O antropólogo Roberto DaMatta afirma enxergar relação
entre o que acontece em altas esferas, como as de Brasília, e episódios mais
simples, como furtos de donativos e merenda de escola. Confira, a seguir,
trechos da entrevista.
Que interpretação é possível fazer sobre os três episódios
ocorridos no Estado?Estamos vivendo um momento de assombro. Na primeira página
do jornal, aparecem esses fatos degradantes, que são roubar escolas ou quem
está fazendo caridade, ao lado da fotografia dos ladrões que estão na Câmara
Federal. Fica complicado.
O senhor vê relação entre o que acontece nas altas
esferas, como o Congresso, e episódios mais simples, como os registrados no Rio
Grande do Sul?
Sem dúvida, porque elas estão no mesmo caldo cultural. É
uma ausência de direção. Estamos vivendo um estado de anomia. Esse estado de
anomia na política é óbvio. Estamos perdendo no Brasil o senso comum.
Como é que se dá a relação entre esses episódios de
diferentes esferas?
Quem vive em sociedade vive numa rede. Quando falamos em
moralidade, estamos falando de uma teia de relações. Se você mexer em um ponto
dessa rede, afeta a rede inteira. Veja que no Brasil, hoje, estamos com dois
presidentes da República. É brincadeira! O japonês da Polícia Federal é preso
como contrabandista. Dá vontade de se suicidar!
Fazendo um paralelo, no caso do roubo dos computadores da
escola parece haver o envolvimento de um policial.
Assistimos a uma desilusão com códigos importantes de
convivência humana, sobretudo quando se trata de instituições críticas para a
sociedade, como aconteceu em Porto Alegre. Você vai assaltar escola? Bandido,
pra mim, assalta banco, joalheria, mas não escola. Sinto uma ausência de
limites.
É razoável esperar que mesmo bandidos tenham algum
parâmetro ético e poupem escolas ou donativos para necessitados?
O que se espera é que aconteça alguma coisa com esses
bandidos. O que não pode acontecer é um mês depois esse mesmo bandido cometer
um crime igual, que é o que a gente vê no jornal.
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