A carta de Pedro Parente


Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
Quando Vossa Excelência me estendeu o honroso convite para ser presidente da Petrobras, conversamos longamente sobre a minha visão de como poderia trabalhar para recuperar a empresa, que passava por graves dificuldades, sem aportes de capital do Tesouro, que na ocasião se mencionava ser indispensável e da ordem de dezenas de bilhões de reais. Vossa Excelência concordou inteiramente com a minha visão e me concedeu a autonomia necessária para levar a cabo tão difícil missão.
Durante o período em que fui presidente da empresa, contei com o pleno apoio de seu Conselho. A trajetória da Petrobras nesse período foi acompanhada de perto pela imprensa, pela opinião pública, e por seus investidores e acionistas. Os resultados obtidos revelam o acerto do conjunto das medidas que adotamos, que vão muito além da política de preços.
Faço um julgamento sereno de meu desempenho, e me sinto autorizado a dizer que o que prometi, foi entregue, graças ao trabalho abnegado de um time de executivos, gerentes e o apoio de uma grande parte da força de trabalho da empresa, sempre, repito, com o decidido apoio de seu Conselho.
A Petrobras é hoje uma empresa com reputação recuperada, indicadores de segurança em linha com as melhores empresas do setor, resultados financeiros muito positivos, como demonstrado pelo último resultado divulgado, dívida em franca trajetória de redução e um planejamento estratégico que tem se mostrado capaz de fazer a empresa investir de forma responsável e duradoura, gerando empregos e riqueza para o nosso país. E isso tudo sem qualquer aporte de capital do Tesouro Nacional, conforme nossa conversa inicial. Me parece, assim, que as bases de uma trajetória virtuosa para a Petrobras estão lançadas.
A greve dos caminhoneiros e suas graves consequências para a vida do País desencadearam um intenso e por vezes emocional debate sobre as origens dessa crise e colocaram a política de preços da Petrobras sob intenso questionamento. Poucos conseguem enxergar que ela reflete choques que alcançaram a economia global, com seus efeitos no País. Movimentos na cotação do petróleo e do câmbio elevaram os preços dos derivados, magnificaram as distorções de tributação no setor e levaram o governo a buscar alternativas para a solução da greve, definindo-se pela concessão de subvenção ao consumidor de diesel.
Tenho refletido muito sobre tudo o que aconteceu. Está claro, Sr. Presidente, que novas discussões serão necessárias. E, diante deste quadro fica claro que a minha permanência na presidencia da Petrobras deixou de ser positiva e de contribuir para a construção das alternativas que o governo tem pela frente. Sempre procurei demonstrar, em minha trajetória na vida pública que, acima de tudo, meu compromisso é com o bem público. Não tenho qualquer apego a cargos ou posições e não serei um empecilho para que essas alternativas sejam discutidas.
Sendo assim, por meio desta carta, apresento meu pedido de demissão do cargo de Presidente da Petrobras, em caráter irrevogável e irretratável. Coloco-me à disposição para fazer a transição pelo período necessário para aquele que vier a me substituir.
Vossa Excelência tem sido impecável na visão de gestão profissional da Petrobras. Permita-me, Sr. Presidente, registrar a minha sugestão de que, para continuar com essa histórica contribuição para a empresa — que foi nesse período gerida sem qualquer interferência política — Vossa Excelência se apoie nas regras corporativas, que tanto foram aperfeiçoadas nesses dois anos, e na contribuição do Conselho de Administração para a escolha do novo presidente da Petrobras.
A poucos brasileiros foi dada a honra de presidir a Petrobras. Tenho plena consciência disso e sou muito grato a que, por um período de dois anos, essa honra única me tenha sido conferida por Vossa Excelência.
Quero finalmente registrar o meu agradecimento ao Conselho de Administração, meus colegas da Diretoria Executiva, minha equipe de apoio direto, os demais gestores da empresa e toda força de trabalho que fazem a Petrobras ser a grande empresa que é, orgulho de todos os brasileiros.
Respeitosamente,
Pedro Parente”

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https://youtu.be/QwE4-TszEyQ

Artigo, Guilherme Villela, Zero Hora - Um rei fraco faz fraca a forte gente


                              A asserção do título acima pode ser encontrada na estrofe 138 do canto 3º de "Os Lusíadas", de Camões (1524-1579). Nos líricos sentimentos do poeta, aquela épica narração envolve acontecimentos enaltecidos pela grandeza histórica, heroica e nacional. Celebra, com realismo descritivo, fatos patrióticos, batalhas vencidas; o fascinante calor das altas cortes e as virtudes dos governantes e da lusitana gente – que parece nascer e gravitar, a vida inteira, em torno de um poder eminente, singular e qualificado; de um ente notável, que põe e dispõe, que a tudo provê, como se fora uma inesgotável fonte do poder: o sólido Estado português.
                               Depois Antero de Quental, no século 19, mostrou razões históricas para explicar o modo de pensar e o de agir das sociedades ibéricas. Acontecimentos distantes, diz, iriam impregnar o comportamento social dos povos português e do além-mar. E não se lhe escapou dizer que junto à conduta autoritária do governo, neles "persiste a inércia política das populações, a necessidade, e o gosto que as governem".                   
                               Aqui um pouco de luz na discussão sobre os conflitos e as contradições por que passa o Estado e a sociedade brasileiros. Não não se trata de considerar a fatalidade de um determinismo histórico na trajetória dos povos em questão. Entretanto, o que se observa, no caso brasileiro, é a existência de um descompasso entre as instituições estatais, sem que se vislumbre alguma harmonia patrocinada por arte e engenho políticos.                           
                               Aqui se chega ao núcleo da questão: a realidade social brasileira vem se modificando com maior rapidez do que as instituições estatais – e os governos vêm se mostrando incapazes de formular e executar planos exequíveis para o desenvolvimento e o progresso exigidos por uma sociedade que deseja se modernizar.
                               Ainda diante desse contexto, o que se observa hoje é uma sociedade à espera de um governo que a governe. Um governo forte. É sua origem histórica que fala alto. E nesse caso é bom escutar e refletir.
              
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