14/08/2016
Jornal o Estado de Minas
Envolvimento de políticos no esquema de desvios na Petrobras deve levar
a um maior índice de votos brancos e nulos
Brasília – A Operação Lava-Jato, desencadeada em março de 2014, vai
influenciar diretamente, sobretudo nos grandes colégios eleitorais, as eleições
municipais. Há dois anos, durante a corrida presidencial que reelegeu Dilma
Rousseff (PT), os efeitos foram bem menores porque os investigadores ainda não
tinham chegado diretamente ao chamado núcleo político do esquema. A conclusão é
de cientistas políticos. Eles acreditam que, agora, a operação pode levar a um
maior índice de votos brancos e nulos e até de abstenções por servir de combustível
para potencializar um descrédito histórico na classe política brasileira.
Apesar de envolver uma gama variada de partidos políticos, todos são enfáticos
em apontar o PT como o maior prejudicado pelos efeitos das investigações.
O professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de
Brasília (UnB) Paulo Calmon diz, porém, que é preciso levar em consideração as
especificidades de cada disputa eleitoral. “Há uma dúvida, no entanto, em
relação a essa influência no voto de cada eleição específica. Os efeitos, por
exemplo, podem ser ignorados na disputa no Recife ou em Curitiba porque ambos
os candidatos estão igualmente envolvidos, falando de maneira hipotética.”
Calmon acredita que a Lava-Jato será responsável por abrir uma grande
oportunidade para grupos que contestam a estrutura política atual no país.
“Obviamente, vai existir influência na medida em que boa parte da elite
política brasileira está diretamente envolvida em episódios relacionados de
alguma maneira à Lava-Jato. Seja envolvimento individual ou dos partidos, a
população está influenciada por essa marca de desconfiança do sistema político
e partidário. Afeta porque o prestígio dos partidos, e o político em geral,
está abalado”, diz. Ele faz uma leitura de que haverá uma potencialização da
descrença na classe política. “Acho que esse é um elemento que contribui para
desinteresse e descrença em relação aos políticos. E isso, inegavelmente,
fortalece a tendência das pessoas ignorarem a eleição. É muito ruim. Sobra para
todos os partidos, mas o PT será o mais afetado.”
IMAGEM O doutor em ciência política pela UnB Leonardo Barreto avalia
que o PT começou a pagar a conta da Lava-Jato antes mesmos das eleições. “A
operação já influenciou, a começar pela mudança da Presidência da República.
Agora, a expectativa é de que o candidato do PMDB ou apoiados pelo partido
possam ter vantagem por ter acesso a recursos que não tinham antes”, diz. Ele
analisa que o déficit de imagem do partido é grande e isso respinga em seus
candidatos. “A consequência direta é a redução do PT, que terá um déficit de
imagem importante, em algumas regiões mais e em outras menos. Uma quantidade
grande de petistas deixou o partido. A sigla começou a pagar a conta mesmo
antes de disputar o processo eleitoral”, avalia.
Barreto acrescenta que a Lava-Jato já produziu um fato importante para
as eleições. “Uma inferência indireta é que os desdobramentos da operação são
responsáveis por fazer o Supremo Tribunal Federal (STF) adotar postura
contrária ao financiamento privado de campanha. É sem dúvida um filhote da
Lava-Jato. A proibição do financiamento privado tem impacto grande nas
eleições. Vai valorizar aqueles que tentam a reeleição por ter a máquina
pública. Também valoriza os pastores e sindicalistas porque precisam de menos recursos”,
declarou. O cientista político avalia a apatia do eleitorado diante de tantas
denúncias contra políticos. “Não me surpreenderia se o número de brancos e
nulos aumentasse. Já temos uma base de desconfiança muito forte. Você já tem
consolidado um grau de abstenção e de votos brancos e nulos. É possível que se
tenha um incremento, mas é difícil de estimar.”
Em 2006, os efeitos do mensalão não foram suficientes para impedir a
reeleição do presidente Lula. A avaliação é de que a impressionante força política
do petista, na época, e um governo muito bem avaliado reduziram a quase nada os
desdobramentos do escândalo de compra de apoio parlamentar. Já os candidatos
proporcionais em 2006 citados na Operação Sanguessuga amargaram derrotas
políticas. Dos 64 deputados e três senadores que responderam a inquérito no
Supremo Tribunal Federal (STF) e foram candidatos, a grande maioria passou
longe do número necessário de votos para garantir o retorno. Apenas seis
citados no caso conseguiram se eleger.
A investigação do núcleo político da Lava-Jato começou em março de
2015, quando o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, apresentou 28
petições ao STF para a abertura de inquéritos criminais destinados a apurar
fatos atribuídos a 55 pessoas, das quais 49 eram titulares de foro por
prerrogativa de função. A expectativa é de que a Lava-Jato tenha maior
influência em grandes cidades. “Normalmente, as eleições municipais se
concentram em temas locais. Os assuntos nacionais quase não aparecem. É mais
provável que apareça com mais força nos grandes colégios”, atesta Barreto.
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