Vida longa ao cinema

Por Ricardo Difini Leite, diretor do GNC Cinemas e presidente da Federação Nacional das Empresas Exibidoras Cinematográficas
O cinema está cheio de vida e histórias para contar. Depois de alarmistas terem decretado seu enfraquecimento devido à ameaça provocada pelas novas plataformas de exibição, como o streaming, o Brasil alcançou 3.505 salas, superando a marca de 3.276, registrada em 1975, conforme o site Filme B. O anuário estatístico do cinema brasileiro, publicado pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), em 2018, aponta que dobrou a oferta de salas no Nordeste. E, no Norte, quase triplicou, com incremento de incríveis 181% desde 2009. Uma parte desse crescimento se deve ao fato de os exibidores terem chegado a regiões onde a telona não existia.
Em âmbito nacional, o público nos cinemas cresceu 7,8% em comparação a 2018 e atingiu 177 milhões de espectadores segundo dados do Brasil Filme Box Office. No recorte do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina – onde opera em seis cidades –, o GNC Cinemas superou a média e registrou 9,3%. Como quase 3 milhões de pessoas foram a uma das suas 52 salas, a rede manteve a liderança do market share no mercado dos dois Estados no ano passado, com 21,77% de participação. O segundo colocado do ranking fechou em 18,01% e o terceiro, em 17,23%.
Outro número da Ancine explica um dos porquês desse crescimento: a operação em shoppings, que recebem cerca de 90% das salas. O conceito multiplex dos espaços que até há algum tempo eram chamados de “centro de compras” está trazendo mais público para o cinema. Por causa do e-commerce, os shoppings tiveram que se transformar em centros de serviços, entretenimento e gastronomia. Um complexo de salas múltiplas (cada vez mais confortáveis, com tecnologia sofisticada de projeção e som) proporciona experiência para toda a família, apresentando um cardápio de filmes variado e sedutor (infantil, adolescente, adulto, romance).
Muitos têm restrições ao Oscar, mas a 92ª edição, neste domingo, continua concentrando as atenções. Não somente pelo glamour inerente à cerimônia em si, mas por ser uma espécie de “trending topics” do que as pessoas estão discutindo depois de sair da sala escura, um impressionante espelho de vivências pessoais e coletivas.

Derrotada, esquerda vê risco adicional à democracia

A síndrome de Levitsky

Gustavo Maultasch


Pelo teor das referências que se fazem a ele, até ontem eu achava que
Steven Levitsky era o nome de uma síndrome cognitiva descoberta por um
doutor Levitsky, e não o nome de um cientista político. A sintomatologia
da síndrome seria a seguinte: quando a esquerda vence, a democracia vai
bem; já quando ela perde... Aí a democracia padece, vai mal, está
morrendo.

Essa síndrome apresenta como comorbidade aquele comportamento já
conhecido em nossa esquerda: concorda comigo? Você é bom camarada e está
convidado para o próximo chope no Leblon; o bar dá desconto para quem
sinalizar virtude! Discorda de mim? Você é fascista.

(Mas veja bem, eu não digo que você é fascista porque estou defendendo o
meu esquerdismo não; o que é isso. Eu digo que você é fascista porque
sou um sereníssimo hermeneuta dos desígnios de nossa República e, de
posse dessa capacidade sobre-humana, afirmo categoricamente que você é
fascista; nada pessoal, é só um juízo técnico).

Como a esquerda brasileira passou anos elogiando Fidel, Che, Mao, Lenin,
Chávez, Maduro, Morales, dentre outros companheiros; como passou décadas
mitificando Paulo Freire, mesmo com sua tolerância a assassinatos em
nome da "biofilia" da revolução; como chegou a comprar votos do
Legislativo no escândalo do mensalão, em franco ataque à democracia; e
como a principal chapa da esquerda, nas últimas eleições, tinha como
candidato o autor de "Em defesa do socialismo" e como candidata a
vice uma comunista que se recusa a condenar os incomensuráveis
genocídios dos socialistas; enfim, por tudo isso, eu ingenuamente
acreditava que a esquerda brasileira tinha amor sincero e desinibido por
todas as ditaduras. Essa não é a galera descolada que fala em amor
livre? Então, pensei que eles amassem todos os autoritários.

Mas quão apressada a minha conclusão, e quão enganado eu estava; e
aproveito para fazer o mea cuba, ou melhor, o mea-culpa, e compartilhar
com vocês o que aprendi: na realidade, vejam só, a esquerda não ama
ditaduras; ela ama apenas, notem bem!, aquelas ditaduras que são de
esquerda. E não é aquele amor platônico, melancólico e distante não; é
aquele amor luxurioso, nos lençóis suados da paixão recente.


Quando descobri isso, meu mundo desabou feito o PIB da Dilma: seria
mesmo um caso de - constrange-me até dizer - hipocrisia, incoerência,
desfaçatez? Será que a esquerda tolera uma ditadura, tolera uma
torturazinha, desde que ela seja de esquerda? Se a ditadura é de
direita, condenamos; se é de esquerda, defendemos; isso finalmente eu
entendi. Mas e a democracia?

E aqui vem a novidade trazida pela síndrome de Levitsky, que segundo
minha pesquisa tem sido transmitida pelo mosquito da zika, ou talvez
seja mesmo o velho e conhecido, embora jamais extinto, mosquito da
trotsky. A novidade é que, agora, a esquerda não condena apenas a
ditadura de direita não; ela condena também, vejam só!, a democracia em
que o povo elege livremente a direita.

É bem verdade que democracias são como um preso em Curitiba: demandam
atenção e vigilância diárias. Democracias funcionais têm equilíbrio
institucional delicado mesmo, e a todo momento há riscos intrínsecos ao
sistema político; contem comigo para a diligência constante e a briga
por seu fortalecimento.

O problema é decretar risco adicional porque a esquerda perdeu, e com
isso começar a denunciar a nova conjuntura política como "morte da
democracia", como se o atual mal-estar do progressista fosse causado
por uma sensibilidade apurada de sommelier às vicissitudes da
democracia, e não por um mero ressentimento de derrotado, em humilhação
narcísica porque percebeu que o povo não o vê com a grandeza e o senso
de autoimportância que ele enxerga ao espelho.

E tudo isso fingindo não saber que um dos maiores riscos à democracia
brasileira é, precisamente, toda essa narrativa de "morte" da
democracia; mais do que diagnóstico, a síndrome de Levitsky é efeito
placebo, profecia autorrealizável, daqueles que preferem bagunçar o jogo
a aceitar que, simples e livremente, foram vencidos.

*Gustavo Maultasch

Diplomata, doutorando em administração pública e especialista do
Instituto Mises Brasil