Passaram dos limites
Foram longe demais, ultrapassaram os limites do razoável
e estupraram a legalidade. Pior ainda, igualaram-se aos mais terríveis
delinquentes. Falo de todos os que permitiram a barbárie do aprisionamento de
criminosos em viaturas policiais. Então, admito, todos fomos longe demais.
Atuando diretamente ou simplesmente deixando que as coisas acontecessem à
margem da lei, arrepiando os princípios fundamentais e rasgando os mandamentos
constitucionais. Há dispositivos em nossa Constituição que vedam as penas cruéis
e o tratamento desumano ou degradante. Pois o que está proibido é exatamente o
que o Estado vem fazendo.
Não bastasse o conjunto de normas violadas em desfavor de
quem foi preso, avulta o prejuízo causado à sociedade. As viaturas da Brigada
Militar passaram a ser carceragem, estacionadas à porta de uma Delegacia de
Polícia, enquanto as ruas ficaram sem ronda ou vigilância. O policiamento
ostensivo fragilizado, com homens e carros parados para manter sob custódia
quem deveria estar em uma casa prisional. Se em delegacias é uma ilegalidade a
manutenção de presos, o que dizer da aberração do recolhimento em um carro
policial.
Ouvi depoimentos veementes de alguns policiais, em clamor
contra o absurdo. A ASDEP, entidade de classe dos Delegados, por sua presidente,
Nadine Anflor, reiterou o propósito de "sempre denunciar o que tem
ocorrido, para que o Estado tome alguma atitude". Modestamente, alinho-me
com esse modo de pensar e de requerer. Há decisões judiciais que reafirmam ser
ilegal o que vem acontecendo. Há, então, desobediência diária aos mandamentos
da Justiça. E agiganta-se o dilema enfrentado pelos Delegados. Ou são cúmplices
em desobedecer, prendendo, ou são prevaricadores, soltando quem chegou
algemado, em flagrante delito, ou em cumprimento de algum mandado de prisão.
Espero da Defensoria Pública, do Ministério Público, da
Ordem dos Advogados do Brasil e do Judiciário a rápida solução do quadro
tenebroso que estamos testemunhando. Se ninguém pedir, que a Justiça conceda,
de ofício, a liberdade aos que estão presos sob abuso e em quadro de visível
degradação humana. Ou vamos admitir, que fomos muito além dos limites e estamos
nos igualando aos bandidos que pretendemos punir.