PRISCILA CRUZ
Uma grande oportunidade para a educação
O Brasil é o décimo país mais desigual do mundo. Para
reverter tal quadro, há consenso nas pesquisas sobre o papel determinante da
oferta de educação básica com qualidade e equidade.
Todavia, nosso sistema educacional opera no sentido
inverso. Há menor investimento nas escolas que atendem à parcela mais pobre da
população, quando deveríamos fazer justamente o oposto, dado o impacto do nível
socioeconômico no desempenho dos alunos. O resultado não poderia ser outro: a
desigualdade educacional amplia-se ao longo dos anos escolares.
O Fundeb —principal mecanismo de financiamento da
educação básica pública— tem sido importante instrumento para equilibrar o
valor investido por aluno dentro de cada Estado. Dados do Estudo Técnico nº
24/2017 da Câmara dos Deputados mostram que, sem o Fundeb, haveria uma
discrepância de mais de 10.000% entre o maior e o menor valor investido por
aluno nos municípios.
Com as atuais regras, essa diferença reduz-se para 564%.
Foi um grande avanço, mas é preciso fazer mais, tanto em redistribuição quanto
em efetividade.
Como a lei que estabelece o Fundeb tem vigência até 2020,
a Câmara está felizmente debatendo uma proposta de emenda à Constituição que
torna esse instrumento permanente, além de mirar mais adiante ao reconhecer que
é no âmbito dessa discussão que se abre uma oportunidade para melhorarmos o
Fundeb como política de enfrentamento das desigualdades educacionais.
Nesse contexto, o Todos Pela Educação juntou-se a
especialistas de diferentes campos de atuação para propor caminhos de maior
indução em qualidade com equidade.
Um primeiro passo é fazer com que a distribuição de
recursos dentro de cada Estado considere indicadores fiscais e/ou
socioeconômicos de cada município, e não apenas seus atuais fatores de
ponderação. A ideia é dar mais recursos para quem tem menos condições de
financiamento —e, portanto, mais desafios de contexto.
Uma segunda proposta refere-se à regra para
complementação de recursos ao Fundeb feita pela União: é possível torná-la mais
eficiente ao destinar recursos diretamente para redes de ensino mais
vulneráveis e com menores valores totais investidos por aluno, ao contrário do
desenho atual em que um município pobre de um Estado rico não recebe tais
recursos adicionais.
Um terceiro ponto, ainda sobre a complementação da União,
está centrado no aumento progressivo dessa participação, atualmente em 10% do
valor total arrecadado nos fundos estaduais, de modo a elevar o patamar mínimo
de investimento. Porém, ainda que entendamos ser esse o norte, é fundamental avançarmos
nesse debate de forma responsável.
Todos nós queremos mais para a educação, mas não sem uma
pactuação que direcione cada real investido para a garantia da qualidade do
ensino.
Sem essa arquitetura normativa bem amadurecida, corremos
o risco de manter a sequência de aumentos nos investimentos sem o
correspondente e proporcional aumento nos resultados. Assim, é importante
ressaltar que a PEC terá valoroso papel se, para além da perenização do Fundeb,
apontar no sentido de maior redistribuição.
No entanto, houve pouca discussão e ainda há muito a ser
estudado, simulado e analisado para a definição do desenho desse novo Fundeb.
Caso contrário, a PEC encerrará um debate ainda
embrionário e poderá levar à perda de uma chance que a nação não deve desperdiçar.
PRISCILA CRUZ, 42, é mestre em administração pública pela
Harvard Kennedy School e fundadora e presidente-executiva do movimento Todos
Pela Educação
Subscrevem este artigo:
BINHO MARQUES (ex-governador do Acre, secretário de
articulação do MEC);
CARLOS RAGAZZO (professor da FGV Direito-Rio,
especialista em regulação e controle social);
MARIZA ABREU (consultora legislativa da Câmara dos
Deputados e secretária estadual de Educação do Rio Grande do Sul);
NAÉRCIO MENEZES FILHO (professor do Insper e da
Universidade de São Paulo, economista especialista em políticas públicas);
URSULA PERES (professora da USP e especialista em
gestão de políticas públicas e finanças públicas)
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