Nota do MP de SC

 “Ministério Público requer levantamento do sigilo do vídeo de audiência de instrução e julgamento para esclarecer informações inverídicas apresentadas por veículo de imprensa no caso Mariana Ferrer


Ao longo de todo o processo, o Ministério Público tem respeitado, como não poderia deixar de ser, o sigilo conferido por lei às questões envolvendo crimes contra a dignidade sexual. O vídeo que está circulando nos meios de comunicação e nas redes sociais não condiz com a realidade; foi editado de modo a sonegar as intervenções realizadas pelo Promotor de Justiça, pelo Magistrado e pelo assistente de acusação em favor de Mariana.


O Ministério Público de Santa Catarina reafirma sua solidariedade a Mariana Ferrer e reitera que os Promotores de Justiça que atuaram no caso adotaram, ao longo de todo o processo, os necessários respeito e sensibilidade que a questão exigia, a fim de evitar qualquer possibilidade de revitimização ou ofensa à intimidade da vida privada da vítima.


Ao longo de todo o processo, o Ministério Público tem respeitado, como não poderia deixar de ser, o sigilo conferido por lei às questões envolvendo crimes contra a dignidade sexual, o que impede a Instituição de divulgar detalhes sobre o processo ou, ainda, a íntegra do vídeo da audiência de instrução e julgamento.


É imprescindível esclarecer, entretanto, que a audiência de oitiva de Mariana durou cerca de três horas e, justamente com o objetivo de resguardar sua integridade em um momento tão sensível, o ato foi realizado em dois dias distintos.


As perguntas feitas pelo Promotor de Justiça a Mariana atentaram aos princípios de acolhimento e respeito que devem pautar a atuação das partes no Sistema de Justiça, especialmente em se tratando de delitos dessa espécie.


No primeiro momento em que o advogado de defesa adotou atitude desrespeitosa em relação a Mariana, o Promotor de Justiça interveio para que ela não fosse exposta a situação de constrangimento. Além dessa manifestação, a íntegra do vídeo apresenta inúmeras outras interrupções promovidas pelo Promotor de Justiça, pelo defensor público que atuava como assistente de acusação e pelo Juiz, presidente do ato, inclusive nos momentos que foram editados para, propositalmente, excluir as intervenções realizadas em favor de Mariana.


O Ministério Público reitera seu repúdio à atitude do advogado e ressalta que a exploração de aspectos pessoais da vida de vítimas de crimes sexuais não pode, em hipótese alguma, ser utilizada para descredenciar a versão fornecida por ela aos fatos.


É absolutamente lamentável que esse tipo de argumento ainda seja apresentado por defensores e essa postura é amplamente combatida pelo Ministério Público de Santa Catarina, inclusive por meio de programas institucionais de apoio especializado às vítimas de violência. Entretanto, uma alteração legislativa promovida no Código de Processo Penal passou a permitir que as perguntas sejam formuladas diretamente à testemunha (art. 212) e, como é do conhecimento de todos, diversas iniciativas legislativas têm buscado responsabilizar Promotores de Justiça e Juízes por abuso de autoridade sob o fundamento de cerceamento de defesa dos acusados, o que representa flagrante retrocesso à garantia de uma atuação firme e contundente na defesa da vítima e da sociedade pelo Ministério Público.


Por fim, o Ministério Público de Santa Catarina lamenta o fato de instituições e integrantes do Sistema de Justiça terem adotado juízo de valor precipitado sobre os fatos, especialmente a partir de reportagem jornalística com informações inverídicas e sem conhecimento das provas constantes do processo, fato que tomou repercussões ainda maiores diante da impossibilidade legal de divulgação da íntegra das informações.


O site The Intercept Brasil, por sua vez, alterou sua versão após nota oficial do MPSC e após veículos jornalísticos, formadores de opinião e influenciadores terem demonstrado nas redes sociais que as informações veiculadas pelo site estavam equivocadas. Publicou uma nota no fim da reportagem sobre o caso reconhecendo que havia utilizado de forma imprecisa a expressão “estupro culposo”, tipo penal que não existe no ordenamento jurídico, sob o argumento de artifício usual ao jornalismo para tornar o processo mais acessível ao público. O que ocorreu, no entanto, foi a difusão proposital da desinformação em um ambiente que todos sabemos ser propício para a propagação de informações sem a devida e necessária checagem de sua veracidade.


Diante desse contexto, o Promotor de Justiça Thiago Carriço de Oliveira requereu ao Poder Judiciário o levantamento do sigilo do vídeo da instrução criminal, a fim de que os órgãos de controle possam ter acesso à integra do ato processual e, com base nessas informações, avaliar adequadamente a postura adotada, de modo que a garantia do sigilo, que é justificada na preservação da vítima, não inviabilize o direito à informação da sociedade, sem edições ou manipulações.”