Uma chance para o Rio Grande
Os mais jovens certamente não se lembram, e alguns dos
mais antigos fingem não lembrar. No ano de 2002, o Rio Grande do Sul vivia uma
eleição de vida ou morte, para definir a sucessão do desastroso governo petista
da época, que endividou o Estado, mandou a Ford embora, perseguia judicialmente
jornalistas, mantinha relações pérfidas com a contravenção e usava sua poderosa
máquina de moer reputações para destruir adversários e aliados. Ciente do mal que o governo petista fazia às
finanças e ao futuro do Estado, Brizola surpreendeu a muitos quando conduziu o
PDT a apoiar a candidatura de Antonio Britto, então no PPS, o homem que havia
privatizado a CRT, criada justamente por Brizola quando governador. Como o estadista que era, Brizola fez a
leitura do tempo histórico e compreendeu que o que estava em jogo era a
permanência de um projeto de poder perdulário, autocrático e ruinoso para o Rio
Grande.
Mais de quinze anos depois, o Rio Grande vive um novo
ciclo de preocupação. Depois do governo Tarso Genro solapar as finanças
gaúchas, oferecendo generosas isenções fiscais que seu partido hoje finge
combater e ter transformado o Badesul num clube de amigos, o Estado não tem
recursos para investimentos, atrasa salários, descumpre repasses com hospitais,
e por isso o governo apresentou um plano de Recuperação Fiscal que, sim, possui
medidas amargas e que nenhum governante gostaria de aplicar. Dentre elas, a venda de estatais que provocou
a compreensível reação adversa de muitos deputados, entre eles companheiros do
Trabalhismo, advogando a defesa do futuro dos trabalhadores. Ocorre que o
Trabalhismo, conforme preconizado por Pasqualini, nunca defendeu apenas o
trabalhador do setor público, mas também o da iniciativa privada, no campo e na
cidade. E o colapso estrutural do Rio Grande do Sul causaria prejuízos a todos
os trabalhadores gaúchos, sem exceção, como já vem acontecendo. Que o digam os municípios gaúchos, que tem de
assumir diversos serviços de competência estadual sem a devida contrapartida em
recursos. Como prefeito já na quarta gestão, posso assegurar que este é um dos
contextos mais graves já vividos pelas municipalidades.
A renúncia a futuras ações de cobrança de dívidas contra
a União, sem dúvida, é um ingrediente controverso, felizmente sanado por
recente decisão da Ministra Carmem Lúcia no STF. O Trabalhismo, como idéia
generosa e norteadora de defesa da soberania, não deveria alinhar-se com a
defesa dos super-salários da deficitária CEEE, onde os dez maiores
contracheques somam, juntos, mais de R$ 600 mil mensais, e um engenheiro pode
receber, num mês, até R$ 80 mil. Não há professor ou médico da rede estadual
que tenha salário semelhante.
Brizola, quando teve oportunidade, mostrou que, às vezes,
o segredo é desfazer paradigmas do passado para construir um novo rumo. O
Trabalhismo precisa compreender o momento histórico sem perder a essência:
defender o Rio Grande hoje, para que amanhã o trabalhador gaúcho possa ter um
futuro.
Rossano Dotto Gonçalves
Prefeito de São Gabriel RS