Empresas de mídia enxugam gelo

De 2012 até este mês, pelo menos 1.590 jornalistas perderam o emprego nas grandes redações, 180 só este ano, segundo um levantamento do Volt Data Lab, uma agência de jornalismo de dados.  O total de demitidos nas empresas de mídia (considerando outras funções) chega a 5.572 no período.

São números grandes para um mercado relativamente pequeno, em que os profissionais muitas vezes se conhecem.

O jornalista Sergio Spagnuolo, fundador do Volt, nota que existe uma completa falta de informações e banco de dados por parte dos sindicatos e federações do setor. Por isso, ele baseou sua contagem nas notícias de veículos especializados na cobertura da imprensa, como o Comunique-se, o Portal dos Jornalistas e o Portal Imprensa, que registram principalmente as demissões em massa e incluem jornalistas que trabalham como pessoas jurídicas. (A planilha com todos os dados pode ser acessada aqui.)

O resultado pode ser considerado um piso das demissões ocorridas nas redações, pois só capta as dispensas que causaram mais repercussão.

Já combalidas por um problema estrutural que está longe de ser equacionado – como manter um jornal viável competindo com o conteúdo grátis (nem sempre de qualidade) na internet? – as redações tomaram outra rasteira com a queda da receita publicitária em meio à maior recessão brasileira desde os anos 30.  Quando a margem aperta, a reação-reflexo das empresas é demitir, num fenômeno muito parecido com enxugar gelo.

De tão frequentes no jornalismo, as demissões carregam há décadas um apelido ‘carinhoso': o ‘passaralho’.   Reza a lenda que o termo foi cunhado nos anos 60, na redação do extinto Jornal do Brasil, mas nos últimos anos a ave agourenta sobrevoa as redações com cada vez mais frequência.

Os relatos de novas contratações em grandes jornais, revistas ou portais são raros; geralmente, as empresas demitem profissionais mais experientes (e caros) e contratam os mais jovens (e baratos).

Segundo o levantamento do Volt, a redação que mais encolheu desde 2012 foi a da Editora Abril, com 177 jornalistas demitidos.

Não é uma surpresa. O grupo vem colecionando prejuízos: em 2014 foram R$ 139 milhões, seguidos de outros R$ 209 milhões no ano passado. O patrimônio líquido está negativo: os passivos superam os ativos em R$ 257 milhões.

Para tentar estancar a sangria, a empresa vendeu 17 títulos nos últimos dois anos, e outros três para os quais a Abril tinha licença, incluindo a Playboy, foram descontinuados.

Estadão, Infoglobo e Folha também demitiram quase 100 jornalistas cada um nos últimos quatro anos e meio.

No ano passado, o ‘Brasil Econômico’ fechou as portas. No diário popular carioca ‘O Dia’, também houve dispensas. Alguns salários chegaram a atrasar quatro meses e os funcionários fizeram greve. Ambos os jornais pertencem à Ejesa, cohttp://www.braziljournal.com/demissoes-no-jornalismo-ja-sao-noticia-velhantrolada pela empresa portuguesa Ongoing.

Também no Rio, o mais antigo jornal em circulação ininterrupta na América Latina, o ‘Jornal do Commercio’, parou de circular em abril.  Fundado em 1827, o ‘JC' integrava o Grupo Diários Associados desde 1959. (A edição online e o ‘Diário Mercantil’, parte do mesmo grupo, também fecharam as portas, custando o emprego de 24 jornalistas.)

Como se vê, a maioria esmagadora das demissões acontece na chamada ‘velha mídia’— jornais e revistas impressos em papel.

Nos últimos anos, a produção de conteúdo jornalístico tem se pulverizado com o surgimento de novos veículos online como o site jurídico Jota e o Nexo Jornal, cada um com cerca de 15 jornalistas, mas a observação empírica sugere que os novos empregos gerados nem de longe compensam as vagas fechadas na velha imprensa.

E o cenário para os próximos meses não traz alento. As redações esperam novos ‘passaralhos’ com o fim dos grandes eventos esportivos no Brasil.


Apesar do cenário desalentador, os ideais do jornalismo e seu papel na sociedade (fiscalizar o Poder, derrubar os corruptos e, mais recentemente, comentar a última dieta da Beyoncé) continuam a inspirar os jovens. No vestibular da Fuvest este ano, houve cerca de 2.000 candidatos para as 60 vagas, o mesmo número registrado em 2010.

CLIQUE AQUI para ler o original, com fotos.

Confira a íntegra do texto publicado hoje pela ANPR

Brasília (15/09/2016) - A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) vem a público repudiar a deturpação de alguns dos esclarecimentos prestados pelos Procuradores da República na Operação Lava Jato em entrevista coletiva concedida ontem, 14. Cumprindo legitimamente o dever e o direito de informar a população, a Força Tarefa Lava Jato tão somente apresentou a acusação contra o ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, dentre outros, como o fez em já numerosas outras ocasiões, sempre nos momentos nodais dos processos, nos quais se impõe o esclarecimento à opinião pública.
É sob o olhar de seu povo que se constrói um país realmente democrático. E para isso a liberdade de imprensa, o amplo acesso às informações e o livre debate público são essenciais. Entretanto, nesse contexto, não se configura legítima qualquer manipulação ou deturpação de frases ditas no exercício do dever de esclarecimento à população. Os procuradores da República foram didáticos e extensivos em sua exposição precisamente para que o entendimento da população sobre a denúncia fosse completo, podendo a partir daí terem o conhecimento para exercerem a cidadania e o senso crítico. Configura-se em discurso político e/ou em estratégia de defesa, sem compromisso com a verdade, deturpar falas dos Procuradores da República nesta ocasião.
Nenhuma verdade pode ser construída pela edição de frases e repetição de uma mentira. A convicção da Força Tarefa fundamenta-se em provas robustas reunidas em investigações sérias. Em mais de dois anos, atuaram na operação – sob as vistas e aplausos de todo o País – mais de 300 agentes públicos de diversos órgãos, especialmente do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e da Receita Federal, todos idôneos e sem qualquer vinculação partidária. A atividade da Lava Jato vem sendo exemplo cabal de cumprimento isento da lei.                                
O Ministério Público Federal, por seus treze Procuradores da República que assinam a acusação, apenas cumpriu sua obrigação constitucional. Em especial no que se refere ao crime de organização criminosa, é juridicamente correta – e necessária – a contextualização realizada na acusação, pois teve como objetivo ressaltar todas as provas levantadas, historicamente organizadas, de que Lula seria responsável pelos sete crimes de corrupção passiva e 64 crimes de lavagem de dinheiro descritos na denúncia. O fato do delito de organização criminosa estar em persecução junto ao Supremo Tribunal Federal em nada afasta a necessidade e a pertinência de sua exposição para que se compreenda o contexto do delito do qual acusado pela Força Tarefa.
A Força Tarefa apresentou as provas de autoria dos crimes que apontam, neste caso, para o pagamento de propina de mais de R$ 87 milhões pela empreiteira OAS a diversas pessoas e partidos. A corrupção política, com o poder econômico dela decorrente, deturpa a democracia pela subversão da necessária igualdade de oportunidade entre todos os atores políticos.
O trabalho desenvolvido pelos Procuradores da República na Operação Lava Jato é profissional, e republicano, além de submetido à contínua observância do devido processo legal, e estar sob supervisão do Poder Judiciário independente e técnico do País, em especial a 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, a quem cabe a análise do recebimento da denúncia.
José Robalinho Cavalcanti
Procurador Regional da República

Presidente da ANPR