PELEGO!
Adão Paiani*
Nasci e fui criado numa família trabalhista; com foto de
Getúlio em lugar de destaque na sala, e outras de Jango e Brizola espalhadas
pela casa. E sempre soube que “pelego” era a pior coisa que se podia dizer de alguém.
Quase tão ruim como “dedo duro” ou “alcagüete”, que é praticamente a mesma
coisa.
Minha avó de adoção, uma negra de origem yorubá, gostava
de política. E me ensinou a gostar também, a ter opinião própria e não ter
medo, desde que me conheci por gente. Minha mãe não gostava. Depois do que
havia acontecido com meu pai, dizia que tinha de criar um filho sozinha, e não
podia se “meter a besta”.
Como tinha que ser, estudava numa escola pública. Um
colégio mantido pela Brigada, que é como se chama a Policia Militar no RS. Uma
vez, lá por 72/73, tinha meus 8/9 anos, na “Semana da Brigada Militar”, houve
um concurso de desenhos. Os alunos tinham que desenhar o trabalho dos
“brigadianos”. As crianças desenharam o que se esperava: um policial prendendo
um bandido, outro ajudando uma velhinha a atravessar a rua, ou controlando o
trânsito. Mas quem disse que eu era normal?
Desenhei várias pessoas de punhos erguidos e levando
faixas onde se lia “Anistia para Leonel Brizola”, e os brigadianos batendo. A
mãe foi chamada na escola. Queriam saber de onde eu tinha tirado aquilo. Nunca
esqueci a expressão de temor e constrangimento dela, ao me levar pela mão, em
silêncio, de volta pra casa naquele dia. Devia pensar “É bem filho do pai dele
mesmo!”.
Fiz esse longo preâmbulo para chegar ao que interessa. Já
no final dos anos ‘70, ouvia falar que o tal de “Lula” era uma cria dos milicos
– mais precisamente de um tal General Golbery - para tirar espaço do verdadeiro
líder da oposição ao regime militar, que era Leonel de Moura Brizola.
A história me perseguiu por vários anos, sempre com
detalhes mais ou menos sórdidos, até que em finais dos anos ‘90 escutei a mesma
coisa, com detalhes muito precisos, de uma fonte insuspeita: meu amigo Jair
Krischke, o mito, advogado defensor dos direitos humanos no Brasil e na América
Latina durante os “anos de chumbo”. Um homem que jamais poderia ser acusado de
pertencer à direita.
Jair contava a história com detalhes e convicção de quem
tinha conhecimento dos fatos. O PT nunca o perdoou por falar essa e outras
verdades, apesar dele haver livrado muitos de seus dirigentes históricos da
cadeia durante a repressão.
A informação de que Lula esteve na “folha de pagamento”
da Odebrecht por pelo menos 37 anos, vendendo o controle de greves ao patriarca
da empreiteira, Norberto, a exemplo do que já fazia com as montadoras de
veículos quando no controle do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, agora se vê,
é compatível com sua trajetória, e tudo que já se falava dele dentro da própria
esquerda e do movimento sindical.
O ladrão de hoje sempre existiu. E já estava lá, naqueles
primeiros anos, escondido atrás do sindicalista arrivista, vulgar, amante da
boa vida, e pelego.
Demorei 40 anos para ter a convicção de chamar Lula
daquilo que ele sempre foi: pelego. Tempo demais. Era só ter olhado com
atenção, à época, as fotos de sua prisão pelo DOPS, Elas falam por si mesmas. O
grande “líder sindical” e “defensor” da classe trabalhadora, na verdade nunca
passou de um reles, abjeto e desprezível pelego. Nada mais do que isso. Pelego!
*Adão Paiani é advogado em Brasília/DF.