Uma mulher é morta a cada 9 horas no Brasil durante a pandemia: SP e MG lideram

 O Instituto AzMina em parceria com outras seis mídias independentes lançou nesta quinta-feira(8), um levantamento chamado "Um vírus e duas guerras" , para mostrar os efeitos que a pandemia e consequentemente o isolamento social tiveram na questão da violência doméstica .

Foram analisados dados de 19 estados e do Distrito Federal (7 estados não responderam aos pedidos de informação), que representam 94% da população feminina no Brasil. Ao todo, foram 497 feminicídios registrados de março a agosto.

São Paulo, com 79 mortes, Minas Gerais, 64, e Bahia, com 49, foram os estados com os maiores números de assasinatos no país. Foi registrada  queda de 6% nas mortes em comparação ao mesmo período de 2019.

Apesar da queda, Helena Bertho , diretora do Instituto AzMina pondera e faz um alerta:

“Isoladas dentro de suas casas, as mulheres continuam ou estão ainda mais expostas à violência. Apesar dos dados oficiais indicarem queda no número de casos, muitos especialistas alertam para a subnotificação, que, estima-se, seja ainda maior em meio à pandemia, pela dificuldade de comunicação. Além disto, em alguns casos é difícil obter os dados de órgãos oficiais”.

Das 20 unidades federativas analisadas, 12 tiveram redução nos casos, sendo o Distrito Federal a ter maior queda percentual, de 56%. O Rio Grande do Sul foi o estado que teve a maior queda em números abolutos, registrando 18 mortes a menos em relação ao ano passado.

No outro lado, o Pará foi o estado com maior aumento, tendo 15 feminicídios registrados a mais em comparação com 2019. Outro estado em alerta é o Mato Grosso , lugar onde proporcionalmente mais mulheres foram mortas desde o início da pandemia, em março, com uma taxa de 1,72 por 100 mil mulheres, muito acima da média nacional, de 0,56.

O Instituto e seus parceiros continuarão com a coleta de dados até o final do ano para fazerem mais levantamentos sobre os crimes que vem sendo cometidos, sendo essa uma forma de combater os crimes de ódio contra mulheres.

“A ideia do monitoramento da violência contra a mulher surgiu em uma conversa que tive, em março, com a Paula Guimarães, do site As Catarinas. Estávamos buscando formas de trabalhar em parceria colaborativa, cada uma dentro de casa por causa da pandemia e utilizando a tecnologia digital. A situação é bem grave. Então sugeri fazermos um monitorando convidando mídias independentes das cinco regiões do país; assim nasceu a série Um vírus e duas guerras”, conta Kátia Brasil , fundadora do site Amazônia Real.

Artigo, Renato Sant'Ana - A cidade à mercê das vontades

Um idoso de 72 anos queixou-se ao vizinho cujo filho (de 16 anos) estava, como de hábito, chutando uma bola contra o portão de sua casa. Foi o suficiente para que filho, pai e mãe se juntassem a espancar o ancião.


O crime ocorreu na vila São Judas Tadeu, periferia de Porto Alegre. E nada tem de raro: é o tipo de coisa que acontece todo dia.


A violência é um "novo normal" que se impôs à capital gaúcha há mais de três décadas (e será diferente noutras capitais?).


Como chegamos a isso? Qual é a causa?


São múltiplas as causas, é óbvio. E qualquer simplificação, como fazem políticos populistas, só serve para mascarar o problema.


Mas há um fator básico, de per si, aliás, muito complexo: a crença na impunidade. Agressores não temem a lei, desdenham da polícia e agem na presunção de que não vão ter de arcar com as consequências de seus atos.


E o que é que suscita a crença na impunidade e o descrédito da lei?


Eis apenas alguns fatores causais: o movimento antipolícia, a farsa dos direitos humanos e seu discurso que credencia bandidos como "vítimas sociais", universidades que doutrinam mais do que ensinam e seus ex-alunos a ocuparem órgãos públicos que lidam com a violência.


Acaba que o Estado não cumpre a sua primeira e mais importante tarefa, que é coibir abusos e eliminar a lei do mais forte.


E quem fica mais desassistido, quem sofre mais senão os pobres? Sim, são eles, em cujo nome os demagogos e as demagogas populistas engendraram o caos social desta cidade. São os pobres os que mais padecem.


Mas a patifaria militante, jogando com as crenças do eleitor para ganhar adesão, vai negar a complexidade e falar que a causa é a pobreza.


Só que a pobreza não gera violência: a pobreza gera vulnerabilidade. E é a vulnerabilidade que, na omissão do Estado, desperta o comportamento abusivo (ou violento) que está latente em todos nós.


Tem mais. Ao contrário do discurso sociodesintegrador "desses e dessas" populistas, a conduta abusiva não tem a ver com ideologia, sexo, idade, cor da pele, religião nem com nacionalidade: a tendência ao abuso existe dentro de cada um, podendo estar neutralizada ou não.


Agora, como neutralizar as tendências violentas, fomentar o processo civilizatório e pacificar a sociedade, promovendo bem-estar social?


É a qualidade das instituições que determina se uma sociedade vai viver bem ou mal, em paz ou conflagrada, em equilíbrio ou em sofrimento.


Imaginemos: polícia eficaz (que respeita e é respeitada), Judiciário devotado ao "império da lei", escola de qualidade (que ensina em vez de conscientizar), educação da família vista como legítima para transmitir "valores". Como seria a cidade com essas instituições consolidadas?


E estará claro que tudo depende da vontade e da atitude de todos ou (vá lá!) da maioria? A cidade somos todos nós!


Veremos nas eleições municipais. Grande ou pequena, será uma chance de se influir no rumo da cidade, escolhendo entre votar num discurso sedutor e ilusório ou apoiar um candidato mais propenso a afirmar aqueles valores que levam ao equilíbrio social. Sejamos responsáveis!


Se a cidade somos todos nós e se cada um tem a microinfluência do voto, então quem vota negligentemente com os sentimentos, não com a razão, é sim, ao menos um pouco, responsável pela violência que infelicita a cidade - inclui-se, aí, o espancamento de idosos.


 


Renato Sant'Ana é Advogado e Psicólogo.


E-mail sentinela.rs@uol.com.br