Artigo, Rodrigo Constantino, Istoé - Mea-culpa

A tensão entre governo e imprensa é inevitável. Jornalismo não é fazer propaganda, mas é possível uma cobertura mais justa

“Todos estão procurando um motivo para não assumir a responsabilidade por suas próprias ações”, disse Clint Eastwood certa vez. A evasão, a busca por bodes expiatórios, a tentativa de sempre culpar os outros são tão antigas quanto a humanidade. Que diferença faz a coragem de admitir os próprios erros!

O Brasil vive um momento extremamente delicado. Nosso Estado faliu e a principal causa é o rombo previdenciário, apesar de não ser a única. Qualquer pessoa sensata vai reconhecer que precisamos de um choque de produtividade, de redução da ingerência estatal e do resgate de certos valores morais. A decadência deixada pelo petismo é econômica e também cultural.

Há divergências quanto aos métodos para se resgatar o crescimento e os valores, já que numa democracia o pluralismo é saudável. Ninguém é dono da verdade. Mas é consensual a necessidade de mudanças, de uma agenda propositiva comum para recolocar a economia nos trilhos, de conter os gastos públicos e estancar a baixaria nos costumes.

A pauta liberal-conservadora isso faz sentido. Mesmo progressistas moderados podem aceitar essa realidade. As principais lideranças do País, portanto, têm a obrigação moral de encontrar esse denominador comum para salvar o Brasil do caos. Mas poucos têm adotado essa postura agregadora.

O próprio presidente, influenciado por sua militância, investe em discursos que geram mais cizânia do que qualquer outra coisa. Boa parte do Congresso, por outro lado, demonstra pouco patriotismo e tenta preservar os velhos privilégios. Já a imprensa acaba exagerando na dose das críticas por causa de sua antipatia ao presidente.

Carlos Alberto Di Franco escreveu condenando a má vontade de Bolsonaro com a imprensa, mas reconhecendo que os jornalistas também não ajudam nada: “nós, da imprensa, talvez ressentidos pelo estilo polêmico do presidente, sobretudo pela agressividade dos seus filhos, não estamos captando os sinais do governo. Por isso temos sido excessivamente críticos com uma administração que está nos começos e carregando uma herança para lá de incompetente, corrupta e irresponsável”.

A tensão entre governo e imprensa é inevitável onde há liberdade de expressão e não é papel do jornalismo fazer propaganda. Mas é possível ser mais justo, como diz Di Franco: “Os leitores, com razão, manifestam cansaço com o tom sombrio das nossas coberturas. É possível denunciar mazelas com um olhar propositivo”. É hora de todos fazerem uma reflexão e um mea-culpa, aparando arestas e focando naquilo que importa. O Brasil tem pressa!

Artigo, Gazeta do Povo - Eles insistem com a volta do Imposto Sindical


Com a reforma trabalhista de 2017, o sindicalismo se viu desafiado pelo fim da cobrança obrigatória que até então era imposta a todos os trabalhadores de uma determinada categoria com a finalidade de sustentar o respectivo sindicato – independentemente de o funcionário ser ou não filiado à entidade. O chamado “imposto sindical” chegou a movimentar R$ 3,5 bilhões anuais, destinados a sindicatos e centrais sindicais que às vezes estavam mais preocupados em fazer política partidária que em lutar pelos direitos dos trabalhadores que diziam representar. Com a reforma, o desconto passou a depender de autorização expressa e individual do funcionário.

Essas entidades poderiam ter seguido o exemplo de sindicatos com grande filiação e tradição de combatividade em favor de sua categoria, reinventando-se para conquistar novos membros que estivessem voluntariamente dispostos a sustentá-las. Mas, em vez disso, preferiram recorrer a truques legais para burlar a intenção da lei e garantir a continuação da cobrança indiscriminada. Sindicatos passaram a realizar “assembleias extraordinárias”, com presença nem sempre numerosa, em que aprovavam o desconto na folha de todos os trabalhadores da categoria.

É inexplicável a atitude de sindicatos, procuradores e juízes que insistem em passar por cima da lei e das decisões do STF para prejudicar o trabalhador

Para conseguir manter a cobrança, as entidades alegavam a “prevalência do negociado sobre o legislado”, princípio saudável das relações trabalhistas – mas distorcido neste caso, pois seria preciso deturpar o texto de partes da CLT que tratam do desconto, como os artigos 579 e 545, que condiciona o desconto do imposto sindical à “autorização prévia e expressa” dos trabalhadores. Para os sindicatos, a redação dos textos, que usa o plural ao se referir a “empregados”, daria margem a uma autorização coletiva, e não individual. Claro que, para tal, seria preciso atropelar o artigo 611-B da CLT, segundo o qual ninguém pode sofrer desconto de valor algum “sem sua expressa e prévia anuência”, um direito que não pode ser anulado por convenções coletivas.

Infelizmente, a rebelião ideológica contra a reforma trabalhista dentro do Ministério Público do Trabalho e da Justiça do Trabalho permitiu que a tese da cobrança coletiva, ainda que completamente desprovida de amparo legal e já descartada pelo Supremo Tribunal Federal em 2018, pudesse prevalecer nos casos em que os sindicatos buscaram o Judiciário. Até mesmo a segunda instância, os Tribunais Regionais do Trabalho, tem tomado decisões neste sentido. Mas as empresas obrigadas a fazer o desconto em folha começaram a reagir, e um dos casos chegou ao STF.

No fim de maio, a ministra Cármen Lúcia concedeu liminar a pedido de uma metalúrgica do Rio Grande do Sul, derrubando uma decisão do TRT da 4.ª Região que tinha beneficiado um sindicato do setor. Ela lembrou o julgamento realizado no próprio Supremo a respeito da constitucionalidade de trechos da reforma trabalhista, ocasião em que o entendimento da corte foi pela necessidade de autorização individual para a cobrança do imposto sindical. Assim, o Supremo consolida a jurisprudência a respeito do tema, tornando ainda mais inexplicável a atitude de sindicatos, procuradores e juízes que insistem em passar por cima da lei e das decisões do STF para prejudicar o trabalhador.

A disputa jurídica em torno da cobrança do imposto sindical levou o governo Jair Bolsonaro a publicar, no início de março deste ano, a Medida Provisória 873/19, que buscou eliminar qualquer possível ambiguidade na CLT e deixar ainda mais claro que é o trabalhador, de forma individual e voluntária, que tem de autorizar o desconto. No entanto, a MP ainda introduziu exigências totalmente desnecessárias e desproporcionais, como a necessidade de cobrança por boleto, em vez do desconto direto em folha – uma formalidade totalmente dispensável, se levarmos em conta que o empregador já manifestou sua intenção de realizar o pagamento.

A MP ainda aguarda a escolha de um relator na comissão mista de deputados e senadores, e corre o risco de caducar no fim de junho. Por mais que o artigo 611-B da CLT e o Supremo já sejam claros, o texto publicado por Bolsonaro serviria para acabar de vez com as dúvidas sobre a autorização individual para a cobrança; por isso, o ideal seria que os congressistas aprovassem a MP, eliminando dele os trechos excessivos, como o referente ao boleto bancário. Quanto aos sindicatos, que saibam cumprir a lei, esforçando-se para conquistar mais filiados, e não para buscar vitórias duvidosas nos tribunais.