O custo orçamentário, para o governo, de aprovar as
mudanças na previdência social está sendo significativo. O Palácio do Planalto
vem executando o orçamento relativo às emendas parlamentares na medida
necessária para para fazer passar “a mãe de todas as reformas”. Mas o custo
político é baixo, baixíssimo. O que em outras circunstâncias seria objeto de
escândalo (“compra de votos!”) desta vez é deglutido sem maior dificuldade.
A constatação não chega a ser nova. A governabilidade de
Jair Bolsonaro é sólida pois o núcleo da agenda governamental, o programa
econômico liberal, tem o apoio de pelo menos dois terços do Congresso, é quase
unânime no empresariado e continua bem sustentado na esmagadora maioria da
imprensa. Daí por que as “crises” vêm, parecem por um instante terminais, e
logo viram poeira. Ou fumaça. Como foi com a mais recente, dos incêndios
florestais. Olha o trocadilho.
Há, é claro, mercado para os projetos em torno de um
liberalismo bem-educado e cosmopolita, autointitulado progressista, e daí as
versões repaginadas do Velho do Restelo, a advertir que tudo vai dar errado.
Para esse “bolsonarismo sem Bolsonaro", o país estaria à beira do caos, se
já não mergulhado nele. Mas a cada episódio o que leva jeito de tsunami na
opinião pública, quando chega à praia de Brasília fica mais com cara de
marolinha.
Inclusive por esse cosmopolitismo arejado chocar-se com a
linha nacionalista, ainda que fortemente ocidentalista, hegemônica nas Forças
Armadas. A polêmica amazônica comprova.
Outro aspecto reforça a resiliência governamental. O
partido mais forte capaz de lhe fazer oposição, com ramificações sólidas e
profundas nas diversas instâncias de poder, está isolado. O aqui livremente
chamado de Partido da Lava Jato (PLJ) mantém musculatura e apoio popular, pode
inclusive continuar produzindo fatos político-policiais em série, mas sua
capacidade de alterar a correlação de forças operacional está contida por causa
do isolamento.
Mais um mérito (ou demérito) da agenda econômica.
O caráter consensual da agenda, mais o amplo espectro dos
alvos do PLJ, mais a objeção a que o PLJ provoque uma disrupção (e viva os
anglicismos e neologismos) num quadro tão produtivo, tudo induz a um
alinhamento raro entre os poderes, pelo menos desde a instalação da hoje
carcomida Nova República. O estilo do presidente da República é uma linha de
produção de manchetes, mas na vida prática os vetores executivo, legislativo e
judiciário produzem boa resultante.
Onde estão os riscos? Principalmente 1) na nova
modalidade de enquadramento do Legislativo pelo Executivo e 2) na sede de
protagonismo do braço judiciário do PLJ. Se a velocidade da recuperação da
economia e dos empregos seguir baixa, quanto tempo o Congresso levará para
voltar a exigir o dito loteamento da Esplanada e das estatais? E até onde irão
os torquemadas dos tribunais, especialmente nos superiores, para revitalizar o
próprio protagonismo, hoje corroído?
No instável presidencialismo brasileiro, onde a
pulverização do Congresso é um foco permanente a ameaçar a saúde política do
ocupante do Planalto, é sempre bom ficar esperto. Mas por enquanto as coisas
para o governo caminham bastante bem nesse terreno.
*
O Tribunal Superior Eleitoral decidiu que candidatura
laranja leva à cassação de toda a chapa. Mas como provar que a candidatura é
laranja? Fácil, candidatas-laranja não são de verdade, são de mentirinha, nem
fazem campanha. Mas, e se alguém decide ser candidata e depois desiste de fazer
campanha a partir de um certo ponto, como é que fica? E se a candidata faz uma
campanha pra inglês ver, gasta uma graninha, então está tudo bem?
Outra consequência da decisão do TSE: o sujeito entra
numa chapa, faz sua campanha direitinho, elege-se. Aí alguém diz que tinha uma
(ou um?) laranja na chapa. O sujeito perde o mandato sem ter cometido nenhuma
irregularidade, nenhum crime? Talvez o STF tenha, um dia, de verificar se a
decisão do TSE não viola algum direito constitucional. Ainda que esteja fora de
moda argumentar com Constituição contra o que parece ser “certo” e “justo”.
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Alon Feuerwerker (+55 61 9 8161-9394)