É indispensável, no ambiente de nossa cada vez mais
pobre cultura política, incentivar a compreensão apropriada do
pensamento social-conservador, oposto tanto ao liberalismo quanto ao
utilitarismo e ao socialismo. A vulgata esquerdista no Brasil, com seu
descontrole salivar, associa a tradição conservadora ao atraso e ao golpismo.
Essa perversão operada pela esquerda brasileira infestou o meio acadêmico,
político e intelectual. Apresentar-se como conservador é o primeiro passo
para ser surrado moralmente, uma consequência de 50 anos de monopólio da
cultura, na verdade do patrocínio da ignorância, por parte da
esquerda no Brasil. O conservadorismo que poucos conhecem entre
nós, é uma corrente filosófico-política que se sustenta
em princípios sólidos e compromissos com os alicerces da
civilização. Além, disso, é fonte para o desenvolvimento social e
para a condução política há mais de 200 anos. Pensadores e líderes
como Edmund Burke, Alexis de Toqueville, Joseph de Maistre, Charles
Boudelaire, John Quincy Adams, George Canning, Samuel Taylor Coleridge, Robert
Pell, Thomas Babington Macaulay, Fenimore Cooper, Benjamin Disraeli, Cardinal
Newman, J. F. Stephen, Henry Maine, W. W. H. Lecky, Henry Adams, Theodore
Roosevelt, Arthur Balfour, W. H. Mallok, Irving Babbit, Frank S.
Meyer, F. A Hayek, Paul Elmer More, George Santayana, Winston Churchill T,
S. Elliot, Roger Scrutton, Michael Oakeshott e Russel Kirk produziram, entre outros
mais, um corpus conceitual anti-autoritário e antimaterialista
com base em valores universais permanentes.
Para uma reflexão inicial, é possível alinhar seis pontos
norteadores comuns ao conservadorismo social. Esta apresentação é
despretenciosa, porque não se pode condensar sistemas intelectuais
profundos e intrincados em algumas frases . Além do mais, o
conservadorismo não constitui um corpo fixo e imutável de dogmas. Feita a
ressalva, é aceitável afirmar que o conservadorismo configura-se como:
(1) Crença numa ordem transcedental, ou corpo de
leis naturais, que governa a sociedade e a consciência dos homens. Problemas
políticos, no fundo, são problemas morais e religiosos. Uma
racionalidade estreita não pode satisfazer as demandas humanas. A
verdadeira política é a arte de apreender e aplicar a Justiça, que deve
prevalecer numa comunidade de almas;
(2) Afeição pela variedade e mistérios da existência
humana , em oposição à estreita uniformidade, igualitarismo e pretensões
utilitárias de sistemas radicais;
(3) Convicção que uma sociedade civilizada
requer ordens e classes, contrariamente à noção da "sociedade
sem classes". Se distinções naturais são apagadas entre os homens, os
oligarcas preeenchem o vácuo. A igualdade última perante o julgamento de Deus,
assim como a igualdade perante a lei, são princípios indisputáveis. Mas a
iguaidade abstrata de condições significa a igualdade em servidão,
estagnação e tédio;
(4) Convicção de que a liberdade e a propriedade
estão fortemente ligadas.Se separarmos a propriedade da posse privada, o
Estado se torna mestre de tudo. O nivelamento econômico não é progresso
econômico;
(5) Fé na prescrição, com base no
ordenamento jurídico calcado na lei natural. Desconfiança dos sofistas e
calculadores, que desejam reconstruir a sociedade sobre modelos abstratos.
O costume, a convenção e as prescrições tradicionais, são
impedimentos aos impulsos anárquicos do homem (o ser humano não é bom por
natureza) e à tentação de acúmulo de poder;
(6) Reconhecimento que a mudança não pode ser igualada à
reforma radical. A inovação apressada pode ser uma conflagração devoradora e
não o caminho do progresso. A sociedade deve mudar, mas a mudança prudente é
que a preserva. O estadista sempre deve ser prudente nos
cálculos que faz.
Esta é a sua maior virtude.
São traços são muito gerais, mas podem ser
encontrados, por exemplo, no grande clássico de Burke, Reflexões sobre a
Revolução na França. É fácil constatar que eles se opõem frontalmente aos
vários tipos de radicalismo, que têm a marca distintiva, desde
Rousseau, no ataque ao ordenamento prescritivo da sociedade. Ao contrário
do conservador, o radical defende:
(1) A perfectibilidade do homem e o progresso ilimitado
da sociedade. O radical é um melhorista. Ele crê que a educação, a
legislação positiva e alteração do meio podem produzir homens assemelhados a
deuses. E nega que a humanidade possua uma tendência natural para a violência e
o pecado;
(2) O desprezo pela tradição. A razão, o impulso e o
determinismo materialista são guias para a obtenção do bem estar social, e não
o costume ou a sabedoria dos ancestrais. A religião formal é rejeitada e várias
ideologias são colocadas em seu lugar;
(3) O nivelamento político . A ordem é abolida e é
estimulada a "democracia total". Desprezo pela atividade e acordos do
parlamento e desejo de centralização de poder.
(4) Nivelamento econômico. Os direitos de
propriedade são suspeitos para a quase maioria dos radicais; posse
coletiva dos meios de produção e desejo de reformas que partem desde o
confisco da terra e sua redistribuição até a sua inteira coletivização.
O ideário radical define o perfil das esquerdas e
dos utilitaristas (como Jeremy Bentham e John Stuat Mill) desde os tempos
dos jacobinos franceses. Já o conservadorismo social tem se
apresentado como uma barricada política e teórica contra o
"melhorismo ensandecido" com o qual o mundo convive desde o
século XIX. Deve-se constatar que as ideias conservadores ttêm sido mais
estudadas no Brasil, mas ainda é necessário que se amplie seus
conhecimentos das obras conservadoras, para que possam, com base num
instrumental teórico refinado, fazer frente à verborragia pretensiosa
que o esquerdismo produz.