TITO GUARNIERE
A TRAPALHADA DA CARNE FRACA
Há um mês atrás a Polícia Federal botou em cana quase 30
agentes sanitários e dirigentes de empresas na Operação Carne Fraca. Estariam
mancomunados para vender, no mercado interno e no exterior, carne com prazo de
validade vencida, contaminada de bactérias, além de usar papelão para encher
linguiças e outros embutidos. Foi uma operação espetacular, como manda o figurino
atual, feita com ampla cobertura da mídia, causando revolta entre os
consumidores e previsível reação dos mercados compradores internacionais.
Não demorou e logo se viu que não era nada daquilo. A
Polícia Federal, o Ministério Público e juízes, com sangue nos olhos para
combater o mal, porém imprudentes e desatentos, ignorando medida e proporção,
haviam transformado irregularidades pontuais em um escândalo de proporções
épicas.
Nenhum dos afoitos e descuidados agentes do Estado,
provavelmente, conhecia algum caso recente de intoxicação alimentar por causa
da carne de gado ou de frango, ainda que fosse por ouvir dizer. Nenhum deles
quis saber de que modo foi possível sair por aí vendendo carne podre – cujo
cheiro é inconfundível - sem que ninguém tenha notado. E nem de longe cogitaram
de como o Brasil poderia ter chegado a posição invejável no mundo, no comércio
de proteína animal, sem cumprir o dever de casa, que começa na obediência
estrita das normas sanitárias. Nenhum deles parou para pensar. Simplesmente
tocaram bala.
As consequências foram desastrosas para os produtores de
carne e para o País. Imediatamente, mais de dez países declararam a carne do
Brasil sob suspeição, cancelando pedidos, mandando investigar de perto, e
ameaçando suspender definitivamente a compra de fornecedores brasileiros.
As empresas do segmento e o governo tiveram que sair às
pressas apagando incêndios pelo mundo, tentando diminuir o impacto da denúncia
e mostrando o que era a mais simples verdade: a operação carregou nas tintas,
exagerou na dose. Tudo indica que a “crise” foi debelada pela pronta
intervenção do governo e das empresas. Tudo voltou ao normal, mas não sem antes
causar um grave prejuízo às exportações nacionais, sem provocar um susto
desnecessário, que poderia ter sido de consequências devastadoras, no instante
em que o País tenta a duras penas sair da recessão.
A Operação Carne Fraca desapareceu da mídia. Não se sabe
se existe ainda alguém preso. Não se ouve falar nada de quem bolou a malfadada
“blitz”, de quem a executou, de que autoridades assinaram os papéis da ação mal
ajambrada.
Entre mortos e feridos todos se salvaram, inclusive as
autoridades responsáveis pela operação. Não pediram desculpas, não receberam
nenhuma advertência pela ação temerária e mal calculada, não tiveram (nem
terão) nenhum prejuízo nos seus bons salários e continuarão levando vida
normal. Talvez sintam algum remorso na hora de traçar uma picanha suculenta ou
uma costela gorda e macia – mas só pelo medo de engordar. Eles – os autores da
patacoada – podem saborear carne brasileira à vontade que não lhes causará
nenhum mal.
titoguarniere@terra.com.br