Hélio Schwartsman, Folha - O Supremo e a banana
- O autor é bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...'
(Editora Contexto) em 2016.
É preciso sabedoria para ter poder nas mãos e
resistir à tentação de exercê-lo. A Primeira Turma do STF não teve essa
sabedoria. Ao contrário, a impressão que se tem é que esse colegiado, ao
determinar o afastamento de Aécio Neves das funções de senador e seu
recolhimento noturno, avistou uma casca de banana do outro lado da rua e
atravessou a via com o propósito de escorregar no epicarpo.
A decisão da turma não é tecnicamente impossível. Ela se
ampara no artigo 319 do Código de Processo Penal e não é diretamente
desautorizada pelos artigos da Constituição (53 e 55) que tratam das
inviolabilidades dos parlamentares. Ainda assim, a Primeira Turma deu um passo
politicamente temerário ao aplicar a um senador da República duras medidas
cautelares que não têm uma previsão constitucional explícita e sem o crivo do
plenário da corte.
Se já não é muito prudente para o Judiciário atuar em
território fronteiriço à independência entre os Poderes sem um argumento
próximo do incontestável, fazê-lo em relação a uma questão que é, no fundo,
lateral torna-se quase uma irresponsabilidade.
Aécio Neves está encrencado. O áudio em que ele pede
dinheiro a Joesley Batista constitui uma prova avassaladora, que ele terá
dificuldade para contestar. Mas isso é assunto para o julgamento de mérito. A
adoção ou não de medidas cautelares, que visam a evitar que o senador interfira
no processo, não muda o quadro geral. Se o STF está ansioso para punir
parlamentares corruptos, o que parece uma boa ideia, deveria cuidar para que o
mérito dos processos seja rapidamente julgado.
O Supremo não apenas não agiu com a cautela que se espera
da corte máxima como ainda deu oportunidade para uma queda de braço entre o
Judiciário e o Senado. Os bombeiros devem agora entrar em ação e imagino que
conseguirão evitar uma crise institucional. Mesmo assim, foi desnecessário.