Luz, mais luz

 Franciso Marshall, historiador, arqueólogo e professor da UFRGS, escreveu o artigo "Luz, mais luz !" que foi publicado na edição deste domingo do jornal Zero Hora, parafraseando a frase do moribundo Goethe e recheada de frases empoladas, recheadas de ranço esquerdopata e fedendo a bolor ex-iluminista, tudo para atacar as privatizações e defender o retorno das estatais.

Marshal está com saudade dos tempos (1998) em que um telefone fixo custava até US$ 5 mil e quando  somente 17 milhões deles operavam no Brasil, além de somente 4 milhões de celularees.

Com a privatização, não há mais brasileiro sem telefone celular (são 270 milhões de aparelhos para 210 milhões de habitantes). Os telefones fixos, inclusive orelhõeds (lembram dos orelhões ?) viraram matéria fóssil para o arqueólogo Francisco Marshall escrutinar e tudo avançou no Brasil.

 O conteúdo do artigo baseia-se na premissa falsa de que o fracasso da CEEE Equatorial e da RGE no RS, comprovam o fracasso da desestatização.

Não comprovam, mas apenas atestam que as agências reguladoras não fazem o serviço de casa.

CLIQUE AQUI para saber mais sobre um dos exemplos mais bem sucedidos da privatização, o dos serviços de telecomunicações.
CLIQUE AQUI para ler o artigo do arqueólogo que escreve para Zero Hora. Marshall, em 8 de outubro de 20022, escreveu artigo em Zero Hora, defendendo outra tese indefensável: "Lula não é ladrão" (CLIQUE AQUI para ler).

Artigo, J.R. Guzzo, Gazeta do Povo - Linchamento em câmera lenta

Em ditaduras que não têm vergonha de serem ditaduras, os deputados da oposição não são perseguidos pela polícia com batidas na porta de casa e do escritório às seis horas da manhã. A explicação mais simples é que em ditaduras legítimas não há deputados, nem oposição e nem Congresso — pode até haver no papel, mas aí todo mundo é obrigado a fazer o que o governo manda. Nas democracias falsificadas, que tentam agir como ditaduras, mas não querem funcionar como elas, há parlamentares de oposição, mas eles não têm os direitos mais elementares que teriam em qualquer regime em que se cumprem as leis. Há um caminhão de leis, mas não valem nada — quem manda é a junta de governo, e essa junta trata como marginais em liberdade vigiada os congressistas que querem exercer os seus mandatos. O resultado é esse Estado policial que é o Brasil.


Em seu último surto repressivo, o consórcio entre o Supremo Tribunal Federal e os partidos de “esquerda” que manda no Brasil de hoje saiu em perseguição aos deputados Carlos Jordy e Alexandre Ramagem — ambos marcados para morrer pela junta de governo. Não há nada de legal nesse linchamento em câmera lenta, mas e daí? A última coisa que interessa à delegacia policial em que se transformou o STF é o cumprimento da lei.


A última coisa que interessa à delegacia policial em que se transformou o STF é o cumprimento da lei

A Constituição diz que um parlamentar só pode ser preso se cometer um crime inafiançável – e em flagrante. O ex-deputado Daniel Silveira não cometeu nenhum crime inafiançável nem foi preso em flagrante, mas está na cadeia, com uma pena de nove anos nas costas. Se fizeram com ele, porque não fariam com Jordy e Ramagem?


O consórcio Lula-STF não pode cassar os 100 ou 150 mandatos que incomodam o governo e a “suprema corte”, como diz o presidente. O que faz, então, é perseguir, ameaçar e ferir deputados que estão no topo da sua lista negra, como Jordy e Ramagem. É a consequência inevitável da criação virtual de um Estado de exceção no Brasil, comandado pelo Judiciário, associado ao Executivo e aceito de cabeça baixa por um Legislativo cujos presidentes trocaram os direitos do Congresso pelas vantagens que recebem por serem cúmplices do consórcio.


Tanto faz o que os deputados fizeram ou deixaram de fazer, se há ou não há provas e outros detalhes do processo penal. O STF resolveu sair atrás dos dois, e a lei não vai atrapalhar em nada a perseguição. Há cinco anos o Brasil vive sob um inquérito absolutamente ilegal, criado pelos ministros para reprimir o que chamam de “atos antidemocráticos”. Enquanto essa aberração existir, a democracia no Brasil vai ser a impostura que está aí.






Artigo, Fernando Schuller, Veja - O divórcio das elites

James Bennet escreveu um texto inusitado, na revista The Economist, perto da virada do ano. Jornalista consagrado no The Atlantic, editor de opinião do The New York Times, seu ponto era dizer que o Times havia “perdido o rumo” na poeira da polarização política americana. O problema não era o viés “progressista” do jornal. O problema era o traço patológico que isso havia adquirido, em especial na era Trump. A partir daí, o jornal passou não apenas a favorecer ideias mais à esquerda, mas a bloquear sistematicamente as ideias conservadoras. Ele conta sobre a mesquinharia de não permitir sequer a publicação de “cartas ao leitor”, de eleitores de Trump, e a “indignação” com um perfil, ainda que crítico, de um ativista da “nova direita”. A gota de água foi quando Bennet publicou um artigo do senador republicano Tom Cotton defendendo uma ação mais enérgica nos protestos violentos que se seguiram à morte de George Floyd, em 2020. A visão de Bennet era: podia-se concordar ou não com o senador, mas sua visão era legítima. E expressava a opinião de boa parte do público americano. O ponto é que o jornal recuou. Foi apedrejado pela claque de ativistas e Bennet acabou no olho da rua.


O ponto essencial é a ideia defendida por Bennet sobre o papel do jornalismo. Dos onze colunistas do The Times, apenas dois eram “conservadores”, e ainda assim “moderados”. O jornal simplesmente “ignorava a opinião de 150 milhões de americanos”, escreveu ele, em uma nota. Se alguém efetivamente levasse a sério a ideia de “diversidade”, a primeira decisão seria trazer mais vozes à “direita’, no espectro político. Coisa que ninguém, no jornal, estava realmente disposto a fazer. As pessoas continuavam a falar em diversidade, mas agiam de um modo claramente unilateral. Outro ponto é a ideia de que era “perigoso” expor os leitores às ideias de Cotton ou dos apoiadores de Trump. A tese do leitor hipossuficiente. Na prática, a lógica group-thinking, o Times como um veículo, diz Bennet, “onde a elite progressista dos Estados Unidos fala consigo mesma sobre um Estados Unidos que não existe realmente”. Foi a mesma percepção de outra editora do Times, Bari Weiss. Sua carta de demissão correu o mundo. E foi bem mais direta. Disse que havia cansado do jornalismo “engajado”, que, em vez de “desafiar os leitores”, passou a “buscar cliques com o 4 000º artigo dizendo que Trump é o grande perigo para o mundo”.


As histórias de Bennet e Bari Weiss falam de um estranho divórcio que marca a nossa época. Observem os dados: 38% dos americanos se identificam como conservadores, em questões sociais; 29% se dizem “progressistas”. Nas questões econômicas, 44% são conservadores, contra 21% progressistas (dados do Gallup). Observem agora o que se passa com a imprensa. Pesquisa recente feita na Universidade Syracuse mostrou que a simpatia pelo Partido Democrata, entre jornalistas, é dez vezes maior do que pelo Partido Republicano. Para ser preciso: 36,4% para o lado dos democratas e apenas 3,4% para o lado republicano (eram 18%, no início dos anos 2000). De um modo geral, o que se passa com o The New York Times não é a exceção. No Brasil, pesquisa realizada na Universidade Federal de Santa Catarina, reportada em ótima matéria do Poder 360, mostrou que 80,7% dos jornalistas se posicionam à esquerda ou centro-esquerda, contra apenas 4% à direita, lato sensu.


Não é preciso fazer nenhum juízo de valor aqui. É um direito das pessoas pensarem isso ou aquilo. Ponto-final. A questão é observar o divórcio. A desconexão entre a média do pensamento, na sociedade, e o que se passa não apenas na chamada “mídia profissional”, mas nos meios de opinião, em geral. Dito isso, talvez Bennet e Bari Weiss sejam apenas dois irrealistas. Presos a uma ideia de jornalismo que de fato se perdeu, e não apenas no The New York Times. A ideia de uma mídia apresentando fatos com alguma objetividade, e um quadro de opinião diverso. Não focado em convencer ninguém disso ou daquilo, mas permitir que o público forme sua própria opinião. Essa foi uma tese clássica do jornalismo, no século XX, posta no conhecido relatório da Comissão Hutchins, logo após a Grande Guerra. Suas conclusões diziam que o compromisso do bom jornalismo era separar a notícia da opinião, dar espaço ao contraditório e tratar sem estereótipos os diferentes grupos da sociedade. Ainda há muita gente que tenta colocar em prática essa ideia. Mas o espírito do tempo é outro. O que antes era um problema para o jornalismo, isto é, seu afastamento da “objetividade dos fatos”, se tornou um estranho tipo de virtude


É evidente que seria desejável um The New York Times que não demitisse seu editor de opinião pela publicação de um artigo conservador. Ou emissoras com um equilíbrio de visões, refletindo simplesmente o que somos, como sociedades abertas. Mas é improvável. As guerras culturais da nossa época injetaram uma carga de sacralidade no universo da política. Se o que está em jogo é o “fascismo”, de um lado, e o “comunismo”, de outro (parece brincadeira, mas foi exatamente o que Bennet ouviu, e não precisamos ir longe…), não há mesmo muito o que ponderar. Se são as últimas e grandes narrativas que dão conta da realidade, então está tudo bem. Vamos à guerra permanente, e às favas com idiotices como o espírito de dúvida e de investigação. É evidente que há um problema de mercado, que demanda “opiniões fortes”. “Ou então perdemos para a internet, seus youtubers e tiktokers”, escuto de um editor veterano. O negócio seria aderir ao jogo. Ao Twitter como grande editor, na frase sarcástica de Bari Weiss.


O problema é que o viés crônico faz o jornalismo perder aquela que deveria ser sua grande virtude: a vocação socrática. A capacidade de fazer as perguntas inconvenientes, contrastar o pensamento hegemônico. Lembro quantas vezes li notícias sobre pessoas banidas ou mesmo presas, no Brasil recente, sem um mísero questionamento sobre o “crime” cometido. Ou a aceitação pura e simples da censura prévia, vedada por aqui. Bennet sugere que talvez falte “coragem” à mídia. Desconfio que não. O que parece faltar é o tipo de convicção. Do jornalismo que “começa com uma consciência de que não sabe nada, em vez da crença de que sabe de todas as respostas”, nas palavras do próprio Bennet. Saudável ceticismo que não funciona para quem apagou a ambiguidade, que realmente acha que descobriu o lado certo da verdade. E por aí encerrou o jogo.


Vamos lembrar que Sócrates foi condenado por ofender os deuses. E na Apologia definiu como sua talvez única virtude reconhecer que “nada sabia”. Há um espírito que se perdeu, aí, nesta época de certezas e dedos na cara. Corrigir o divórcio, neste sentido, não é a adesão a essa ou aquela corrente de opinião. Mas o reconhecimento simples de que somos uma sociedade plural e que há um valor nisso que não deveríamos perder.


Fernando Schüler é cientista político e professor do Insper