Astor Wartchow - Réquiem para Fidel

Réquiem para Fidel

Astor Wartchow
Advogado

      Uma das passagens mais comovedoras da história mundial recente foi a derrubada da ditadura cubana de Fulgêncio Batista, em 1959, perpetrada por um grupo de idealistas, liderado pelo jovem advogado Fidel Castro.
      Fraudadas as expectativas de justiça e igualdade pelos tiranos comunistas europeus, o sonho do socialismo se renovava na pequena ilha, até então lugar de veraneio e exploração comercial norte-americana.
      Rapidamente, Fidel e Guevara se transformaram em ícones mundiais da juventude e das elites intelectuais, ainda traumatizados pelos efeitos das guerras recentes e a frustração soviética.
      Correu o tempo, quase 50 anos, e o mundo experimentou diversas mudanças sociais, políticas, econômicas e culturais.
      Entre estas mudanças, as mais significativas foram a desconstituição da União Soviética e a queda do Muro de Berlim. Definitivo sepultamento da idéia do partido único e do dirigismo estatal!
      Mas o tempo parara em Cuba. Perpetrara-se uma ditadura personalista e reacionária, a exemplo dos decadentes e decaídos modelos europeus, embora mantido o discurso da pretensão socializante.
      Descontado o regime e o estilo jurássico, ainda assim persistia, como persiste em alguns meios políticos e intelectuais, uma tolerância com Fidel.
      No entanto, a verdade é que faz muito tempo, mais de 20 anos, que as ilusões se perderam em meio às atrocidades e abusos cometidos em nome do regime político.
      Não faz muito tempo, haja vista a notícia do fuzilamento de três dissidentes e fugitivos do regime, Cuba e Fidel voltaram às manchetes, perdendo seus últimos simpatizantes.  Agora, essa semana, a morte do dissidente Orlando Zapata Tamayo.
      Mas, antes, a “pá de cal” do regime já havia sido jogada. Diante da notícia da enfermidade de Fidel, noticiou-se a transferência do poder ao seu irmão Raul Castro, seu sucessor natural. Quer dizer, “monárquico e dinástico”.
       Pobre povo cubano. Materialmente falta-lhe tudo, mas falta-lhe, ultimamente, a indignação e a rebeldia.
      Mas ainda assim não faltam a Fidel a tietagem e homenagens prestadas por seus súditos – entre os quais inúmeros brasileiros, particularmente o ex-presidente Lula, que insistem em permanecer algemados ao passado, encurralados por seus sonhos e idealizações juvenis, tiranizados por uma ilusão discursiva e uma prática cínica e cruel.
      Os discursos acerca da paz, da liberdade e da prosperidade, ideais humanos e universais, sempre patrocinaram e gestaram tiranos.
      Como bem ensina o poeta alemão Friedrich Hoelderlin (1770-1843), profeticamente: “o que sempre fez do Estado um verdadeiro inferno na terra foram precisamente as tentativas de transformá-lo num paraíso”!


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