Rubens Ometto, dono da Cosan, perdeu a paciência. Em evento neste sábado, ele reclamou em alto e bom som de algo que o empresariado vive comentando em conversas reservadas: o apetite do governo Lula por tributos e a aliança do Executivo com o Judiciário contra o Legislativo para arrecadar mais.
"Quando esse arcabouço fiscal foi lançado, eu não acreditei nele", disse Ometto. "É claro que o governo trabalharia furiosamente para aumentar a receita e assim gastar mais. Esse arcabouço reflete a visão de alguém que quer fazer o governo gastar e não reduzir a dívida pública, que é o que mantém esse juro alto", completou, arrancando aplausos da plateia.
Dividindo o palco com várias autoridades, incluindo o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, potencial candidato à Presidência em 2026 pelo campo bolsonarista, Ometto prosseguiu:
- "O Executivo faz embargos auriculares, falando que se não decidir assim o país tá quebrado. O Judiciário se deixa influenciar por isso e começa a autuar as empresas. E daí invade a área do Legislativo, que começa a atuar contra os dois".
"Quando se fala dos juros altos, tem uma questão importante que pouca gente fala que é a nossa insegurança jurídica, que também encarece os juros no Brasil. O custo de todas essas incertezas estão ali na taxa de juros. Se o governo organizasse tudo isso e controlasse a questão fiscal, os juros cairiam pelo motivo certo e esse país voltaria a crescer. Como vimos, aliás, no governo Lula 1".
Mas o que está por trás da irritação de Ometto, um dos empresários mais próximos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva?
Os dois já haviam se desentendido recentemente, quando Lula tentou emplacar o ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, na Vale, hoje uma mineradora privada, da qual a Cosan, de Ometto, é sócia. Mas a relação azedou de vez com a "MP do fim do mundo",
Nesta última semana, o setor exportador e, particularmente o agronegócio, ficou revoltado com a medida provisória do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que acabou com a compensação cruzada de créditos de PIS/Cofins com tributos federais. O assunto parece muito técnico, mas foi uma briga de décadas desde a criação da Lei Kandir e significa um prejuízo de pelo menos R$ 30 bilhões.
Tentando fechar a planilha e irritado com a conta da desoneração dos municípios que o Congresso o fez engolir durante um ano eleitoral, Haddad comprou uma briga pesada demais. E se o chamado PIB já vinha perdendo a paciência com Lula e migrando para a oposição, as falas de Ometto mostram que o caldo pode ter entornado de vez.
A resposta indireta a Ometto ficou para o presidente do BNDES, Aloísio Mercadante. Em outro painel no encerramento do mesmo evento. Mercadante reclamou do setor privado.
Mercadante disse que o Brasil está "num momento extremamente favorável" e que "de repente chegou uma medida provisória, mas quem conhece o Haddad sabe que ele é democrático".
Num tom ufanista, prosseguiu afirmando que "é preciso parar de falar mal do Brasil", afinal "os caras (estrangeiros) chegam aqui e não querem mais ir embora". Para o presidente do BNDES, "a mudança na geopolítica global exige uma parceria entre Estado e setor privado e é um equívoco achar que o Estado mínimo vai resolver".
Interrompido pelo jornalista William Waack, que mediava o evento, porque já estourava o seu tempo, Mercadante pediu uma última fala e soltou: "tem muita gente que diz para a gente descer do palanque, mas tem empresário que precisa descer do palanque".
É bem verdade que o empresariado nunca morreu de amores por Lula, pelo contrário, mas, num país com carga tributária de 32,4% do PIB, um governo que quer fechar suas contas sem cortar gastos não vai conseguir um pacto apenas contando com dinheiro do bolso alheio.