A reportagem é da alemã Deutshe Welle.
As forças de segurança da Venezuela estão fazendo uso de
esquadrões da morte para matar opositores e vêm sistematicamente forjando
situações para parecer que as vítimas resistiram à prisão, denunciou nesta 5ª
feira (4.jul.2019) um relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas
(ONU).
O relatório aponta que o governo da Venezuela registou
5.287 mortes em operações de segurança em 2018, alegando que elas ocorreram em
circunstâncias de “resistência à autoridade”, segundo o relatório apresentado
pela Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle
Bachelet.
A chilena relatou ainda que outras 1.569 mortes já foram
registadas no 1º semestre de 2019 e que muitas delas parecem ter sido execuções
extrajudiciais. Segundo o relatório, nos últimos 10 anos, e especialmente desde
2016, o regime de Maduro executou uma estratégia para “neutralizar, reprimir e
incriminar adversários políticos críticos do governo”.
A ONU também denuncia que está havendo uma paulatina
militarização das instituições do Estado durante a última década e
responsabiliza forças civis e militares por prisões arbitrárias, maus tratos e
torturas a críticos do governo e familiares.
Os especialistas da ONU fizeram 558 entrevistas na
Venezuela e em outros 8 países com vítimas e testemunhas das violações de
direitos humanos cometidas por integrantes do governo e da situação caótica da
economia do país.
As famílias de 20 homens descreveram como homens
mascarados das Forças de Ação Especial da Venezuela (FAES) vestidos de preto
chegaram em picapes pretas sem placas. Segundo os relatos, os esquadrões da morte
invadiram as casas, levaram pertences e agrediram mulheres e meninas, às vezes
arrancando suas roupas. “Eles separavam homens jovens de outros familiares
antes de baleá-los”, disse o relatório.
“Em todos os casos, testemunhas relataram com o FAES manipulou
a cena do crime e as provas. Eles plantavam armas e drogas e disparavam contra
as paredes ou para o alto para insinuar 1 confronto e para mostrar que a vítima
‘resistiu à autoridade'”.
Segundo o relatório, as forças de segurança também são
culpadas pelos casos de violência sexual e de gênero cometidos dentro das
cadeias em visitas de familiares ou amigos de detidos, assim como pelo uso
excessivo de força para conter manifestações contrárias a Maduro.
O documento cita o caso específico dos grupos armados
civis que apoiam o governo, mais conhecidos como “coletivos”, e traz documentos
sobre pelo menos 66 mortes que ocorreram durante os protestos realizados entre
janeiro e maio deste ano. Do total, 52 delas são, conforme a ONU, atribuíveis
às forças de segurança ou a aliados do regime chavista.
No início desta semana, Bachelet pediu uma investigação
independente, imparcial e transparente sobre a morte do capitão de corveta da
Marinha venezuelana Rafael Arévalo Acosta, que teria sido torturado e assassinado
dentro da cadeia.
O relatório divulgado hoje indica que há 793 pessoas
privadas arbitrariamente de liberdade, entre elas 58 mulheres, e que 22
deputados da Assembleia Nacional, incluindo o presidente do parlamento, Juan
Guaidó, perderam suas imunidades parlamentares de forma abusiva.
“Diante desses abusos, são poucas as pessoas que
apresentam denúncias por medo de represálias ou por falta de confiança no
sistema judicial”, ressaltou o relatório.
A ONU também diz ter detectado uma deterioração da liberdade
de expressão, com uma tentativa por parte do governo de “impor sua própria
versão dos fatos e criar 1 ambiente que restringe o trabalho de veículos de
imprensa independentes”.
No comunicado que acompanha a apresentação do relatório,
Bachelet pede que pessoas com poder e influência, tanto na Venezuela como no
resto do mundo, se unam para tentar solucionar a crise.
Após a divulgação do documento, o governo venezuelano
contestou as conclusões e acusou a ONU de parcialidade.
“O relatório apresenta uma visão seletiva e abertamente
parcializada sobre a verdadeira situação de direitos humanos na República
Bolivariana da Venezuela, que contradiz os princípios que devem reger o
tratamento dos assuntos de direitos humanos, contidos na Declaração e Programa
de Ação de Viena”, disse o governo venezuelano, em comunicado.
Segundo Caracas, “é particularmente preocupante que 82% das
entrevistas usadas para substanciar o relatório correspondam a pessoas
localizadas fora da Venezuela”, sem considerar as visitas a centros de
reclusão, hospitais, armazéns de distribuição de alimentos e urbanismos da
Grande Missão Habitação social.