Os procuradores do Ministério Público Federal na Operação
Lava Jato têm um problema: eles “se acham”. Tomados de vocação messiânica,
estão convencidos de que vieram ao mundo para redimir o Brasil do mal e da
corrupção. Para tanto se consideram revestidos de uma superioridade moral que
os distingue dos comuns mortais. Um pouco de modéstia e humildade não lhes
faria mal.
Assim, diante da crítica mais trivial, reagem de forma
autoritária, atacam de volta e sempre com o mesmo argumento: querem acabar com
a Lava Jato. É como se fossem profetas da verdade, como se nunca cometessem
erros. Seria bom se fosse verdade.
Sempre fui a favor de que as delações premiadas deveriam
fluir abertas. Decerto não estou entre aqueles que botam a mão no fogo pelos
políticos citados. Podemos ficar indignados no limite com a bandalheira geral.
Mas convenhamos, de que forma alguém pode se defender de acusações contra si se
não as conhecem? Isso é coisa de ditaduras, de estados totalitários.
O sigilo se tornou um instrumento de poder, de acusar de
nada e de tudo, de delitos graves e infrações leves, de crimes eleitorais e de
enriquecimento ilícito, tudo no mesmo balaio e ao mesmo tempo. Só a Polícia
Federal, o Ministério Público (este, mais do que todos) e os juízes tinham
acesso ao conteúdo dos depoimentos. Durante meses as delações vazaram ao
critério e gosto exclusivo dessas autoridades.
Com o fim do sigilo das delações, decidido pelo ministro
Fachin, do STF, tudo vai ficando mais claro. O delator Mário Amaro da Silveira,
ex-diretor da Odebrecht, revelou uma doação de R$ 500 mil reais em favor da
senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) mas se queixa: “Ela foi eleita e não fez nada
por nós”. Pedro Novis, outro delator da mesma Odebrecht reclama de José Serra
(PSDB-SP): “Serra nunca nos ajudou”. Benedicto Júnior, da mesma empreiteira,
sobre Eduardo Paes (PMDB-RJ): “ele nunca nos deu nenhum benefício”. Apesar da
insistência do procurador que o interrogou, o mesmo Benedicto Júnior negou três
vezes que a doação ao governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) estivesse ligada a
contrapartida.
O que ficou claro nas delações dadas a conhecer é que nem
tudo é propina. A força tarefa da Lava Jato parte do pressuposto de que todas
as doações são ilegais. Porém se elas não são condicionadas a alguma vantagem
ao doador, ou não há delito ou o delito é menor. Se não há benefício ao doador,
então é porque o político citado não contribuiu para o sobrepreço de obras, a
concessão de favores fiscais ou desonerações, o contrabando de emendas em
medidas provisórias e que tais.
É verdade: as empresas doadoras sempre esperam algo em
troca. Como diz um delator, esperam “fluidez”. Bem, doar dinheiro de campanha
era legal. E esperar fluidez e boa vontade do governo não chega a ser crime.
Empresas que têm negócios com o Estado sabem o estrago que um governo pode
causar quando está de mau humor.
O fim do sigilo revela que não é tudo igual, que há graus
diferentes de peso, medida e gravidade nas delações, permitindo-nos uma noção
mais nítida e uma avaliação mais justa dos delitos e dos personagens
envolvidos.
titoguarniere@terra.com.br
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