De rabo preso com Maduro
Gente que dorme e acorda na porta dos mercados para
comprar comida que acaba antes de a fila andar. Falta de remédios, ataduras e
até de soro fisiológico. Famílias que vasculham lixos e assam animais de
estimação para servir no jantar. Mais de uma centena de mortos pela repressão
em manifestações contra o governo. Essa é a Venezuela, cujo regime e seu
ditador, Nicolás Maduro, receberam apoio incondicional do PT e PCdoB, e parcial
do PDT, signatários da resolução final da 23ª reunião do Foro São Paulo, realizada
na Nicarágua.
A solidariedade ao regime totalitário de Maduro, expressa
em viva voz pela presidente do PT, senadora Gleisi Hoffman, há uma semana, na
abertura do Foro, causa repulsa diante da tragédia humanitária do país vizinho.
Tão grave que não comporta qualquer tipo de defesa ideológica.
E, ao que tudo indica, ideologia está longe de ser de
fato a inspiração para as falas.
Os discursos petistas sempre deram trela ao faz de conta
que o ex-presidente venezuelano morto, Hugo Chávez, chamou de socialismo do
século 21. Mas, no ver e crer, as identidades do PT com essa turma se
consolidaram em outras searas.
Chávez, o gênio que conseguiu parir um golpe sobre si
para se tornar presidente, obteve do Brasil do ex Lula tudo e muito mais do que
podia esperar. Traduzindo em miúdos, usufruiu de trocas maravilhosas, favores
envolvendo fortunas – US$ 98 milhões só na conta de corrupção da Odebrecht,
declarados pela empreiteira em oitiva à promotoria dos Estados Unidos.
Muitas transações ainda carecem de explicações, se é que
elas existem.
Em um país povoado por denúncias cotidianas, poucos se
lembram da festa patrocinada por Lula e Chávez para lançar a pedra fundamental
da construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que teria 60% dos US$
2,4 bilhões orçados para a sua construção custeados pela PDVSA, estatal
petrolífera venezuelana.
Isso foi em 2005. Dois anos depois, Chávez se apropriou
dos ativos da Petrobrás na Venezuela e, mesmo sem ter colocado um único
centavo, reclamava do atraso das obras pernambucanas. Em 2013, Dilma Rousseff
anistiou as dívidas da Venezuela com a obra, que, nesta altura, já custava
cinco vezes mais: US$ 13,4 bilhões.
Uma aventura de comunhão bolivariana com custos e
prejuízos fenomenais para o Brasil, que jamais serão pagos. Ainda inconclusa, a
refinaria já consumiu US$ 18 bilhões dos brasileiros e produz menos da metade
da previsão inicial de 230 mil barris de petróleo/dia.
Chávez morreu em março de 2013, sem ver as consequências
desastrosas da gastança populista que promoveu nos anos em que o petróleo batia
recordes de preço no mercado mundial.
Assim como Lula e depois Dilma, ele se regozijava de ter
eliminado a miséria. Em 2011, a Comissão Econômica para a América Latina e
Caribe (Cepal) chegou a divulgar que o chavismo reduzira 50% da pobreza do
país. Cinco anos depois, o percentual de pessoas vivendo abaixo da linha da
pobreza atingiu 81%, embora os dados manipulados pelo regime apontem 18,3% de
redução da miséria em 2016.
Além da mentira quase infantil das estatísticas oficiais,
facilmente desmanteladas pelo cotidiano -- um salário mínimo venezuelano consegue
comprar comida para apenas três dias, isso quando encontra produtos à venda --,
a ditadura Maduro luta contra muitas outras frentes. E a pior delas não é a
oposição formal, a qual ele tenta derrotar a tiros, literalmente, e com a
convocação surreal de uma Constituinte, cujo objetivo é mantê-lo no poder.
Está tendo de enfrentar as vítimas do populismo
subsidiado pela ignorância e custeado pelo petróleo, sem ter fartura e muito
menos inteligência para fazê-lo.
Abusa da repressão, das milícias armadas, promove a
matança, estimula uma guerra civil. Ainda assim tem apoio da esquerda
brasileira, irrestrito quando se trata do PT.
Talvez porque os rabos do presidente venezuelano e do PT
estejam enrolados em uma trama de difícil equação para ambos.
Maduro foi apontado por Mônica Moura, mulher de João
Santana, marqueteiro de Lula e de sua pupila, como pagador de pacotes de
dinheiro ilícito, em espécie, para remunerar o trabalho da dupla durante a
campanha vitoriosa da Dilma de Chávez. Tudo com conhecimento e aval do governo
petista.
O PT de Lula -- que gravou vídeo em favor de Maduro na
disputa de 2013, que se arvorou a falar em nome do “povo brasileiro” ao
defendê-lo, em abril, quando a chancelaria nacional propôs a suspensão da
Venezuela do Mercosul, e que agora se solidariza e apoia a realização da
Constituinte pró-Maduro --, é cúmplice e parceiro da ditadura venezuelana.
De um lado, usa a crença bolivariana para alimentar a fé
cega dos seus. De outro, busca evitar a derrota fatal de um companheiro -- não
de armas, mas de “malfeitos”--, que pode lançar ainda mais lama nos 13 anos de
governos petistas. Não importa quantos mais Maduro mande prender ou matar.