- Esta é o quarto capítulo de 7 capítulos programados. O título original é "A pós-verdade na OAB-RS: um desafio à transparência, representatividade e eficácia. Por que a OAB-RS precisa renovar ?"
O autor João Darzone é advogado e escritor.
A divulgação do termo "pós-verdade" como a palavra do ano pelo Dicionário Oxford em 2016 trouxe à luz um fenômeno cada vez mais comum na esfera política e social. Caracterizada por circunstâncias em que fatos objetivos têm menos influência na formação da opinião pública do que apelos à emoção e crenças pessoais, a pós-verdade se manifesta de maneira preocupante na atuação da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Rio Grande do Sul (OAB-RS).
A gestão atual da OAB-RS tem se limitado a emitir notas de repúdio, sem tomar ações concretas em debates cruciais. Temas represados como a não apreciação do pedido de abertura da Comissão de Liberdade de Expressão e Liberdade de Imprensa, bem como uma pauta exclusiva da Justiça Digital, e a falta de autorização para criar uma comissão especial sobre o porte de arma são alguns exemplos dessa inércia.
Além disso, a opacidade nas decisões é alarmante. As atas do Conselho Federal e da Seccional não são públicas, impedindo o acesso às decisões tomadas. Essa falta de transparência compromete a representatividade e a confiança na instituição.
A perpetuação de pessoas nas mesmas posições de poder dentro da OAB-RS é outro problema que demanda atenção. É necessário rediscutir mecanismos que permitam a alternância de poder na gestão, incluindo o debate sobre a reeleição, para promover a oxigenação dos quadros da instituição.
O recente Plano de Recuperação Financeira da OAB-RS, apresentado como solução para auxiliar advogados e estagiários com débitos ou necessidade de auxílio financeiro, revela-se insuficiente e inadequado, especialmente para aqueles atingidos por calamidades, como as recentes enchentes.
O plano prevê o parcelamento de débitos em até 36 vezes sem juros, além de isenções de multas eleitorais e moratórias. Contudo, essas medidas são limitadas e não atendem às reais necessidades dos profissionais em situação de vulnerabilidade financeira. A falta de transparência nas condições de empréstimos, como taxas de juros e critérios de concessão, gera desconfiança entre os advogados.
O discurso do atual presidente da OAB-RS exemplifica perfeitamente o fenômeno da pós-verdade. Durante a abertura oficial da Cidade da Advocacia 2024, o presidente declarou: "Com a força da advocacia, vamos reconstruir o Estado". Esta afirmação se insere claramente no contexto da pós-verdade, onde a retórica emotiva supera a realidade factual.
Na pós-verdade, como observa Orlandi (2012), mais do que interpretar e significar o acontecimento, cria-se uma versão que o sujeito tende a interpretar como verdadeira, independentemente de evidências científicas. Este gesto interpretativo é possibilitado pela fluidez e instabilidade da informação no mundo contemporâneo.
O discurso do presidente é notadamente populista e distante da realidade. Embora a advocacia desempenhe um papel importante na sociedade, como reconhecido pelo Art. 133 da Constituição Federal, ela não é o elemento direcionador capaz de ditar os rumos da sociedade de forma unilateral. A declaração se mostra como uma retórica vazia, desprovida de ação efetiva e desconectada das complexidades reais envolvidas na reconstrução de um Estado.
Esta abordagem não só valida informações potencialmente inverossímeis, mas também serve para distinguir os sujeitos no espectro político, criando uma falsa dicotomia entre aqueles que "acreditam" na força da advocacia e aqueles que não o fazem. Tal discurso simplifica excessivamente os desafios enfrentados pela sociedade e pela própria classe advocatícia, desviando a atenção de problemas reais e ações concretas necessárias.