Título original: "Empulhação - J.R. GUZZO
Não adianta chamar o Exército e deixar a lei ao lado dos
criminosos
O Comandante Militar do Leste, General Braga Netto,
durante entrevista coletiva sobre o decreto de intervenção no Estado do Rio de
Janeiro - 16/02/2018 (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
As Forças Armadas, com o Exército à frente, são a
organização mais respeitada do Brasil. Dão de 10 a 0 no Supremo Tribunal
Federal, no Ministério Público, nos juízes que ganham o “auxílio-moradia”, na
mídia e no Congresso Nacional. Ganham de longe de qualquer organização civil ─
sindicatos, empresas estatais ou privadas, confederações disso ou daquilo,
clubes de futebol, OABs e similares. É melhor nem falar, então, da Igreja
Católica e das CNBBs da vida ─ e muito menos desses lúgubres “movimentos
sociais”, entidades de “minorias” e outros parasitas que vivem às custas do
Tesouro Nacional. Enfim, as Forças Armadas têm mais prestigio que qualquer
outra coisa organizada que exista neste país. Militar não rouba. Militar não
falta ao serviço. Militar não é nomeado por político. É exatamente por essas
razões ─ por ter nome limpo na praça, e valer mais aos olhos do público do que
todos os três poderes juntos ─ que o Exército foi chamado para defender um Rio
de Janeiro invadido, tomado e governado na prática por um exército de ocupação
de criminosos. Mas é só por isso, e por nada mais: o governo chamou os
militares, porque esta é a única maneira de tentar mostrar à população que está
“fazendo alguma coisa” contra a derrota humilhante que lhe foi imposta pelos
bandidos. O Exército não pode derrotar o crime no Rio de Janeiro. Nenhum
exército foi feito para isso, em nenhum lugar do mundo. Pode haver algum alívio
durante um certo tempo, mas depois a tropa tem de sair ─ e aí o crime volta a
mandar, porque é o crime, e não o governo e sua polícia, quem manda no Rio de
Janeiro.
O governo Michel Temer, no caso, é culpado por empulhação
─ mas só por empulhação. Pela situação do crime no Brasil, com seus 60.000
assassinatos por ano, recordes de roubos, estupros e violência em massa, e a
entrega da segunda maior cidade do país à bandidagem, as responsabilidades vão
muito além. A culpa pelo desastre, na verdade, é conjunta ─ o que não quer
dizer, de jeito nenhum, que ela é dos cidadãos. Ela é de todos os que têm algum
meio concreto de influir na questão e não fazem o seu dever. Como é possível
enfrentar a sério o crime se temos leis, um sistema Judiciário e agentes do
Estado que protegem ativamente os criminosos? Afinal, do jeito em que está a
ordem pública no Brasil, eles têm praticamente o direito de cometer crimes. A
maior parte da mídia mantém uma postura de hostilidade aberta à polícia ─ nada
parece excitar tanto o fervor do noticiário do que as denúncias contra a
“violência policial”. Obedece, ao mesmo tempo, a mandamentos de simpatia e
compreensão perante os criminosos, sempre tratados apenas como “suspeitos”,
vítimas da situação “social” e portadores prioritários de direitos. A maior
parte dos 800.000 advogados do país é contra qualquer alteração que torne menos
escandalosa a proteção e garantias fornecidas ao crime pelas leis atualmente em
vigor. Policiais são assassinados em meio à mais completa indiferença ─
policial bom é policial morto, parecem pensar governo, oposição e quem está no
meio dos dois. Os bispos, as ONGs, as entidades de defesa dos direitos humanos,
as variadas “anistias” internacionais que andam por aí, as classes
intelectuais, procuradores, juízes, políticos e mais uma manada de gente boa
são terminantemente contra a repressão ao crime. Punição, segundo eles, “não
resolve”. Sua proposta é esperarmos até o Brasil atingir o nível educacional,
cultural e social da Noruega ─ aí sim, o problema estará resolvido.
A jornalista Dora Kramer, na sua coluna da última edição
de VEJA, escreveu o que está para ser dito há muito tempo e ninguém diz: a
cidade do Rio de Janeiro vive, hoje em dia, como se estivesse ocupada por uma
tropa de invasão nazista. Nem mais nem menos. Um invasor do país tem de ser
combatido com guerra, e não com decretos, criação de “ministérios de segurança”
e a intervenção de um Exército que é mandado à frente de combate com as mãos
amarradas. Não tem estratégia clara. Não tem missão definida. Não tem a
proteção da lei. Não tem o direito de usar suas armas dentro da finalidade para
a qual elas foram projetadas e construídas. Não tem meios adequados sequer para
proteger os seus próprios soldados ─ muito menos, então, para atacar o inimigo.
Enquanto for assim, o Rio continuará entregue aos invasores.