Artigo, Milton Pires - Era uma vez uma universidade

Certa vez, em 1964, um jovem estudante, nomeado “presidente interventor” pelo Comando do Terceiro Exército dentro do Centro Acadêmico Sarmento Leite (CASL), na Faculdade de Medicina da UFRGS, em Porto Alegre, levou um grande susto quando entrou na sala daquela organização estudantil: um colega estava sentado numa cadeira com os dois pés em cima da mesa. Sobre ela se encontrava um revólver. “Isso aqui é para atender comunistas”, disse o sujeito ao presidente que havia entrado na sala.

Vinte cinco anos depois, em 1989, outro estudante daquela faculdade assistia uma aula de Bioquímica, numa fria tarde do outono gaúcho, quando o professor, interrompendo a matéria, trouxe várias garrafas de cerveja para os alunos que, depois de beberem, partiram (junto com o tal professor) para uma caminhada na Avenida Salgado Filho junto com um candidato à Presidência da República. O nome dele era Luís Inácio Lula da Silva.

Vocês querem saber como eu posso ter certeza de que estas duas histórias são verídicas? Porque o estudante de 1964 era o meu pai e o de 1989 era eu !

Na semana passada, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, segundo o Professor Benedito Tadeu Cézar, teve de “recuar” na sua ideia, que ele identifica como “fascista”, de repudiar à doutrinação ideológica na Universidade. Tal atitude veio acompanhada de uma espécie de compensação – os vereadores negaram-se, também, a “condenar” o ato da pediatra gaúcha que pediu para interromper o atendimento do filho de uma proeminente petista da cidade. Em outras palavras, um órgão do poder Legislativo, um órgão necessariamente político, negou-se astutamente a demonstrar em que “tom toca a banda” aqui na cidade, não é mesmo?
Iniciei o texto contando as histórias, minha e do meu pai, para mostrar o óbvio – nunca houve neutralidade dentro da UFRGS, a disputa foi sempre por aquilo que gente como o Profesor Benedito, o senhor Luís Fernando Veríssimo ou a DoutoraMárcia Tiburi gostam de chamar de “hegemonia” - vou aceitar o termo para não criar confusão, mas vou repetir aquilo que já escrevi faz muito tempo: a História de toda Universidade Ocidental inicia na Idade Média num mundo em que as pessoas entravam nelas sempre pensando a mesma coisa (como posso viver sem pecado e qual o caminho para salvação da minha alma) e saiam de lá com a capacidade (pelo menos alguma) de pensar diferente.

No mundo universitário encantado do professor Benedito, no mundo “sem machismo, sem luta pelo corpo da mulher” da Dra. Márcia Tiburi, as pessoas entram na UFRGS pensando coisas diferentes, mas saem de lá acreditando em algumas coisas em comum. Nós sabemos quais são. Não há necessidade de mencioná-las aqui, mas elas já estavam presentes como discussão na UFRGS do professor Ernani Maria Fiori, do assassino João Carlos Haas Sobrinho ou do químico comunista Otto Alcides Ohlweiler, não estavam???
As linhas que escrevi, e que apresento humildemente ao professor Benedito e à Dra.Márcia não são uma “resposta desaforada”..não são uma espécie de “vingança”

Outro dia, me dirigindo a um conhecido jornalista que tem um programa diário na Rádio Guaíba às 13 horas, eu disse com toda sinceridade e muita tristeza que só estamos tirando Dilma do Governo; não do Poder. O fato da Câmara tomar um decisão “morde e assopra”, combinando a “UFRGS com a decisão sobre pediatra”, já é uma vitória dos senhores...Toda “neutralidade”, todo relativismo de 68 vão continuar: os senhores venceram. Para ser sincero, já haviam vencido há muito tempo – a UFRGS acabou.

2 comentários:

  1. Todas as Universidades do Brasil, acabaram.

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  2. Aqui em SP, USP não e´diferente, conseguiram acabar com a Universidade modelo da AL e caindo muitas posições no ranking mundial das maiores Universidades do Mundo. Triste isso, lamentável acabar com o sonho acadêmico de muitos estudantes;.

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