Artigo, Revista Crusoé - Gilmar, Incitatus, a toga e o silêncio

"Quando o cavalo Incitatus foi nomeado cônsul por Calígula, o Senado se calou. Quando o juiz moderno decide que apenas uma mão pode tocar nos intocáveis, o povo se cala"

Não era um ato de humor, tampouco de loucura aleatória. Era gesto de poder. Era o triunfo da vontade imperial sobre a razão pública.

(...)

Séculos depois, um magistrado, Gilmar Mendes, decide, como Calígula:

"Sim, eu determino que somente fulano pode me julgar, segundo os critérios que eu mesmo dito."

Pobre Brasil, essa Zumbilândia.

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Artigo, especial, Alex Pipkin - Cleptocracia firme e intacta

Alex Pipkin, PhD em Administração

É tragicômico — e instrutivo, no pior sentido — ver autoridades do Estado tupiniquim recitando “democracia” e “Estado de Direito” como mantras redentores, fórmulas mágicas supostamente capazes de purificar a lama institucional. 

Democracia o quê, Estado de Direito o quê! Na cartilha deles, democracia é um deboche, e a lei é só mais uma criada obrigada a reverenciar o senhor do momento.

Aqui vigora cleptocracia na veia. Eles arrotam virtudes enquanto praticam exatamente o oposto. É um teatro dantesco: posam de estadistas, vestem o figurino da liturgia, mas agem como maldosos profissionais, e claro, incompetentes de carteirinha. São simultaneamente ambas as coisas.

O improviso do chefe expõe o que a encenação tenta disfarçar. Há sempre um preconceito escorrendo, às vezes homofóbico, às vezes antissemita, embrulhado na grosseria que se normalizou. Somam-se a isso a limitação intelectual crônica, que jamais o abandonou, e o maltrato cotidiano da língua portuguesa, que ele subjuga com a 

 mesma displicência com que subjugou a ética pública. Não há compromisso com civilização, com republicanismo ou com qualquer virtude pública; há, sim, a velha esperteza nacional transformada em doutrina oficial.

O objetivo real sempre foi o mesmo: autoenriquecimento. Primeiro dele, depois dos seus, e finalmente da confraria vermelha que se alimenta do dinheiro alheio. 

O caso envolvendo o filho do presidente, Lulinha, e o operador do esquema no INSS — o célebre “Careca” — não surpreende ninguém que ainda conserve a capacidade elementar de somar fatos. Há depoimentos nebulosos, favores, proximidades que desafiam a lógica. O mesmo aroma conhecido dos negócios feitos nas sombras. É a Lei de Gerson com brasão governamental.

A moldura institucional cumpre seu papel com devoção. Onde há banco, brota arranjo; onde há conselho, viceja compadrio com “autoridades”, onde há risco, aparece um ministro pronto para desligar a luz. O episódio do Banco Master é quase um estudo de caso dessa engrenagem. Bastou a transparência ameaçar entrar para surgir Toffoli, diligente, decretando sigilo. Evidente, uma forma elegante de anunciar que todos estão proibidos de enxergar o óbvio, esse óbvio “lulante”.

No dicionário lulopetista, “conflito de interesses” simplesmente não existe. Não por discordância doutrinária, mas porque, para eles, interesse legítimo é apenas o deles. Escárnio.

Enquanto isso, o Brasil segue assistindo confortavelmente essa cleptocracia aberta, explícita, quase didática. Mas a juventude modernosa doutrinada desfila slogans importados — “do rio ao mar” — sem saber qual rio, qual mar ou sequer o sentido das palavras que repete. Manipulados de manual, puros idiotas úteis. Triste, mas do outro lado, os que se dizem conservadores também falham. Protestam cegos quando é conveniente, calam quando é necessário. Habituaram-se ao escândalo, normalizaram o absurdo. Ou cansaram…

Porém, a verdade permanece cristalina:

a cleptocracia segue firme, blindada, intacta, alimentada pela maldade predatória dos seus operadores e pela incompetência monumental que os acompanha. 

Era previsível. Eles voltariam ao palco onde sempre atuaram, a cena do crime, só que com mais fome, mais método e menos pudor.

Lamentável! E a plateia continua sentada, talvez por covardia, talvez por hábito, mesmo quando o país inteiro exala aquele cheiro inconfundível de que há, sim, algo de podre no reino vermelho, verde e amarelo.

No fim das contas, muita gente ainda não entendeu que não se trata de político de estimação. É a corrupção, estúpido!

Conheça as relações corrosivas entre Dias Toffoli e os amigos dos amigos dos donos do Banco Master

O advogado Augusto Arruda Botelho conseguiu que o ministro Dias Toffoli avocasse para si, quarta-feira, todas as ações relacionadas com o Banco Master, colocando tudo sob sigilo. Botelho é advogado de Luiz Antonio Bull, que foi diretor de Compliance do Banco Master e preso na operação Compliance Zero. A  mulher de Toffoli, Roberta Toffoli foi sócia do advogado, que além disto viajou em jatinho com o ministro, dia 29, para Lima, tudo para ver um jogo de futebol.

O ministro tomou a decisão depois que a juiza federal Solange Salgado da Silva, TRF1, libertou Daniel Vocaro, o presidente do banco e todos os diretores,inclusive Bull.

O advogado Botelho é amigo de Dias Toffoli e foi com ele ao Peru para assistir em 29 de novembro de 2025 ao jogo final da Libertadores da América entre Palmeiras e Flamengo. O Flamengo venceu por 1 a 0 e foi campeão. Toffoli é palmeirense e foi num jatinho com outros torcedores do time. O dono do avião é o empresário Luiz Osvaldo Pastore, amigo de Toffoli e do pessoal do Banco Master, que convidou também o ex-deputado e ex-ministro Aldo Rebelo e o advogado Augusto Arruda Botelho, todos palmeirenses. No caso de Botelho, ele é advogado de Luiz Antonio Bull, que foi diretor de Compliance do Banco Master e preso na operação Compliance Zero.

Gilmar, Incitatus, a toga e o silêncio

"Quando o cavalo Incitatus foi nomeado cônsul por Calígula, o Senado se calou. Quando o juiz moderno decide que apenas uma mão pode tocar nos intocáveis, o povo se cala"

Não era um ato de humor, tampouco de loucura aleatória. Era gesto de poder. Era o triunfo da vontade imperial sobre a razão pública.

Ao colocar Incitatus, seu cavalo, entre os homens mais ilustres de Roma, Calígula não desprezava apenas o Senado: desafiava o próprio conceito de responsabilidade. Um cavalo, afinal, não vota, não discute, não critica. E era precisamente disso que o imperador precisava: silêncio submisso sob o disfarce da legalidade.

Séculos depois, sem cascos nem relinchos, a cena se repete: não no mármore do Fórum, mas sob as colunas modernas de outro templo, o do poder supremo. Um homem togado, com voz rouca e pena rápida, determina, sozinho, que somente uma figura específica pode pedir o julgamento daqueles que vestem a mesma toga que ele.

"Sim, eu determino que somente fulano pode me julgar, segundo os critérios que eu mesmo dito."

Pobre Brasil, essa Zumbilândia.

Não se nomeia um cavalo. Mas se consagra o silêncio. E se transforma o contraditório em ameaça.

Na democracia, dizem os homens prudentes, é necessário que o poder seja vigiado, não por desconfiança pessoal, mas por reconhecimento da natureza humana, sempre inclinada à expansão de seus próprios limites.

Roma o soube tarde demais.

E o mundo grego, que amava a palavra livre, jamais cessou de advertir: quando a cidade se curva ao oráculo de um só, a justiça se converte em oráculo, não em lei.

Sócrates, em sua defesa perante os juízes de Atenas, não rogou por piedade. Pediu apenas que a cidade continuasse amando o exame, o logos, e não as sombras da autoridade. Foi, contudo, condenado.

Seu erro? Ter exigido que os detentores do poder justificassem suas verdades. Ter sugerido que a justiça não nasce da posição, mas da razão.

O que se vê, então, no gesto moderno de limitar quem pode questionar os deuses togados, é a mesma inquietante tentação do império: preservar-se não pela virtude, mas pela blindagem. Os sacerdotes da justiça passam a escrever seus próprios cânticos e proíbem outros de interpretá-los.

A tragédia não é nova. O brasileiro médio é trouxa por natureza...

Édipo, quando cegou a si mesmo, não o fez por ter visto demais, mas por não ter querido ver antes. A polis, quando se entrega ao encantamento do poder absoluto, prefere a cegueira voluntária à luz perturbadora da crítica. E aquele que ousa perguntar (como perguntava Antígona, como indagava Diógenes) torna-se ameaça à ordem estabelecida.

Mas que ordem é essa que não suporta ser interrogada?

A verdadeira ordem política não teme a palavra, pois sabe que sua força reside na aletheia, na desocultação. A falsa ordem, ao contrário, refugia-se na autoridade inquestionável e transforma a lei em escudo; não da justiça, mas de si mesma.

Assim, quando o cavalo foi nomeado cônsul, o Senado se calou.

Quando o juiz moderno decide que apenas uma mão pode tocar nos intocáveis, o povo se cala. E o silêncio, mais uma vez, não é paz, é aviso.

Estamos avisados...