4ª Turma do STJ decide que bens familiares não podem ser penhorados quando dados em caução para garantir cumprimento de contrato de locação
Ainda que sirvam como caução para contratos, a possibilidade de penhora bens deve ser interpretada de forma restritiva
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu proteger os bens familiares da penhora de bens, mesmo que tenham sido oferecidos como caução. No entendimento do colegiado predominou a ideia de que a norma que protege o bem de família deve ser interpretada de forma restritiva, sem a penhora, ainda que oferecida espontaneamente para garantir o cumprimento do contrato.
“Um dos fundamentos para tal entendimento é a natureza jurídica da caução, que difere da fiança. Embora ambas sejam mecanismos de garantia em contrato de locação, na caução há indicação de um determinado bem para o caso de descumprimento contratual, sobre o qual poderá recair a penhora. Já na fiança, todos os bens que integram o patrimônio do fiador poderão responder pelo inadimplemento do locatário -- entre estes o bem de família, por disposição do artigo 3°, VII, da Lei 8.009 /1990”, explicou a advogada e professora de Direito da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília (FPMB) Suzana Viegas.
Para o STJ, o oferecimento de bem familiar em garantia nesse tipo de contrato locatício não implica, em regra, renúncia à proteção legal concedida pela Lei 8.009/1990, segundo o publicado pelo portal de notícias do tribunal. O entendimento foi estabelecido pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que admitiu a penhora de imóvel oferecido como caução em contrato de locação comercial, por entender que haveria semelhança entre a caução e o instituto da hipoteca -- este último previsto pelo artigo 3º, inciso V, da Lei 8.009/1990 como uma das hipóteses de exceção à impenhorabilidade.
Relator do recurso especial, o ministro Marco Buzzi explicou que a impenhorabilidade do bem de família protege direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana e a moradia, sendo vedado ao Judiciário criar hipóteses de limitação dessa proteção (STJ). “Prevalece a natureza cogente da norma de proteção ao bem de família, que tem por objetivo garantir direitos fundamentais, tais como a moradia, o patrimônio mínimo e a dignidade da pessoa humana, sendo, portanto, um direito irrenunciável”, acrescentou a docente.
A jurisprudência do STJ considera que a exceção à impenhorabilidade prevista pela Lei 8.009/1990 para a fiança em contrato de locação não deve ser estendida ao bem de família oferecido como caução. Segundo o relator, essa impossibilidade ocorre porque os institutos da fiança e da caução foram disciplinados pelo legislador como diferentes modalidades de garantia da locação, nos termos do artigo 37 da Lei 8.245/1991.
Citando doutrina sobre o tema, Buzzi comentou que a caução de imóvel não se confunde com a fiança, a qual possui natureza pessoal, tampouco com a hipoteca -- que, apesar de também ser uma garantia real, é formalizada apenas por meio de escritura pública, ao passo que a caução deve ser averbada na matrícula do bem dado em garantia, nos termos do artigo 38, parágrafo 1º, da Lei de Locações.
“Eventual equiparação entre os dois institutos comprometeria a isonomia e a previsibilidade das relações jurídicas. Apesar do entendimento quanto à impenhorabilidade, o direito ainda não foi reconhecido de forma definitiva no caso dos autos, pois resta pendente a comprovação dos requisitos para a caracterização do bem de família, tendo sido determinada a remessa ao tribunal de origem para tal finalidade”, disse a mackenzista.
Assim, no caso dos autos, o relator entendeu não ser possível reconhecer, de imediato, a impenhorabilidade alegada no recurso especial, pois os requisitos para que o imóvel seja considerado bem de família não foram objeto de análise. Dessa forma, a Quarta Turma determinou que o TJSP julgue novamente o agravo de instrumento interposto na origem para verificar as condições previstas pela Lei 8.009/1990. Leia o acórdão no REsp 1.789.505.
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