temperatura mais amena da atividade, segue indicando um cenário benigno para a inflação. Diante da ociosidade ainda existente na economia, é muito provável que a depreciação cambial e o eventual repasse da alta dos preços do petróleo não se transmitam de forma importante para a inflação, mas é muito provável que o Banco Central pause o corte de juros após a próxima reunião para observar os efeitos. Sem o aumento da volatilidade da moeda, os sinais de inflação e atividade apontariam para a continuidade do corte de juros para além de 6,25%. Diante desses novos eventos, calibramos nossa expectativa para a taxa de câmbio para R$/US$ 3,35 no final deste ano, mas seguimos projetando uma alta do IPCA de 3,5% e Selic chegando a 6,25% em 2018.
A mudança da nossa projeção para R$/US$ 3,35 ao final do ano responde tanto a fatores domésticos como externos. A alta de juros nos EUA e o aumento das barreiras protecionistas pioraram o ambiente para os emergentes. Do lado doméstico, o adiamento da agenda de ajuste fiscal e o menor crescimento fazem com que, diante dessa maior volatilidade global, o diferencial de juros do Brasil contra o mundo – no menor patamar histórico – passe a influenciar o Real, algo que não era habitual na economia brasileira. Essa depreciação não tem sido acompanhada de piora significativa do risco país ou dos preços dos demais ativos, o que sugere que o movimento, até os patamares atuais, deriva desses eventos de curto prazo e não de um aumento de incerteza com a economia. Aliás, o câmbio real no país não está distante de sua média histórica como evidenciado no gráfico abaixo, o que corrobora essa avaliação. À medida que o crescimento ganhar tração, especialmente com a agenda de ajuste fiscal sendo retomada, vislumbramos que o diferencial de juros perderá relevância para os fluxos de divisas e a queda do risco país seguirá. Adicionalmente, a robustez das contas externas – evidenciada no elevado nível de reservas internacionais, no baixo estoque de swaps cambiais e dívida externa do governo, no reduzido déficit em conta corrente e na significativa melhora da posição externa de muitas empresas – tende a limitar uma depreciação elevada enquanto houver expectativa de retomada da agenda fiscal e do crescimento.
Do lado da atividade, os dados correntes continuam mostrando uma recuperação gradual. O setor de serviços não tem exibido recuperação e vem se mantendo defasado em relação ao comércio e à indústria no ciclo econômico, que mostram algum crescimento. Por sua vez, os dados de emprego voltaram a mostrar contração em março, o que não era esperado para a atual fase do ciclo econômico, interrompendo a tendência de queda da taxa de desemprego. A indústria também recuou na passagem do primeiro para o segundo trimestre, com destaque para o desempenho fraco dos bens intermediários, apesar de se verificar maior dinamismo na produção de bens de capital e de bens de consumo. Entendemos que a recuperação econômica seguirá seu curso, especialmente diante do estímulo monetário atual – e há sinais claros no setor automotivo e imobiliário – mas existem dúvidas sobre a velocidade de retomada, que vem se mostrando menor do que a necessária para a concretização da nossa projeção de crescimento de 2,5%. De todo modo, as condições para o crescimento estão colocadas, especialmente quando levamos em conta a desalavancagem das famílias, os estoques mais ajustados e os efeitos defasados da política monetária e, por isso, mantemos nossa expectativa de aceleração da economia nos próximos meses.
Sustentando essa nossa leitura, os últimos dados do mercado de crédito destacaram-se pelo melhor desempenho de pessoa jurídica com recursos livres. Neste ano, passamos a observar crescimento mais generalizado das concessões para as empresas, antes concentrada em linhas menos arriscadas, e, agora, com expansão nas demais linhas, como capital de giro. Acreditamos em aceleração dos desembolsos às empresas, com recursos livres, de forma a gerar um crescimento de 4,2% dessa carteira em 2018. E, o mercado de capitais, de forma similar, segue em expansão. A carteira de crédito à pessoa física com recursos livres também segue avançando, em especial as linhas de consignado e aquisição de veículos, em linha com o forte aumento de vendas registrado nos últimos meses. De fato, em estágio mais avançado no processo de desalavancagem, o crédito às famílias vem apresentando crescimento robusto desde 2017 e deve continuar como destaque neste ano. Assim, a despeito do fraco desempenho da carteira com recursos direcionados, o estoque total de crédito deve avançar 4,5% em 2018, impulsionado pela alta de 5,7% da carteira de recursos livres total, que exibe maior correlação com a atividade econômica. A continuidade da tendência positiva do mercado de crédito, favorecida pela defasagem de política monetária de forma mais ampla, deverá balancear o risco de observarmos um crescimento novamente moderado no segundo trimestre.
Do lado da inflação, mantivemos nossa projeção de alta de 3,5% do IPCA para este ano, reconhecendo um equilíbrio no balanço de riscos do cenário. Nos últimos meses, os riscos associados ao cenário apontavam, quase todos, para uma inflação mais baixa. Porém, nas últimas semanas, a movimentação da taxa de câmbio e do preço do petróleo voltou a equilibrar esses riscos. Incorporando a nossa revisão do cenário de câmbio e o preço do barril do petróleo ao redor de US$ 70, poderíamos ter um impacto adicional de cerca de 0,50 p.p. na projeção do IPCA. Por outro lado, os dados correntes de inflação e a evolução gradual da atividade têm mantido a dinâmica benigna dos preços e a velocidade de descompressão segue surpreendendo para baixo e ocorrendo de forma disseminada. Tanto os núcleos – parcela bastante associada à evolução dos ciclos econômicos – quanto os preços de alimentos continuam em patamares historicamente reduzidos. Além disso, os últimos dados continuam mostrando uma dinâmica de salários bastante favorável, com ganhos contidos. Portanto, acreditamos que a gradual retomada da economia, com ainda elevada ociosidade, somada à inflação corrente baixa e à ausência de pressões salariais, deverá seguir atuando como limitadores de uma rápida aceleração dos preços e/ou repasse da depreciação da taxa de câmbio aos consumidores.
Os resultados fiscais, por sua vez, estão alinhados com o ritmo de recuperação da atividade, com elevação moderada da arrecadação. No ano, a arrecadação subiu 4% em termos reais, quando excluímos fatores não recorrentes, mostrando recuperação bem expressiva. Em março, contudo, a alta foi mais modesta, de 2,1%, em linha com o que esperamos de crescimento para as receitas no ano. Do lado das despesas, o governo tem feito um esforço de antecipar pagamentos de precatórios, o que inflou o montante dispendido nos resultados recentes. Em relação ao último mês, vale uma observação: a probabilidade de se atingir déficit menor diminuiu, frente à possibilidade de postergação do leilão de excedente da área de cessão onerosa para o ano que vem. De todo modo, o limite do teto nos parece bastante crível e é nossa hipótese de trabalho. Esperamos que o governo consiga cumprir a meta fiscal deste ano, com riscos balanceados: (i) de um lado, o crescimento esperado está um pouco aquém da projeção do governo, a privatização da Eletrobras e o leilão de excedente de petróleo parecem menos prováveis; (ii) de outro, os leilões já realizados apresentaram resultado bem acima do esperado e novas áreas podem ser colocadas em leilão ainda este ano.
Em suma, continuamos acreditando que nosso cenário base está alinhado com o plano de voo proposto pelo Banco Central, que deve levar a taxa Selic para 6,25% em maio e seguir nesse patamar até o final do ano. O fato novo no último mês é um equilíbrio maior do balanço de riscos para inflação quando comparamos com o mês passado. Havia certa assimetria para baixo que, se concretizada, contribuiria para juros ainda menores. Hoje, tendo em vista o ajuste da taxa de câmbio e as incertezas maiores no cenário externo, entendemos que a possibilidade de os juros caírem para abaixo de 6,25% cedeu razoavelmente. Isso, contudo, não invalida nossa visão de que segue elevada a probabilidade de manutenção de taxas de juros em patamares historicamente reduzidos ao longo dos próximos trimestres.
Desafios do cenário global têm crescido, diante da escalada dos preços do petróleo e de sinais de desaceleração marginal da atividade econômica
Apesar de os riscos advindos do posicionamento mais protecionista dos EUA e das ameaças de aumento de regulação e da tributação sobre o setor de tecnologia não terem tido novas escaladas ao longo de abril, as incertezas quanto aos impactos dessas medidas para a economia global permanecem. Adicionalmente, a recente alta dos preços do petróleo, refletindo o aumento da tensão geopolítica no Oriente Médio e a maior restrição potencial de oferta da commodity, pode se traduzir em aceleração adicional da inflação e consequente redução do consumo privado em alguns países desenvolvidos. Essa é uma preocupação particularmente importante em países mais avançados no ciclo econômico, especialmente nos EUA e, em menor intensidade, na Europa. Esse conjunto de fatores torna o cenário global mais desafiador, conforme temos alertado desde março. E, com a intensificação dessas questões de meados de abril em diante, colocamos viés de baixa para nossa estimativa de crescimento de 3,8% da economia mundial para 2018.
Reconhecemos que nas últimas semanas, a tensão comercial mostrou algum alívio, com a isenção concedida pelo governo norte-americano (ainda que temporária) a alguns países com relação às medidas comerciais restritivas e com discursos mais conciliadores de Donald Trump com relação à taxação das empresas de tecnologia. Entretanto, como podemos observar nos gráficos 1 e 2, o desempenho dos índices das empresas de tecnologia dos EUA e das maiores produtores de aço e alumínio ainda se mostra pior do que os respectivos índices locais.
Essa incerteza quanto à política externa e regulatória dos EUA já se refletiu em uma piora dos indicadores de confiança empresarial na Europa e nos EUA, em março e abril. Por mais que ainda não seja possível mensurar os impactos diretos desse aumento da incerteza nos dados de comércio e de atividade das economias, é muito provável que esse cenário reduza o ritmo de crescimento da economia global. Ademais, de forma geral, desde meados de abril, os resultados dos dados de atividade global têm surpreendido negativamente a mediana das expectativas dos analistas. O ritmo de expansão global ainda é bom, mas gradualmente acumulam-se evidências de que podemos entrar em um processo de desaceleração da atividade nos próximos meses.
Para reforçar esse cenário global mais desafiador e sujeito a maior volatilidade, as cotações de petróleo continuaram subindo em abril, superando US$ 70/barril (do tipo Brent). Suportando essa tendência altista, destacamos uma mudança de fundamentos, com oferta mais restrita dos países da OPEP por mais tempo, e um componente mais temporário, associado às tensões geopolíticas, o que sugere que não veremos uma reversão rápida desse movimento. Nossa expectativa para o preço de “equilíbrio” da commodity, após esses eventos, subiu do intervalo de US$ 60 a 65 para US$ 65 a US$ 70/barril.
A OPEP reforçou o compromisso em continuar limitando a oferta do grupo, buscando um patamar de estoques mundiais mais baixo do que anteriormente sinalizado. Além da sinalização, os dados efetivos da produção do grupo têm mostrado cumprimento do acordo, além dos limites estabelecidos. Assim, parece-nos que a OPEP está, neste momento, fazendo uma escolha por preços mais elevados – mesmo que isso signifique perda de uma parte do mercado (uma vez que preços mais atrativos voltam a incentivar o aumento da produção de petróleo nos EUA). De fato, as estimativas de produção norte-americana de petróleo continuam sendo revisadas para cima, com projeções de que a produção chegue muito próxima à da Arábia Saudita nos próximos anos (em torno de 12  milhões de barris/dia). No curto prazo, há restrições de infraestrutura para aumento expressivo da produção no país, mas com a maturação dos investimentos já realizados e com novos investimentos que devem ocorrer estimulados pelo aumento dos preços, essa limitação deve ser resolvida no médio prazo. Dessa maneira, entendemos que a limitação da oferta no curto prazo, em um ambiente em que a demanda mantém-se sustentada, deve sustentar um preço de equilíbrio mais alto nesse momento.
Soma-se a esse cenário a elevação do risco geopolítico observada nos últimos meses, quando comparado com os trimestres anteriores. No próximo dia 12, o presidente dos EUA deve decidir se assina ou não o termo de continuidade do acordo nuclear com o Irã. Caso não assine e restabeleça as sanções comerciais ao Irã, a oferta mundial de petróleo poderia diminuir mais um pouco (no limite, algo como 3% da produção total da OPEP). Mais do que essa diminuição de oferta, que não é irrelevante, o nível de risco geopolítico seguiria elevado no Oriente Médio, mantendo os preços em patamar superior ao sugerido exclusivamente pelos fundamentos.
Portanto, esse choque de preços não deve ser apenas temporário, tendo consequências aserem observadas nos índices de inflação dos próximos meses. Isso deve ser observado especialmente nas economias com reduzida ociosidade no mercado de trabalho, potencializando a transmissão dessa pressão dos preços de combustíveis para os demais preços.
Diante desse conjunto de condições mais ruidosas do ambiente global, acreditamos que o impacto sobre a economia norte-americana possa ser um dos mais relevantes, levando em conta o aumento da incerteza quanto à política comercial, o possível crescimento da regulação no setor de tecnologia e os efeitos cíclicos de uma alta do preço do petróleo. A alta dos preços dos combustíveis e o recuo dos preços das ações deverão levar simultaneamente a uma queda do poder de compra e da riqueza das famílias, com prováveis impactos negativos sobre o consumo doméstico nos próximos meses. Dessa forma, considerando esses efeitos somados, ajustamos nossa estimativa para o crescimento do PIB dos EUA de 2,6% para 2,5% para este ano, mesmo com um importante impulso fiscal em curso. Essa combinação de crescimento mais brando e elevação da inflação deve deixar as taxas de juros dos títulos do governo norte-americano mais pressionadas no restante do ano, o que reforça nossa percepção de que o FED deve fazer mais três altas de juros em 2018, sem alívios para os mercados de títulos e colocando desafios também para os preços de ativos reais e ações.
Os impactos desse cenário para o Reino Unido são bastante semelhantes, principalmente com relação aos efeitos do aumento da pressão dos preços. Os efeitos negativos sobre o crescimento doméstico, por outro lado, devem se materializar numa menor escala quando comparado aos EUA, uma vez que, até agora, o país não foi alvo das medidas tarifarias impostas pelos EUA. A despeito disso, o Banco Central do país terá que lidar com a combinação de alta dos preços de energia, mercado de trabalho aquecido e economia crescendo acima do potencial. Diante desse cenário, acreditamos que o BoE voltará a elevar a taxa básica de juros antes do final do ano.
Para a Área do Euro, permanece em aberto se os EUA irão ou não elevar as tarifas de importação dos produtos oriundos da região. De qualquer forma, já observamos alguns impactos dessa incerteza na queda da confiança dos empresários. Mantemos, por ora, nossa avaliação de que a região continuará em expansão robusta, porém colocamos um viés de baixa para nossa expectativa de crescimento de 2,2% para o ano, principalmente refletindo o menor apetite para investimentos dos empresários da região. A Europa é uma região com alto nível de comércio internacional e reflete bem este aumento da incerteza sobre o comércio global adiante.  Já o cenário para inflação, que apesar de permanecer longe da meta do Banco Central Europeu (BCE), tem mostrado aumento da pressão de salários e deve incorporar alguma pressão advinda dos preços dos combustíveis. Com isso, podemos observar uma correção das taxas de juros dos títulos dos países da região, que permanecem muito próximas de zero por conta da atuação do BCE.
Em paralelo, a economia chinesa segue crescendo em bom ritmo, ainda que acreditemos em moderação nos trimestres à frente. Recentemente, contudo, a frustração com alguns resultados econômicos e as sinalizações dadas pelo governo sugerem um alinhamento com o que descrevemos até agora para o cenário global. Houve redução do compulsório bancário, frustração com o resultado dos indicadores de março e ajuste na comunicação do governo, dando foco na demanda doméstica de curto prazo e reduzindo o peso da necessidade de desalavancagem da economia. Diante disso, aumentaram as preocupações do mercado de uma desaceleração mais pronunciada à frente.
Algumas considerações importantes minimizam essa possível reversão da visão corrente mais positiva da China. Esse corte do compulsório implicou uma injeção de liquidez que compensou o vencimento de outra linha de médio prazo direcionada ao mercado interbancário. Ou seja, o efeito líquido desse movimento é relativamente neutro em termos de estímulo para a atividade. De todo modo, se necessário, o governo pode sim lançar mão de uma política monetária e/ou creditícia mais frouxa (com o custo de não reduzir a alavancagem). Somado a isso, ainda que o potencial de redução das exportações – em decorrência dos conflitos atuais entre EUA e China – seja importante, há formas de compensar essa perda. A saber, o desempenho do setor imobiliário segue surpreendendo de forma positiva e os investimentos em infraestrutura podem acelerar, ao menos temporariamente. Dessa forma, ainda nos parece precipitado apostar em uma desaceleração mais intensa nos próximos meses.
Em suma, acreditamos que esse posicionamento mais protecionista dos EUA, um possível aumento de regulação no setor de tecnologia e a recente escalada dos preços do petróleo resultarão em um cenário mais desafiador para a economia global. Cenário esse caracterizado por uma combinação de aumento na volatilidade e aversão ao risco dos mercados, com inflação mais alta acompanhada de uma possível redução no crescimento econômico. Diante desse cenário, as taxas de juros dos títulos do governo dos EUA devem continuar pressionadas, o que tende a dificultar a atratividade dos fluxos para as economias emergentes, colocando novos desafios para estas economias neste ambiente em transformação.

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