O retrato de um desencanto
Foram as alianças heterogêneas e esdrúxulas, o principal
motor da desmoralização do PT, do fim do mito de que poderia ser um partido
diferente dos outros
Cacá Diegues, O Globo
Vi no jornal as fotos do senador Renan Calheiros e seu
filho Renanzinho, governador de Alagoas, cercando o ex-presidente Lula em sua
viagem ao Nordeste, em campanha para as eleições de 2018. Os três se abraçavam
e riam muito, o riso de felicidade dos vencedores ou daqueles que pretendem
vencer e não admitem outro fim da história.
Não sei o que isso significa em termos de aliança
eleitoral, se cada um deles precisa mesmo dos outros dois para melhor
desempenho nas urnas. Mas é difícil entender por que estão juntos, nos braços
uns dos outros, naqueles retratos. É como ver o homem da mala correr com ela
cheia pelas ruas noturnas da cidade, enquanto na televisão todos, de todos os
partidos (inclusive o da própria mala), saúdam a vitória da luta contra a
corrupção, anunciando seu apoio à Lava-Jato e ao Ministério Público.
É como se de dia proclamássemos a justiça e, na calada da
noite, seguíssemos cometendo os mesmos crimes de sempre. É isso o que fazem os
políticos que se abraçam naquelas fotos com aqueles sorrisos, diante do povo
que pretendem enganar. Porque só pode ser por engano.
O projeto político dos Calheiros nunca foi muito
diferente desse. Nele, enganar a população faz parte da natureza de sua
presença na política. Não tem outro jeito de se levar vantagem em tudo.
A experiência, no passado, desse tipo de aliança
heterogênea e esdrúxula já devia ter ensinado alguma coisa a Lula. Foram elas,
as alianças heterogêneas e esdrúxulas, o principal motor da desmoralização do Partido
dos Trabalhadores, do fim do mito de que o PT poderia ser um partido diferente
dos outros pela sua fidelidade a um programa, pelo seu rigor ético, pelo seu
real interesse pelo povo brasileiro. A governabilidade, ou a cooptação (podem
escolher a palavra e o conceito que prefiram), acabou com aquela ilusão.
Nessa crise econômica, política e ética que vivemos hoje,
uma das principais dores de todos foi o desencanto com Lula. Mesmo aqueles que
não eram seus eleitores sonhavam com seu papel de símbolo de um país que sempre
desejamos que o Brasil fosse. Lula era o cara, a última ilusão de nosso
sebastianismo popular transformada, na crise que tudo revela, em simples,
clássico e pedestre oportunismo populista.
Todo político tem o direito de escolher o que acha melhor
para o estado do mundo à sua volta. Mas Lula, sendo quem era e vindo de onde
veio, representou, no passado recente, nossos sonhos de um país que levasse em
consideração os brasileiros como ele. Não tinha o direito de nos decepcionar
tanto.
Nesse desencanto com Lula, talvez estejamos assistindo ao
fim do sonho idealista que cultivamos há tantas décadas, desde Getulio Vargas.
Talvez o desencanto com Lula esteja doendo desse jeito porque ele era uma
espécie de última esperança. A garantia de que, com ele, o Brasil seria o que
sempre sonhamos que fosse. A vida é assim mesmo; mas que dói, dói.
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