Artigo, Tito Guarniere - Teoria do golpe perde força
O resultado do julgamento no TRF4 não estava nem nos
piores pesadelos de Lula. A condenação de primeira instância foi confirmada e a
pena aumentada. Os desembargadores federais votaram de forma unânime. A margem
de ação e resposta do ex-presidente ficou extremamente exígua para malabarismos
jurídicos que possam mudar a situação e garantir sua candidatura à presidência.
Houvesse um único voto divergente, mesmo que na
dosimetria da pena, então haveria ali uma brecha para recursos como os embargos
infringentes, atrasando a sentença final. O ganho de tempo de um mês, ou de
dois meses, nesta circunstância, poderiam ser decisivos para as pretensões de
Lula e do PT. Vale dizer, diminuíram as chances para judicializar a
candidatura, levando-a, ainda que “sub judice”, até o momento do voto, em
outubro.
Mas Lula não perdeu só por causa do resultado de 3x0. O
fato de que o recurso tenha sido julgado sob os olhos de todo o país,
transmitido ao vivo e comentado em tempo real por jornalistas e especialistas
nos meios de comunicação de massa, não deixou dúvidas: não foi um julgamento
político, como insistem em classificar o próprio Lula e os seus ativistas e
simpatizantes.
É preciso torturar os fatos, é preciso estar enfeitiçado
pelo carisma de Lula, ou blindado de ideologia bruta, para não reconhecer que,
naquela sala do Tribunal, a justiça se manifestou de forma elevada e serena,
principalmente nos votos dos desembargadores.
Notem bem: não é preciso concordar com eles e as suas
longas dissertações. Eu mesmo tenho restrições e interpretações diferentes
daquelas enunciadas pelos senhores desembargadores. Mas não há como negar que
eles se esmeraram em elaborar peças de alta densidade, que exibem saber
jurídico e conhecimento minucioso dos autos, o que, ao final e ao cabo, resulta
em teoria consistente, da confirmação da culpa do ex-presidente e do aumento da
pena.
Os relatórios dos senhores juízes passam um pente fino em
cada fato, depoimento, prova e indício, às vezes demolindo e outras vezes, no
mínimo, confrontando de forma convincente as alegações da defesa.
E há a forma sóbria, didática, de apresentar as razões de
cada um. Se os 95 correspondentes estrangeiros presentes ao julgamento de
alguma forma pensaram estar diante de um tribunal político, devem ter
constatado o equívoco. O que se viu foi um julgamento de alto grau de
ponderação e equilíbrio, de instituições que funcionam, de um país onde vigora
o Estado Democrático de Direito.
A narrativa de que o julgamento foi uma farsa, uma trama
para impedir a candidatura de Lula, sofreu duro golpe, perdeu força, ao menos
para quem assistiu a sessão do tribunal sem o “parti-pris” político e
ideológico, sem a paixão de torcedor. A versão do golpe não ganhará as ruas:
ficará restrita - por dever de ofício e por costume - ao discurso dos petistas
em geral, dos simpatizantes de Lula.
Lula acabou? Quem
disser que sim, está apenas expressando um palpite ou um desejo. Esta sentença
ainda não está dada. Mas que ele saiu muito abalado deste episódio, ninguém
tenha dúvida.
titoguarniere@terra.com.br