Advogado
“Quando as águas da enchente cobrem a tudo e a todos, é
porque de há muito começou a chover na serra. Nós é que não nos damos conta”
(Eraclio Zepeda (1937-2015), escritor e político mexicano).
A
concomitância da grave crise social e econômica com o sucessivo desvendar dos
casos de corrupção deixou a nação em estado de perplexidade e indignação. Logo,
generalizou-se a descrença na política, no parlamento, no judiciário e no
governo.
Então, quem está surpreso com os atuais resultados
eleitorais, com o tsunami conservador que varreu políticos de todas as
vertentes? Ora, surpresos estão os que não tiveram capacidade de realizar uma
autocrítica acerca dos seus comportamentos, ações e omissões.
Os inconformados com o tsunami “bolsonaro” não percebem -
ou não querem - que ele é mera coincidência temporal, um catalisador de
insatisfações de toda ordem e natureza. Poderia ter sido seu João ou dona
Maria!
São insatisfações represadas que remontam há muito antes
dos recentes governos, mas ora acumuladas e agravadas, e que explodiram neste
processo eleitoral. Não à toa, alcançando e retirando representação de figuras
(pré)históricas da política nacional.
O escritor húngaro George Konrad (1933) definiu a
antipolítica como “uma força moral da sociedade civil que articula a
desconfiança e rejeição públicas do monopólio de poder da classe política
dentro do Estado – um poder usado contra as populações. Esta força moral não
pretende derrubar o poder político, mas opor-se à opressão que ele exerce sobre
as populações.”
Historicamente (mesmo em outros países), partidos
políticos - tanto as direções partidárias quanto os militantes mais ativos -
têm restrições em realizar uma auto critica. Temem municiar adversários.
Porém, ao relevar, omitir e desdenhar circunstâncias e
fatos negativos de sua responsabilidade, resulta por se equipararem aos piores
exemplos da degradante prática da velha política. O que sugere, demonstra e
confirma que nada entenderam sobre as razoes do presente fenômeno comportamental
e eleitoral.
E agora, face a
desqualificada “renovação” no Congresso Nacional, com mais de trinta partidos
representados e as discutíveis bancadas temáticas “da bala”, “do boi”, “da
bíblia”, “dos parentes” e “da bola”, dias piores virão. Ruim para a democracia,
pior para os brasileiros.
O conselheiro Acácio, na obra literária “Primo Basílio”,
de Eça de Queiroz, teria dito que “as conseqüências vem sempre depois!”