EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA ___ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO FORO CENTRAL DA COMARCA DE PORTO ALEGRE - RS.
URGENTE!
COM PEDIDO CAUTELAR!
FÁBIO MAIA OSTERMANN , brasileiro, solteiro, agente político, portador do CPF n° 009.099.990-82 e do título de eleitor nº 084018730493, com endereço profissional à Praça Marechal Deodoro 101, Gabinete 805, Centro Histórico,
Porto Alegre - RS, CEP 90.010-300, e-mail fabio.ostermann@al.rs.gov.br; GIUSEPPE RICARDO MENEGHETTI RIESGO, brasileiro, solteiro, agente político, portador do CPF nº 030.947.520-12 e do título de eleitor nº 107232450469, com endereço profissional à Praça Marechal Deodoro 101, Gabinete 806, Centro Histórico,
Porto Alegre - RS, CEP 90.010-300, e-mail giuseppe.riesgo@al.rs.gov.br, e; MARCEL VAN HATTEM, brasileiro, solteiro, agente político, CPF nº 007.313.020-60 e do título de eleitor nº 087634350400, com endereço na Esplanada dos Ministérios, Câmara dos Deputados, Anexo IV, Gabinete 958, Brasília - DF, CEP 70.160-900, e-mail dep.marcelvanha em@camara.leg.br, vêm, perante Vossa Excelência, por intermédio de seu procurador e, com fundamento no art. 5º, LXXIII, da Constituição da República, e na Lei nº 4.717/1965, propor a presente:
AÇÃO POPULAR
contra EDUARDO FIGUEIREDO CAVALHEIRO LEITE, brasileiro, solteiro, bacharel em Direito, portador do CPF nº 010.947.750-29 e do RG nº 1060265855 SSP/RS, com endereço à Rua Gonçalves Chaves, 4351, Centro, Pelotas RS, CEP 96.015-560, e; ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, pessoa jurídica de direito público interno, registrada no CNPJ nº 87.934.675/0001-96, que pode ser citada através de seu Procurador-Geral, com endereço à Av. Borges de Medeiros, 1555, Térreo, 16º, 17º e 18º Andares, Centro, Porto Alegre – RS, CEP 90.110-901, com e-mail gabinete@pge.rs.gov.br, pelos fatos e fundamentos jurídicos que passa a expor:
I
DA LEGITIMIDADE
A Constituição da República, em seu art. 5º, LXXIII,
reconhece a qualquer cidadão a legitimidade “para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural (...)”. Em sintonia com
o referido comando constitucional, a Lei nº 4.717/65 também legitima qualquer cidadão a pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos à Administração Pública, bastando que, para tanto, faça-se prova da cidadania mediante apresentação do título eleitoral ou da documentação correspondente (art.
1º, §4º, da Lei nº 4.717/65).
Os documentos acostados aos autos atestam a condição
necessária à propositura da demanda. De todo modo, é evidente que os requerentes, na qualidade de parlamentares (federais, estaduais e municipais) e no gozo pleno de seus direitos políticos, têm plena legitimidade para figurar no polo ativo deste feito. A ação popular é instrumento constitucional reservado à cidadania, destinando-se a resguardar o patrimônio público e a moralidade administrativa . E essa é também uma missão tipicamente parlamentar. Por isso, a legitimidade ativa ad causam resta,
aqui, inclusive reforçada.
No que concerne à legitimidade passiva, cuida-se de
observar o disposto no caput do art. 6º da Lei nº 4.717/65, que assim reza:
A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.
Note-se que as hipóteses de composição do polo passivo
não se limitam à inclusão daqueles que tenham se beneficiado diretamente do ato lesivo, mas também daqueles que o tenham autorizado, aprovado, ratificado e praticado, além daqueles que, por omissão, tenham dado oportunidade à lesão. Aqui, como se trata de um ato administrativo complexo e praticado, em última instância, pelo Poder Executivo, cabe a inclusão do Estado do Rio Grande do Sul no
2. A Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu art. 5º, LXXIII, que "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência". Tal ação é regulada pela Lei 4.717/65, recepcionada pela Carta Magna.
(...)
4. Segundo a doutrina, o direito do cidadão de promover a ação popular constitui um direito político fundamental, da mesma natureza de outros direitos políticos previstos na Constituição Federal. Caracteriza, a ação popular, um instrumento que garante à coletividade a oportunidade de fiscalizar os atos praticados pelos governantes, de modo a poder impugnar qualquer medida tomada que cause danos à sociedade como um todo, ou seja, visa a proteger direitos transindividuais. Não pode, por conseguinte, o exercício desse direito sofrer restrições, isto é, não se pode admitir a criação de entraves que venham a inibir a atuação do cidadão na proteção de interesses que dizem respeito a toda a coletividade.
(...)
(CC 47.950/DF, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/04/2007, DJ
07/05/2007, p. 252), grifos nossos.
polo passivo da demanda. Como o beneficiário direto é o ex-governador Eduardo Leite e como se formula, ao fim, pedido para a devolução dos valores pagos, a sua
inclusão no polo passivo também é indispensável.
II.
DOS ANTECEDENTES
No âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a Lei
Estadual nº 7.285/1979 conferiu aos ex-governadores o direito a subsídio mensal e
vitalício, nos termos da seguinte redação original:
Art. 1º - Ao ex-Governador do Estado, que haja exercido o cargo em caráter permanente, fica assegurado um subsídio, mensal e vitalício, a título de representação, igual ao vencimento do Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado.
Parágrafo único - O exercício de cargo ou função pública, assim como emprego em sociedade de economia mista, empresas públicas ou entidades com participação majoritária da União, dos Estados ou dos Municípios, é causa impeditiva ou suspensiva da percepção do subsídio (grifos nossos).
A lei sofreu duas alterações ao longo de mais de 40 anos. A primeira foi operada pela Lei Estadual nº 10.548/95, que, no que é essencial, possibilitou a concessão proporcional do subsídio, de acordo com o tempo em que o ex-governador exerceu efetivamente o cargo. Nesse sentido, com a entrada em vigor da modificação legal do ano de 1995, assim ficou a redação do art. 1º da Lei Estadual
nº 7.285/79:
Art. 1º - Ao ex-governador do Estado, que haja exercido o cargo em caráter permanente, fica assegurado um subsídio, mensal e vitalício, a título de representação, igual ao vencimento do Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado, de acordo com a proporcionalidade temporal em que exerceu efetivamente o cargo.
§ 1º - A percepção de remuneração referente a exercício de cargo ou função pública, assim como de emprego em sociedade de economia mista, empresas públicas ou entidades com participação majoritária da União, dos Estados ou municípios e ainda, relativa a proventos ou aposentadoria, destes decorrentes, não é cumulável com o direito assegurado no "caput", facultada a opção.
§ 2º - Para efeitos deste artigo considerar-se-á que o cumprimento do tempo integral do mandato corresponde a
100% (cem por cento) da remuneração a que se refere.
A segunda alteração foi efetivada pela Lei Estadual nº 14.800/2015. Em resumo, a lei introduziu uma modificação substancial e uma
cláusula temporal: (1) eliminou a vitaliciedade do subsídio, estabelecendo o limite de 04 anos, contados imediatamente após o término do mandato, impedindo, por
conseguinte, a transmissão da “pensão” aos beneficiários legais; e (2) determinou que
os seus efeitos somente se aplicariam a partir de 01º de janeiro de 2019.
Como consequência prática, o último ex-governador que
receberia o benefício vitaliciamente, nos termos da redação dada pela Lei nº 10.548/95, viria a ser José Ivo Sartori, governador do Estado entre 2015 e 2019. Segue
a redação do caput do art. 1º da Lei Estadual nº 7.285/79, de acordo com a
modificação aprovada em 2015:
Ao ex-Governador do Estado, que haja exercido o cargo em caráter permanente, fica assegurado um subsídio, mensal, a título de representação, igual ao vencimento de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado, limitado ao período de 4 (quatro) anos, imediatamente posterior ao término do mandato, de acordo com a proporcionalidade temporal em que exerceu efetivamente o cargo (grifos nossos).
E finalmente, com a aprovação do Projeto de Lei nº 482/2015 na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul e com a subsequente e recentíssima sanção do então Exmo Sr. Governador Eduardo Leite, entrou em vigor a Lei Estadual nº 15.678, de 13 de agosto de 2021, com sucinta e
indiscutível redação:
Art. 1º Fica revogada a Lei nº 7.285, de 23 de julho de 1979.
Portanto, desde 13 de agosto de 2021, não há mais no
Estado do Rio Grande do Sul legislação que ampare a concessão desse benefício!
III.
DO ATO LESIVO
A) DO PAGAMENTO DE PENSÃO ESPECIAL AO EX-GOVERNADOR EDUARDO LEITE
Conforme demonstra o Portal da Transparência do Estado
e a imagem a seguir (extraída do próprio portal e de acordo o doc. anexo), o ex-governador Eduardo Leite pleiteou “pensão especial” e recebeu dos cofres
públicos o valor de R$ 39.993, 32 (valor líquido: R$ 29.864,52): R$ 20.314,07 a título de “pensão especial” e R$ 19.679,25 sob a rubrica “pensão especial (retroativo)”. Segue a imagem:
É inquestionável, portanto, que o ex-governador pleiteou
o recebimento do benefício e, como se nota, teve o pleito concedido e efetivamente pago (inclusive com montante retroativo), segundo a previsão constante no contracheque. É interessante notar que os dados do próprio Portal da Transparência indicam como “data de ingresso” 31/03/2022, exatamente a data em que, como é amplamente notório, Eduardo Leite renunciou ao cargo, data, em palavras muito
simples, em que o então governador se tornou ex-governador.
E por que isso é fundamental? Ora, porque o então
governador só adquiriria efetivamente o direito a essa pensão quando se tornasse ex-governador, quando preenchesse todas as condições para a perfectibilização do benefício. Em outras palavras: não é que o governador “vá adquirindo” o direito à pensão na medida em que “vá avançando” no mandato. Ele só adquire realmente o
direito quando preenche todos os requisitos: tornar-se ex-governador é, nessa linha, a
condição essencial! Antes disso, tudo o que o Governador possuía era uma
expectativa de direito. Nada mais!
O problema é que, no caso do então Governador Eduardo Leite, essa expectativa foi fulminada em 13 de agosto de 2021, quando entrou em vigor a Lei Estadual nº 15.678/2021, a norma revogadora da pensão especial. A
situação pode ser ilustrada da seguinte maneira:
a) entre janeiro de 2019 (início do mandato do então Governador Eduardo Leite) e 13 de agosto de 2021 (data da entrada em vigor da lei revogadora da pensão) - o então Governador detém MERA EXPECTATIVA DE DIREITO em relação à pensão concedida aos
ex-governadores;
b) 13 de agosto de 2021 (entrada em vigor da lei revogadora
da pensão) - TERMINA A EXPECTATIVA DE DIREITO;
c) a partir de 31 de março de 2022 (renúncia do Governador; momento em que se torna, portanto, ex-governador) - NÃO HÁ DIREITO ALGUM À PENSÃO ESPECIAL!
Convém relembrar o teor da lei revogada. Trata-se do
caput do art. 1º da Lei nº 7.285/1979, com a redação que lhe dera a Lei nº 14.800/2015:
Ao ex-Governador do Estado, que haja exercido o cargo em caráter permanente, fica assegurado um subsídio, mensal, a título de representação, igual ao vencimento de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado, limitado ao período de 4 (quatro) anos, imediatamente posterior ao término do mandato, de acordo com a proporcionalidade temporal em que exerceu efetivamente o cargo (grifos nossos).
Que se leve a sério ao menos o texto: “Ao ex-governador,
que “haja exercido…”. Como é óbvio, o direito é concedido àquele que tenha alcançado a condição de ex-governador. No caso do Sr. Eduardo Leite, isso
efetivamente ocorreu em 31/03/2022. Mas quando isso ocorreu, é importante reiterar, já não havia lei prevendo o benefício. Ele já havia perdido, desde a revogação da
norma, a própria expectativa.
Veja-se que a proporcionalidade de que fala o “caput” tem
relação com o valor da pensão: o ex-governador receberá uma pensão de acordo com o tempo de efetivo exercício. Assim, se o mandato for interrompido antes do período normal de 04 anos para o qual o mandatário foi eleito, o cálculo do benefício será feito proporcionalmente. Isso é nítido e não há necessidade de argumentar muito
mais para demonstrá-lo.
O problema é que a Procuradoria-Geral do Estado, no Parecer nº 18.915, de 19 de agosto de 2021, reconhece a possibilidade de recebimento do benefício também ao Sr. Eduardo Leite, fazendo uma construção hermenêutica, data venia, constrangedora: o benefício teria sido adquirido proporcionalmente, em consideração ao tempo de vigência da norma, isto é, entre 01º de janeiro de 2019 (início do mandato) e 13 de agosto de 2021 (entrada em vigor da lei revogadora). Ora, a PGE/RS retirou a proporcionalidade do âmbito do cálculo do benefício e a levou
para o âmbito do tempo de vigência da norma instituidora do benefício.
Trata-se de uma interpretação realmente criativa, mas que
deve ser rechaçada por este Juízo com efetiva veemência, inclusive em consideração a toda a tradição jurisprudencial e administrativa, especialmente das normas relativas à previdência, em que sempre houve a aplicação da distinção entre expectativa de
direito e direito adquirido.
A pergunta é: QUE PENSIONISTA NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL obteve esse tipo de interpretação benevolente? A QUE PENSIONISTA SE EXCLUIU a categoria jurídica da MERA EXPECTATIVA DE DIREITO?
É injustificável que o ex-governador Eduardo Leite seja
tratado como uma espécie de pensionista sui generis, sujeito a regras especiais e excepcionais, ao arrepio de uma das mais assentadas e indiscutíveis compreensões
jurisprudenciais pátrias.
Aqui, há, pois, lesão clara ao erário. É óbvio que a lesão ao
erário, em termos legais, não decorre simplesmente da despesa, do dispêndio de recursos públicos, ainda que se pudesse aqui - com toda a legitimidade - discorrer sobre as combalidas finanças do Estado, ano após ano tendo de cobrir despesas absolutamente injustificadas. A “pensão” dos ex-governadores é um exemplo cristalino disso! Mas não se trata, aqui, de um juízo político ou moral sobre o destino dos recursos, algo que suscita divergências naturais e próprias do mundo político. É preciso respeitar o sentido do termo ato lesivo, tal e como previsto na Lei da Ação
Popular (Lei nº 4.717/65).
É sabido que, no campo da ação popular e em consonância
com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (a exemplo do REsp 1447237/MG3), é imprescindível a comprovação do binômio ilegalidade-lesividade. O ato não deve ser apenas lesivo4, mas ilegalmente lesivo. E este é exatamente o caso
aqui.
O pagamento reconhecido ao Sr. Eduardo Leite é
simplesmente ilegal. E essa é exatamente a situação abarcada pela Lei da Ação Popular, uma vez que a ilegalidade do objeto constitui uma das hipóteses de “atos
lesivos ao patrimônio” e passíveis de nulidade, nos termos que seguem:
Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência;
b) vício de forma;
c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos;
e) desvio de finalidade.
Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:
(...)
c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato
normativo;
3 ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. IRREGULARIDADES FORMAIS
AVERIGUADAS NO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO, QUE NÃO ENSEJARAM, CONTUDO,
DANO AO ERÁRIO (...).
(...)
5. Tem-se, dessa forma, como imprescindível a comprovação do binômio ilegalidade-lesividade, como pressuposto elementar para a procedência da Ação Popular e consequente condenação dos requeridos no ressarcimento ao erário em face dos prejuízos comprovadamente atestados ou nas perdas e danos correspondentes.
(...) (REsp 1447237/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 09/03/2015)
4 Note-se que “lesivo”, na compreensão do Supremo Tribunal Federal, não necessariamente significa “lesivo ao patrimônio público”; ou seja, a lesão pode ser simplesmente à moralidade administrativa, por exemplo. Aqui, conforme se demonstrará, houve lesão ao erário. De qualquer forma, a tese fixada no julgamento do ARE 824781 (Tema 836) é a seguinte: “Não é condição para o cabimento da ação popular a demonstração de prejuízo material aos cofres públicos, dado que o art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal estabelece que qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular e impugnar, ainda que separadamente, ato lesivo ao patrimônio material, moral, cultural ou histórico do Estado ou de entidade de que ele participe”.
d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; (...), grifos nossos.
Como consequência do reconhecimento da ilegalidade e
da lesividade ao erário, é imperioso reconhecer, ainda, a necessidade de reparação, isto é, a necessidade de devolução aos cofres públicos do valor recebido pelo réu Eduardo Leite. E não se diga, aplicando-se entendimento sedimentado e direcionado ao servidor que recebe em seu contracheque valor pago a maior pela Administração (por erro da Administração), que se trata de recebimento de boa-fé! Neste caso, o Sr. Eduardo Leite comandava, em última instância, a Procuradoria-Geral do Estado, órgão de advocacia do Governo Estadual, quando da edição do Parecer que, hoje, ampara-lhe a concessão desse benefício. Portanto, uma vez reconhecida a ilegalidade por este Juízo, deve ser simplesmente determinada a devolução dos
valores.
Ainda quanto ao escopo de tutela da ação popular, é
importante sublinhar que, além da lesividade ao erário, cuida-se de proteger também a moralidade administrativa. Neste caso, salta aos olhos a ausência da publicação da concessão da aposentadoria especial ao Ilustre ex-governador, nos termos da lei de
regência, no Diário Oficial do Estado. A publicidade dessa sorte de ato
administrativo é, inclusive, condição de validade do próprio ato, cujo caráter eventualmente sigiloso é, por óbvio, repelido pela nossa ordem jurídica. Nesse sentido, parece haver, em princípio, vício de publicidade com capacidade para
macular a higidez do próprio ato concessivo.
B) EXPECTATIVA DE DIREITO E DIREITO ADQUIRIDO
No que concerne ao centro da discussão, é manualesca a
distinção envolvendo o direito adquirido e a mera expectativa de direito, conforme
leciona, por exemplo e muito didaticamente, Rizzato Nunes:
“Direito adquirido, como o nome sugere, é o que já se incorporou definitivamente ao patrimônio e/ou à personalidade do sujeito de direito. Em outros termos, o direito torna-se adquirido por consequência concreta e direta da norma jurídica ou pela ocorrência, em conexão com a imputação normativa, de fato idôneo, que gera a incorporação ao patrimônio e/ou à personalidade do sujeito.
Diz respeito, portanto, a uma ocorrência real e concreta, diante de norma jurídica vigente em dado momento histórico. Esse direito adquirido, uma vez incorporado ao patrimônio e/ou à personalidade, não pode ser atingido por norma jurídica nova.
Por exemplo, uma lei garante aposentadoria por tempo de serviço ao trabalhador após 35 anos de serviços. Certo cidadão trabalhou 36 anos e ainda não se aposentou.
Requerendo ou não a aposentadoria, ele tem direito adquirido de se aposentar, pois já se verificou concretamente a hipótese legal para a aquisição do direito: o trabalho exercido por 35 anos.
Suponhamos que, após esse trabalhador ter adquirido o direito de se aposentar (que se incorporou à sua personalidade aos 35 anos de serviços), surja nova lei dizendo que a aposentadoria só será possível aos 40 anos de serviço efetivo. Nesse caso ele não seria atingido pela lei nova: pode simplesmente se aposentar.
Todavia, uma coisa é o direito adquirido, outra diferente é a expectativa de direito. Esta é a mera possibilidade de aquisição de direito, que, dependendo da implementação de certas circunstâncias, ainda não se consumou.
A expectativa, por mais legítima que possa ser, não tem garantia contra a lei nova. Tomemos o exemplo já citado, com a lei permitindo que o trabalhador se aposente após 35 anos de serviços. Suponhamos, agora, diferente: que o empregado tenha prestado serviços por 34 anos. Dir-se-á: ele ainda não pode aposentar-se, pois só terá direito (adquirido) de fazê-lo um ano depois (com 35 anos de trabalho).
Digamos que surja nesse interregno de um ano que lhe falta, uma nova lei que estipula a concessão da aposentadoria após 40 anos de serviço efetivo. Nesse caso, tal trabalhador não poderá aposentar-se. Ele ainda não tinha direito adquirido quando surgiu a lei nova, mas tão somente expectativa de direito.
De fato, o evento pode ser doloroso, mas a verdade é que esse trabalhador não tem proteção contra a lei nova (é por isso que em casos de alterações de leis desse tipo - aposentadoria adquirida por tempo de serviço - a boa técnica manda que se coloque a lei nova em vigor somente após alguns anos ou que a lei nova assegure certos direitos - proporcionais, por exemplo - para aqueles que ainda estavam na expectativa)” (grifos nossos).
Trata-se de lição ensinada aos que iniciam o estudo do
direito, tamanha não só a sua importância, mas o seu caráter básico, presente, como se sabe, na própria Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). O então Governador Eduardo Leite, enquanto exercia o seu mandato, não possuía nenhuma proteção contra a lei nova, pois ele ainda não havia adquirido direito algum; ele possuía a expectativa de adquiri-lo quando se tornasse ex-governador. Pois bem.
A lei nova surgiu (como muitas leis novas surgiram em
relação às pensões de incontáveis cidadãos do país) e a sua expectativa simplesmente caiu! A partir de 13 de agosto de 2021 ele não passou a ter nem mesmo expectativa,
imagine reconhecer ao ex-governador esse direito a partir da renúncia ao mandato!
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido e aplicado essa distinção (ressalte-se: especialmente nos temas que envolvem a previdência pública e privada) de modo uníssono e pacífico, há muitos anos, em tradição que não pode ser abrupta e injustificadamente rompida, muito menos por quem tem o dever de zelar pelo princípio da legalidade. A Administração Pública, e especialmente o órgão
responsável pela Advocacia do Estado, tem esse dever!
Segue, por exemplo, entendimento sedimentado no Superior Tribunal de Justiça sobre as relações entre direito adquirido e expectativa de
direito aplicável ao campo da aposentadoria suplementar, a saber:
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. ALEGAÇÃO DE CONTRADIÇÃO. PRETENSÃO DE FAZER INCIDIR AS NORMAS REGULAMENTARES VIGENTES NA DATA DA ADESÃO. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA. REGULAMENTO DA ÉPOCA DO
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO BENEFÍCIO.
INCIDÊNCIA. POSICIONAMENTO PACÍFICO DO STJ, FIRMADO, INCLUSIVE, EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
1. De acordo com o posicionamento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, o participante de plano de previdência privada não possui direito adquirido, mas mera expectativa de direito à aplicação das regras de concessão da aposentadoria suplementar quando de sua admissão ao plano, sendo apenas assegurada a incidência das disposições regulamentares vigentes na data em que cumprir todos os requisitos exigidos para obtenção do benefício, tornando-o elegível. 2. Operada transação sobre a qual não há qualquer eiva de nulidade (cuja declaração dá-se pela via própria da ação anulatória), improcede a pretensão de aplicar o regulamento do plano de benefícios primitivo, que não rege, na atualidade, a relação contratual previdenciária mantida entre as partes (ut AgRg no AREsp
504.022/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA
SEÇÃO, julgado em 10/09/2014, DJe 30/09/2014).
3. Insurgência específica em relação apenas a dois dos beneficiários/demandantes, devidamente especificadas.
4. Agravo interno improvido.
(AgInt nos EDcl nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 739.857/SE, relator
Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em
22/3/2021, DJe de 25/3/2021., grifos nossos)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. ESTATUTO DA CAPAF. ISENÇÃO DE
CONTRIBUIÇÃO. DATA DA ADESÃO. NORMA REGULAMENTAR.
VIGÊNCIA. REVOGAÇÃO. DIREITO ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA.
REQUISITOS DO BENEFÍCIO. PREENCHIMENTO.
REGULAMENTO VIGENTE. INCIDÊNCIA. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL.
1. O prazo prescricional da pretensão que discute direitos advindos da previdência complementar é quinquenal, mesmo na égide do Código Civil de 1916, e não vintenário, sendo inaplicável à hipótese o art. 177 do CC/1916 (Súmulas nºs 291 e 427/STJ). Isso porque incidem as normas dos arts. 178, § 10, II, do CC/1916 e 103 da Lei nº 8.213/1991, c/c o art. 36 da Lei nº 6.435/1977 ou art. 75 da Lei Complementar nº
109/2001.
2. Não há falar em direito adquirido, mas em mera expectativa de direito do participante, à aplicação das regras de concessão da aposentadoria suplementar quando de sua admissão ao plano, sendo apenas assegurada a incidência das disposições regulamentares vigentes na data em que cumprir todos os requisitos exigidos para obtenção do benefício, tornando-o elegível.
3. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp n. 1.430.712/GO, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 21/2/2017, DJe de 24/2/2017., grifos nossos).
Veja-se, por exemplo, a Súmula 340 do STJ: “ A lei
aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado.” Ou mesmo na simples e já clássica ideia de que não existe direito adquirido a determinado regime jurídico (Ver, por exemplo, o Tema 0070 STF, embora essa questão, com a devida venia, dispense referências). Ora, qual o novo regime jurídico a que estava submetido o Governador a partir de 13 de agosto de 2021? Um regime jurídico sem pensão especial! Para que ele tivesse algum direito, a
lei revogadora deveria tê-lo resguardado.
Ora, pense-se, por exemplo, no caso da possibilidade de
conversão em pecúnia de licença-prêmio. Imagine-se a hipótese de um servidor que,
passados 4 anos e 9 meses de prestação ininterrupta de serviço público (e
presumindo-se que o prazo para aquisição da licença seja de 05 anos), veja sobrevir uma lei que simplesmente revoga o benefício, antes da sua implementação, antes da sua incorporação ao patrimônio jurídico desse mesmo servidor. Terá ele direito à indenização pela licença proporcional sem que a lei revogadora tenha instituído
qualquer espécie de mecanismo de transição?
A resposta é evidentemente negativa! Todos os tribunais
reconheceriam que o que existia, neste caso, era a mera expectativa de direito! NADA MAIS! Analogamente, o mesmo raciocínio se aplica ao Sr. Eduardo Leite.
O cálculo proporcional feito pela PGE/RS ignora a
jurisprudência dos tribunais superiores e aplica a uma situação de concessão de pensão um critério de proporcionalidade em consideração ao tempo de vigência da norma revogada! A ousadia hermenêutica, neste caso, certamente ultrapassou os limites da própria prudência. A PGE/RS outorgou ao curto espaço de tempo em que o Sr. Eduardo Leite deteve mera expectativa de direito a dignidade de um verdadeiro
direito adquirido.
C) A JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA E SEDIMENTADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE A
INCONSTITUCIONALIDADE DA PENSÃO ESPECIAL PARA EX-GOVERNADORES
Embora este Juízo não tenha necessidade de fazer nenhum
pronunciamento constitucional preliminar, dada a nitidez da ilegalidade praticada
pelo Estado do Rio Grande do Sul e ante o benefício ilícito percebido pelo
ex-governador Eduardo Leite, é oportuno reiterar o entendimento da Suprema Corte
sobre a higidez jurídica dessa pensão.
Todas as vezes que o Supremo Tribunal Federal foi
provocado a se posicionar sobre esse tipo de pensão especial, concedida não só no Rio Grande do Sul, mas também em outros estados, a ex-governadores, ratificou, com veemência, a sua inconstitucionalidade. É possível sustentar, sem nenhuma necessidade de matização, que a Corte Suprema formou expressiva doutrina sobre essa temática, aplicável indistintamente a qualquer norma de qualquer estado da
federação.
Seguem alguns exemplos, todos com as mesmas
características, as mesmas propriedades, a demonstrar - de modo absolutamente
indiscutível - a posição da mais alta Corte do país sobre o assunto:
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PENSÃO VITALÍCIA
PARA EX-GOVERNADORES DO ESTADO DE SERGIPE (ART. 263 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL). DESEQUIPARAÇÃO SEM FUNDAMENTO CONSTITUCIONALMENTE LEGÍTIMO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE, REPUBLICANO E DEMOCRÁTICO. INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES. 1. O benefício instituído pela norma impugnada – subsídio mensal e vitalício para ex-governadores, igual aos vencimentos do cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça – é pago sem qualquer justificativa constitucionalmente legítima, representando inequívoca violação aos princípios da igualdade, republicano e democrático, consoante firme jurisprudência desta Corte. Precedentes: ADI-MC 4.552, Rel. Min. Cármen Lúcia; ADI 3.853, Rel. Min. Cármen Lúcia; SS 3.242, Rel. Min. Ellen Gracie; RE 252.352, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; ADI 1.461, Rel. Min. Maurício Corrêa. 2. A continuidade do pagamento inconstitucional desse subsídio mensal e vitalício a ex-detentor de cargo eletivo traduz-se também em grave lesão à economia pública, já que não há qualquer contraprestação de serviço público por parte do beneficiado. 3. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga procedente.
(ADI 4544, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-189
DIVULG 10-09-2018 PUBLIC 11-09-2018), grifos nossos.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ARTIGO 1º DA LEI 4.586/1983. DIREITO PRÉ-CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME EM SEDE DE AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 1º, PARTE FINAL, DA EMENDA CONSTITUCIONAL 22/2003 DO ESTADO DO MATO GROSSO. MANUTENÇÃO DO PAGAMENTO DE PENSÃO
VITALÍCIA A EX-GOVERNADORES, EX-VICE-GOVERNADORES E SUBSTITUTOS CONSTITUCIONAIS QUE PERCEBIAM O BENEFÍCIO À ÉPOCA DE SUA EXTINÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS FEDERATIVO, REPUBLICANO, DA IMPESSOALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. DIREITO ADQUIRIDO A REGIME JURÍDICO. INEXISTÊNCIA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA PARTE, JULGADO PROCEDENTE O
PEDIDO. 1. O artigo 1º da Emenda Constitucional 22/2003 do Estado do Mato Grosso, ao prever que deve ser “respeitado o disposto no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal”, permitiu a continuidade do pagamento de subsídio mensal e vitalício a ex-governadores, ex-vice-governadores e substitutos que percebiam o benefício à época de sua extinção. 2. O direito adquirido é inoponível à Constituição quando nela se encontra interditado, posto eclipsado em alegado regime jurídico imutável, mormente quando o regime jurídico que se pretende ver preservado não encontra guarida na Constituição Federal. 3. A manutenção do pagamento de prestação pecuniária mensal e vitalícia a ex-governadores extrapola o poder constituinte derivado, violando o princípio federativo, além de não se compatibilizar com os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa. 4. O princípio republicano apresenta conteúdo contrário à prática do patrimonialismo na relação entre os agentes do Estado e a coisa pública, o que se verifica no caso sub examine. 5. O princípio da igualdade veda a instituição de tratamento privilegiado sem motivo razoável, tal qual o estabelecido em proveito de quem não mais exerce função pública ou presta qualquer serviço à Administração Pública. Precedentes: ADI 4.552-MC, Rel. Min. Cármen Lúcia, Plenário, DJe de 9/6/2015; ADI 3853, Rel. Min. Cármen Lúcia, Plenário, DJe de 26/10/2007; e ADI 3.418, Rel. Min. Dias Toffoli, Plenário, julgamento em 20/09/2018. 6. O artigo 1º da Lei 4.586/1983 do Estado do Mato Grosso é direito pré-constitucional, insuscetível de figurar como objeto de ação direta de inconstitucionalidade. Precedentes: ADI 2, Rel. Min. Paulo Brossard, Plenário, DJ de 21/11/1997; ADI 74, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, DJ de 25/9/1992; e ADI 129, Rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ de 4/9/1992. 7. Ação direta parcialmente conhecida, para, nessa parte, julgar procedente o pedido, para dar interpretação conforme a Constituição Federal ao artigo 1º, parte final, da Emenda Constitucional 22/2003 do Estado do Mato Grosso e declarar que o trecho “respeitado o disposto no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal” não autoriza a continuidade do pagamento de pensão mensal e vitalícia aos ex-governadores, ex-vice-governadores e substitutos constitucionais.
(ADI 4601, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em
25/10/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-236 DIVULG 06-11-2018
PUBLIC 07-11-2018), grifos nossos.
Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 85, §5º, da Constituição do Estado do Paraná. “Subsídio” mensal e vitalício a ex-governador que tenha exercido o cargo em caráter permanente. Aditamento à inicial. Dispositivos da legislação estadual (artigos 1º e 2º da Lei n. 13.426/2002, artigo 1º da Lei nº 16.656/2010). Inconstitucionalidade por arrastamento. Previsão de transferência do benefício ao cônjuge supérstite. Pensão. Precedentes do STF. Não devolução das verbas de caráter alimentar recebidas de boa-fé, tutela da confiança justificada dos cidadãos. Precedentes do STF. Ação direta julgada parcialmente procedente. 1. Revogação de ato normativo objeto de contestação de ação constitucional com o objetivo de fraudar o exercício da jurisdição constitucional ou cujo processo já tenha sido liberado para pauta de julgamento do Plenário não implica a necessária situação de perda superveniente de objeto. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. 2. O Supremo Tribunal Federal definiu interpretação jurídica, na formação de precedentes, no sentido de que a instituição de prestação pecuniária mensal e vitalícia a ex-governadores, designada “subsídio”, corresponde à concessão de benesse que não se compatibiliza com a Constituição Federal (notadamente com o princípio republicano e o princípio da igualdade, consectário daquele), por configurar tratamento diferenciado e privilegiado sem fundamento jurídico razoável, em favor de quem não exerce função pública ou presta qualquer serviço à administração. 2. Precedentes: ADI nº 4.544, Rel. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe de 13/06/2018, ADI nº 3.418, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, DJe de 20/09/2018,
ADI nº 4.601, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe de 25/10/2018,
ADI nº 4.169, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe de 25/10/2018, ADI nº 4.552-MC, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 9/6/15; ADI nº 3.853, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 26/10/07, ADI nº 1.461, Rel. Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, DJe de 22/08/1997. 3. Inconstitucionalidade por arrastamento: art. 1º da Lei Estadual 13.426/2002 e art. 1º da Lei Estadual 16.656/2010 quanto à pensão das viúvas de ex-governadores, com vinculação de valor.
Exclusão do art. 2º da Lei 13.426/2002, por impertinente. (...)
(ADI 4545, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em
05/12/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-085 DIVULG 06-04-2020
PUBLIC 07-04-2020), grifos nossos.
É importante reiterar: não se está discutindo neste feito a
constitucionalidade e tampouco a imoralidade deste benefício. O objeto da demanda é a antijuridicidade da concessão de pensão especial para quem tinha apenas uma expectativa de direito antes da revogação do benefício. Não integra o objeto desta demanda a discussão sobre a figura da pensão ou aposentadoria especial em si! De todo modo, é oportuno ressaltar que o Supremo Tribunal Federal vem considerando a pensão em si, pelo seu caráter de privilégio antirrepublicano, absolutamente
inconstitucional.
IV.
DO PEDIDO CAUTELAR
Tendo em vista o preenchimento dos requisitos do art. 300
do Código de Processo Civil, é o caso de concessão de medida cautelar para determinar que o Estado do Rio Grande do Sul suspenda qualquer pagamento
dirigido ao Sr. Eduardo Figueiredo Cavalheiro Leite a título de “pensão especial”, com base na Lei nº 7.285/1979. Trata-se de medida indispensável à proteção ao erário e à moralidade administrativa até que sobrevenha o julgamento definitivo do feito. A verossimilhança do direito alegado está mais do que comprovada, além, obviamente, do periculum in mora. Não há nenhuma razão para manter o Sr. Eduardo Cavalheiro
Figueiredo Leite recebendo esses valores.
Convém reiterar: não se trata da preservação de verba
alimentar de um servidor público. Trata-se de benefício concedido ao ex-governador Eduardo Leite, com base em heterodoxo parecer da Procuradoria-Geral do Estado, cuja chefia integra o Gabinete do Governador, exarado ainda durante o mandato do Sr. Eduardo Leite. Em palavras singelas: a perpetuação da ilegalidade precisa ser interrompida imediatamente.
V.
DO PEDIDO
Diante do exposto, REQUEREM:
a) o recebimento e o processamento da presente petição inicial;
b) a concessão da medida liminar, inaudita altera pars, determinando-se a imediata suspensão dos pagamentos relativos à “pensão especial” ao réu
Eduardo Figueiredo Cavalheiro Leite;
c) a observância do disposto no art. 10 da Lei nº 4.717/65;
d) a citação dos réus para, querendo, apresentar contestação;
e) a intimação do Ministério Público para manifestação e ciência do feito, em observância ao art. 6º, §4º, da Lei nº 4.717/65;
f) a procedência total dos pedidos para (i) reconhecer a ilegalidade do pagamento de “pensão especial”, ancorada na Lei Estadual nº 7.285/1979, ao Sr. Eduardo Figueiredo Cavalheiro Leite; (ii) determinando-se, em consequência, que o Estado do Rio Grande do Sul se abstenha de efetuar qualquer pagamento nesse sentido; (iii) determinando-se, por fim, a devolução de todo e qualquer valor eventualmente já recebido pelo réu Eduardo Figueiredo Cavalheiro Leite;
g) subsidiariamente, diante, salvo melhor juízo, da ausência de identificação da publicação do ato administrativo concessivo da pensão no Diário Oficial do Estado, o reconhecimento da nulidade do ato;
h) a condenação dos réus ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios.
Protesta pela produção de todas as provas em direito
admitidas, em especial a documental.
Atribui-se à causa o valor de R$ 39.993,32
Nestes termos, pede deferimento.
Porto Alegre, 15 de junho de 2022.
Ricardo Munarski Jobim