Artigo, Luís Milman - A hegemonia confesssionalista ou o totalitarismo cultural


Artigo, Luís Milman - A hegemonia confesssionalista ou o totalitarismo cultural

Dos anos 60 para cá, a mentalidade confessional-esquerdista no Brasil só se faz consolidar. Essa mentalidade toma o pensamento de Marx, Lênin e Trotski como dogmático, infalível, sendo a especificidade destes autores e líderes atribuída ao tempo em que viveram e aos problemas com que tiveram de lidar, mas de modo algum compromete o cerne mesmo de perfectibilidade da obra de cada um e de todos conjuntamente.
Uma das consequências destacadas deste confessionalismo, ainda que indireta, é a formação de um quase-consenso na média cultura sobre a idiotia do pensamento de direita, seja ele conservador ou liberal. Na mesma medida em que vem se propagando pelos meios cultural e político, o confessionalismo esquerdista faz crer que as alternativas a ele são meramente reacionárias, ou - o que é pior- mesmo rotuladas de semifascistas; e, por isso, não devem sequer ser estudadas ou debatidas, pelo seu primitivismo.
A mentalidade confessional-esquerdista conseguiu injetar, desde o meio escolar até o meio culto, a noção segundo a qual estar ao lado da direita é defender posições autoritárias, torpes, desgraçadas, como a defesa da ditadura militar, a desigualdade social, a exploração dos pobres, a discriminação dos negros, a manutenção de posições de poder econômico e político, a homofobia e a destruiição do ambiente, para ficar nisso. Logo, não pode existir, nesta geografia mental degradada, um pensamento sofisticado e antagônico, sequer crítico, ao pensamento de esquerda. Reza a pregação que somente este deve ser discutido, estudado e praticado.
A difusão da linha justa da esquerda inicia-se nas escolas, por meio de professores de história e ciências sociais e se esparrama pela mídia tradicional, sendo raríssimos os casos em que se oferece, a estudantes universitários e leitores, informação básica sobre pensadores não-marxistas, todos eles taxados de irrelevantes, menores ou indecorosos.
O resultado deste fenômeno é a colonização das consciências por um raso esquematismo maniqueísta, controlado e apregoado por um vasto baixo claro marxista, que se identifica com o ativismo de um Sartre ou de um Foucault, e se distancia da postura menos apologética e mais metafísica de um Alexandre Kojéve, tendo sido os três, aliás, contemporâneos e franceses.
Essa apropriação confessional, a todo momento e de todas as formas, reproduzida nos meios de comunicação e na Universidade, ora como texto, mas sempre como subtexto de uma apreensão totalitária da política, da educação, da história, da arte e da moral. Você deve cultuar Marx, Lênin e Trotski, admirar Rosa de Luxemburgo, Luckás, Gramsci e Sartre. Foucault e Althusser são inexcedíveis. Adorno, Marcuse e Habermas, incontestavelmente profundos. Dworkin, imprescindível. Chomsky é inigualável, mesmo não sendo marxista, porque, afinal, é um prolífico charlatão anarquista anti-americano.

Ernesto Laclau é o mais novo intérprete da teoria marxiana aplicada à realidade latinoamericana, com seu conceito revolucionário de populismo, que o chavismo e kirchernerismo veneram na Venezuela e na Argentina. Até mesmo Tarso Genro, Frei Beto e Leonardo Boff são considerados intelectuais de referência para os esquerdistas brasileiros, muitos dos quais também atuantes na mídia, porque produziram e ainda produzem textos em que o dogma, ainda que numa versão juvenilizada, é reatualizado para nossas condições políticas objetivas.
E quanto ao outro campo? Faz-se tábula rasa, no melhor dos casos e, na mais das vezes, descarrega-se um bombardeio de insultos destinado a inviabilizar qualquer aproximação dos textos inimigos. Na camada militante culta deste confessionalismo, simplesmente prega-se que não há nada de inteligente que possa ser discutido com a direita e, por isso, seus pensadores sequer são mencionados. Ou quem discute, no ambiente universitário brasileiro, Leo Strauss, Isaiah Berlin, Eric Voegelin, Leszek Kolakowski, Raimond Aron, Roger Scruton, Fernand Broudel, Paul Johnson, Russell Kirk ou Jean-Fraçois Revel, para ficar apenas em alguns nomes contemporâneos do pensamento liberal, conservador, ou, se se preferir, de direita?
Olavo de Carvalho, por exemplo, sintetiza, para a militância esquerdista, todas as anti-virtudes do direitista: grosso, desbocado, histriônico e paranóide. Olavo pode mesmo possuir alguns traços heterodoxos para quem imagina um filósofo como sendo uma pessoa circunspecta e avessa à exposição. Ele, como sabemos, compra brigas e muitas, Mas sua extroversão - e mesmo uma ou outra postura exótica- são traços de temperamento que em nada comprometem o fato de ele representa o que há de melhor no que restou da alta cultura brasileira. Para um esquerdista, é, no mínimo, desconcertante, talvez psicologicamente devastador, aceitar um debate aberto, franco e honesto com Olavo de Carvalho. Por isso, é mais simples demonizá-lo, excluí-lo da arena intelectual. Olavo, no entanto, não se deixou intimidar. Decidiu confrontar o confessionalismo em todas as suas ramificações; e obteve êxito, ao longo dos anos, em estabelecer, no Brasil, uma trincheira de combate ao pensamento pedestre que o esquerdismo tem propalado pelo país. Contudo, ele, como os pensadores que citei acima, também é confrontado com a objeção in limine de um subconsciente coletivo abduzido por décadas de militância confessional-esquerdista, contra o qual somente agora começa a se esboçar uma resistência, cujo resultado pode, espero, evitar a total imbecilização do país.

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