- O autor é advogado especialista em direito tributário e mestrando
em direito público na UFRGS
Recentemente,
a Frente Parlamentar do Agronegócio, na pessoa dos seus deputados, Nilson
Leitão (PSDB-MT) e Tereza Cristina (Sem partido-MS), aprovou um projeto de lei
que não somente instituiu a contribuição do Funrural - que recém havia sido
enterrado pela Resolução nº 15/2017 do Senado Federal -, como incluiu no mesmo
projeto o aval para a Fazenda Pública, na mera inscrição de dívida ativa de um
devedor que, após notificado da existência de débito se manteve inadimplente,
ter a faculdade de efetuar gravames e penhoras de bens extrajudicialmente. Isso
é, sem mais a necessidade de ajuizamento de execução fiscal, o Fisco ganhou
poderes para tornar indisponíveis os bens de um devedor sem mais a garantia de
segurança jurídica do Judiciário.
A Lei nº
13.606/18, ao arrepio dos princípios do não confisco e do devido processo
legal, autorizou no art. 25 a possibilidade de após inscrita a dívida ativa e
sua posterior comunicação para pagamento imediato, averbar, inclusive por meio
eletrônico, a certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e
direitos sujeitos a arresto ou penhora, tornando-os indisponíveis. Significa
dizer que, tendo o contribuinte sido notificado da dívida, sem qualquer
possibilidade do contraditório e da ampla defesa dispostos no trâmite
processual, este terá seus bens bloqueados e indisponíveis enquanto perdurar a
inadimplência.
A medida é
frontalmente inconstitucional, ao passo que o ordenamento constitucional
brasileiro optou claramente pelo devido processo legal para constrição de bens
de devedor, forte este no inciso LIV do art. 5º da Carta Magna: “ninguém será
privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
Com efeito,
essa faculdade extrajudicial inegavelmente é uma realidade no primeiro mundo,
onde os tributos possuem formação simples e são restituídos administrativamente
de ofício, situações essas que passam longe da nossa imensamente complexa
legislação tributária e da insaciável Fazenda Pública, que perdura inúmeras
cobranças indevidas, já assim consideradas pelo Poder Judiciário, como no caso
das parcelas indenizatórias não incidentes sobre as contribuições
previdenciárias ou mesmo da já julgada exclusão dos valores de ICMS da base de
cálculo das contribuições de PIS e COFINS. Nesse sentido, a medida de indisponibilidade
de bens, ao arrepio da Constituição Federal, ainda presume que o próprio Fisco
seja uma entidade infalível e dotada de toda a verdade, o que está
evidentemente longe de acontecer.
Evidentemente, ainda haverá muita discussão, sobretudo na
esfera do controle constitucional do Supremo Tribunal Federal, acerca da
constitucionalidade da medida instituída. Contudo, é inevitável que os
devedores da Fazenda Pública que possuam bens ligados a seu nome de pessoa
física ou jurídica agora tenham de correr ao Judiciário com ações anulatórias,
visando ao menos a discussão destes débitos ou mesmo a suspensão da
exigibilidade do tributo devido até que a sua consolidação seja devidamente
analisada.