Artigo, Tito Guarniere - O golpe do "golpe"


Certas esquerdas têm para si que o futuro lhes pertence. E não só o futuro, como se pode ver pela proliferação, nas universidades públicas, das “disciplinas” que têm como tema o “golpe de 2016”. As instalações, a estrutura escolar, a própria escola pública também lhes pertencem, de tal sorte que, para elas é perfeitamente natural que utilizem todo esse aparato para fazer proselitismo político e ideológico.

Críticos severos do Golpe Militar, não lhes constrange, entretanto, o fato de que nem os militares no poder ousaram lançar mão de um tal instrumento para justificar a intervenção de 1964, ou para convencer os jovens universitários da correção dos seus propósitos ou dos seus projetos e das suas realizações.

Fazem-no em nome da “autonomia universitária”. Porém a tal não chega o conceito. A autonomia da universidade não diz respeito nem alcança o uso de prédios e recursos públicos, de professores pagos com dinheiro público para fazer propaganda política ou difundir a versão única, pronta e acabada de uma facção, um partido. Escola não é palanque partidário por conta do dinheiro do contribuinte.

A disciplina, criada originalmente na Universidade de Brasília, pelo professor catarinense Luiz Felipe Miguel, já rasga a bandeira e diz a que vem no título: “Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”. Eis alguns dos módulos do "curso": “Lulismo e a promoção da paz social”; “Resistência popular e as eleições de 2018”; “O PT e o pacto lulista”; “(...) Restabelecimento do Estado de direito”; “Investigar a agenda de retrocessos do governo Temer”. E vai por aí nessa toada.

E o que diz o professor Miguel? Que a disciplina vai ser desenvolvida “sem qualquer dogmatismo”. Ah, bom! Imagine-se como seria o curso, se com esses títulos, ainda estivesse impregnado de dogmatismo!

Notem que o professor propõe o tema do “restabelecimento do Estado de direito”. Quer dizer, o sujeito abre uma disciplina em universidade do Estado, que ataca frontalmente o governo vigente, classificando-o como golpista, dizendo-o ilegítimo. Sabe q ue não será perseguido, não será preso, continuará recebendo religiosamente a sua (boa) remuneração, não será impedido de rezar a sua cartilha política, inclusive em instalações da universidade pública. Se é preciso restabelecer o Estado de direito, em um país onde o professor Miguel pode fazer livremente todas essas coisas, o que vem a ser, então, o Estado de direito?

A iniciativa desses cursos têm merecido a repulsa da mídia e dos jornalistas. Foi assim com Veja e Folha de São Paulo. Foi assim com articulistas como Hélio Schwartsman e Demétrio Magnoli. Mas todos eles condenaram a atitude do ministro da Educação, Mendonça Filho, de representar junto ao Ministério Público Federal e outros organismos para que apurem possível violação da lei de improbidade administrativa - fazer proselitismo político-ideológico em uma instituição pública de ensino. O ministro sabe muito bem que não vai dar em nada. Mas marcou a posição: teve ciência de uma ação ilegal em área de seu ministério e tomou a providência que lhe cabe. É preciso torturar os fatos para achar que isso é censura.

titoguarniere@terra.com.br

Artigo, Astor Wartchow - Germinação


      Muito além da exploração tributária, a população é tão “escravizada” pelo estado brasileiro de modo que nunca soube e nem aprendeu a “caminhar” com os próprios pés e cabeça, salvo raros exemplos.
      Qualquer idéia e ação inovadora não prosperam livremente se não obtiverem a autorização e participação estatal. Há milhares de amarras legais e convencionais que determinam esta limitação.
      Mas, admitamos, é também uma dependência sócio-cultural. E isto explica o mofado discurso que se repete a cada eleição. Indistintamente, todos os candidatos e partidos prometem ações estatais que viriam a transformar a nação.  
      É como se toda a sociedade brasileira fosse uma criança e adolescente inconseqüente e incapaz, que sempre dependesse de estímulos e aprovações materno-paternais.
      Nossa história é abundante em exemplos de governos e lideranças que usaram e abusaram do discurso e prática da dependência estatal. E em torno deste hábito se criou um emaranhado sistema de corporações, leis, normas e tributos que nos submetem a uma “escravidão eterna”. 
      Concomitante, entre paliativos de todas as naturezas, ainda que alguns bem intencionados, outros nem tanto, empresas públicas “brás” disto e daquilo,  e refrões patriótico-nacionalistas, a verdade é que não superamos questões e demandas básicas.
      Alias, nacionalismo e patriotismo são o último refúgio dos canalhas, na frase do pensador inglês Samuel Johnson (também dizem ser frase de Millôr Fernandes). Mas, aqui entre nós é o primeiro refúgio, à direita e à esquerda.
      Retórica que não supera nem resolve os fatos. Subdesenvolvimento sócio-econômico. Insegurança pessoal  e patrimonial. Corrupção generalizada e sistêmica.  Vias e sistemas de transporte coletivo e de cargas precários e limitados. Por todos os lados impera a limitação. O embaraço legal e formal. 
      Em resumo e perversamente, “criar dificuldades para vender facilidades” é o mantra estatal. Ou seja, leis e normas em profusão e suas vigilantes corporações reafirmam a cada dia nosso estado de escravidão legislativo-tributária.
      Nas próximas eleições muitos partidos e candidatos se apresentarão como novidade. Como aqueles que não têm nada a ver com isto tudo que está aí. Será? O que nos oferecerão como novidade? Mais estado, menos estado? Mais governo, menos governo? Mais impostos, menos impostos?
        Em sendo nossa nação profundamente desigual, em que áreas deveremos ser/ter mais estado?  E onde menos estado e mais sociedade? Ou será a sociedade menos capaz do que o estado na superação das desigualdades?  
      Mas se até aqui o poder de estado tem produzido pouco e mal, que novo modelo de estado seria este? Ou é o caso de um novo modelo de sociedade? Vá pensando,  as eleições estão próximas. Ou vamos adiar novamente?