TCE revela bagunça na gestão de medicamentos em Porto
Alegre
Relatório mostra irregularidades em licitações, compra de
remédios por valores exorbitantes e descontrole dos estoques entre 2013 e 2015
Uma esculhambação fiscal e administrativa, com prejuízo
aos cofres da Capital e aos pacientes do SUS, é revelada em uma minuciosa
auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE). No relatório de 251 páginas,
obtido com exclusividade pela coluna, os auditores analisam a gestão de
medicamentos e materiais hospitalares entre 2013 e 2015, durante o governo
Fortunati.
Resultado: irregularidades em licitações, compra de
remédios por valores exorbitantes, descontrole sobre a situação dos estoques,
falta de farmacêuticos e infraestrutura insuficiente.
O processo foi julgado pelo tribunal na quarta-feira
passada. Na decisão, o TCE determina que o atual gestor, o prefeito Nelson
Marchezan, apresente em 60 dias um plano de ação para sanar a bagunça. É tão
precário o armazenamento dos remédios – não há controle sequer sobre os prazos
de validade ou sobre o consumo mensal –, que um paciente conseguiria retirar o
mesmo medicamento em mais de uma unidade de saúde. Claro: como não há qualquer
informatização, não há também comunicação entre as unidades.
O que mais assusta são os valores que a prefeitura andou
gastando. Segundo os auditores do tribunal, eles representaram um prejuízo de
R$ 2,2 milhões em relação à média nacional. Em 2014, por exemplo, enquanto
Porto Alegre gastou R$ 0,42 por cápsula com o medicamento Gabapentina, o
governo do Estado desembolsou R$ 0,20 pelo mesmo produto. E, enquanto a Capital
pagou R$ 1,15 por comprido com o remédio Levodopa, o Consórcio do Vale do Caí
só despendeu R$ 0,69.
Mas e as licitações? Não servem justamente para
selecionar a oferta mais em conta? Sim, só que a administração municipal criou
um controverso dispositivo chamado "cadastro de marcas" – que,
conforme o TCE, é contra a lei.
Funciona assim: entre os requisitos necessários para um
laboratório apresentar sua proposta, é preciso que ele esteja em uma lista de
marcas previamente aprovadas pela Secretaria da Saúde. "A restrição à
oferta decorrente desta exigência importou na realização de contratações mais
onerosas (...), o que por sua vez diminui a capacidade do município de atender
à demanda de medicamentos da população", concluem os auditores no
relatório.
Outro problema sério é a ausência de técnicos e
farmacêuticos nas drogarias do município. Como a legislação exige a presença de
um técnico, o Hospital Presidente Vargas, por exemplo, não consegue obter
autorização do Conselho Regional de Farmácia para receber medicamentos dos
fornecedores. "A ausência de medicamentos (no Presidente Vargas) gerou a
necessidade de transferência de pacientes para outros hospitais", diz o
relatório.
Há uma série de outras deficiências, muitas "de
caráter histórico", conforme o conselheiro Cezar Miola, relator do
processo, enfatizou em seu voto. Secretário da Saúde até fevereiro de 2015,
Carlos Casartelli diz que precisa ter acesso ao relatório para se pronunciar
com detalhes. Mas adianta que o "cadastro de marcas" era realizado
apenas por servidores estatutários – técnicos da secretaria que, por meio de
testes, concluíam que alguns produtos não apresentavam o princípio ativo que o
medicamento deveria ter. Por isso, eram barrados das licitações.
Casartelli também afirma que coordenou um projeto de
reposição de farmacêuticos, atendendo às recomendações do Conselho Regional de
Farmácia.
– O controle de estoque, de fato, não é perfeito. A
Procempa não consegue dar conta da informatização e, infelizmente, é preciso
ter algumas prioridades – diz o ex-secretário.
A coluna não conseguiu contato com Fernando Ritter,
secretário da Saúde de março de 2015 até o final da gestão Fortunati.
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