Como em outros processos, prisão de Lula se inscreve na
plena normalidade republicana
Em meio às previsíveis manifestações de seus partidários
mais inconformados, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) preferiu não
cumprir o prazo que lhe foi concedido pelo juiz Sergio Moro para apresentar-se
à sede da Polícia Federal em Curitiba.
Sem constituir desobediência a ordem judicial, sua
atitude reflete um cálculo político que corresponde mais, nesta altura, à
expectativa da militância petista do que ao efeito que possa ter no conjunto da
opinião pública.
Ainda que sejam intensas e díspares as emoções que o fato
suscita, a prisão de Lula segue um protocolo republicano que transcende as
significações ideológicas e as paixões partidárias de que se tenta revesti-lo,
com doses negligenciáveis de provocação.
Não se sustenta, é óbvio, a versão lulista de que tudo se
reduz a uma perseguição política contra um líder de origem operária.
Também foram atingidos por decisões judiciais e ordens de
prisão, nestes anos de Lava Jato, figuras como Paulo Maluf, Eduardo Cunha,
Sérgio Cabral, Marcelo Odebrecht, Valdemar Costa Neto ou Geddel Vieira Lima, a
quem não se podem atribuir compromissos históricos com a luta sindical ou a
defesa dos excluídos.
Nem mesmo existe beneficiário claro, nos meios políticos
mais tradicionais, das ondas de combate à corrupção que produziram, nos últimos
anos, desalento e revolta no eleitorado nacional.
Tampouco é o caso de confundir a derrota judicial do
ex-presidente —fundamentada em provas consistentes de corrupção, condenações em
duas instâncias e habeas corpus negados nos tribunais superiores— com o
julgamento dos valores ideológicos que ele representou com destaque
indisputado.
De outro lado, o senso de irrealidade que se configura na
atitude dos lulistas encontra paralelo na euforia persecutória, claramente
seletiva, de setores que identificam nas bandeiras vermelhas e num
fantasmagórico comunismo as únicas origens da indecência nos costumes políticos
do país.
A disputa entre liberais e estatistas, entre
redistributivismo e competitividade, entre dispêndio e austeridade, se dá —e
continuará a dar-se, não importando os candidatos que se apresentem em outubro—
num campo distinto do que, agora, ocupa as emoções gerais.
A democracia, o debate, a alternância de poder prosseguem
e se aperfeiçoam quando a lei é respeitada e seus infratores, depois de
exercerem seu pleno direito de defesa, são punidos.
Afora uma pequena parcela de militantes, tomados pelo
inconformismo ou pelo ódio, a sociedade tem maturidade, e se mostra serena,
para resolver os seus conflitos e problemas. A corrupção é um deles —e o
progresso brasileiro, neste ponto, se confirma mais uma vez.
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